29 Julho 2016
"Então, não quero falar sobre direitos e deveres. Quero falar sobre direitos e responsabilidades, sobre direitos e solidariedade", escreve José Carlos Sturza de Moraes, cientista Social, especialista em Ética e Educação em Direitos Humanos e especialista em Educação de Jovens e Adultos e Educação de Privados de Liberdade.
Eis o artigo.
A ocupação de mais de duzentas escolas no final do ano passado pelos secundaristas de São Paulo, em protesto contra um plano de reorganização da rede pública estadual pelo governo Alckmin, passará para a história como um dos gestos coletivos mais ousados na história recente do Brasil. Eu diria, sem titubear, que esse movimento destampou a imaginação política em nosso País. A coragem e a inteligência com que essa luta foi conduzida, a maneira democrática e autogestiva com que sustentou-se, as formas de mobilização e comunicação que aqui se inventaram, o modo em que soube suscitar diálogo e conexão com as diversas forças da sociedade civil, a maneira autônoma que demonstrou ao longo de todo o trajeto, merecem nossa mais viva admiração e aplauso. Entretanto, mais do que isso, constituíram para todos nós uma verdadeira aula de ética e de política. Se nossos políticos aprendessem um por cento do que aqui se ensinou, nosso País seria outro.
Peter Pál Pelbart
A história não é linear nem vertical, é escrita nas inscrições deixadas nas pistas do social. Hoje, estudantes, adolescentes e jovens saem às ruas, como antes saiam. Saem às ruas de modos novos e incapturáveis no tempo em que agem.
Eles e elas vão denunciando velhas chagas e apontando novas violações de direitos estabelecidos e descumpridos.
Com suas vozes, cânticos, bandeiras, tubos de tinta, cobertores e corpos se insurgem contra o que não deveria ser aceito. Insurgem-se contra aquilo que muitas pessoas adultas já se insurgiam antes deles e delas, contra aquilo que algumas pessoas adultas se insurgem até hoje, mas, muitas vezes, com vozes mais roucas, ou não mais pelas mesmas coisas.
Assim, as ocupações de escolas de norte a sul do Brasil, com certa semelhança com as manifestações de 2013, põe em xeque governos, conselhos de direitos, tutelares, promotores, juízes e até partidos políticos. Mais que ‘em xeque’, põe mesmo contra a parede. Respostas velhas, sem lastro, não resolvem. Apelar à representação de entidades centrais não resolve. Novamente, como há três anos e em muitos outros momentos menos intensivos, em termos midiáticos de mobilizações de rua e de interpretações militantes e acadêmicas, eles e elas dizem: “não nos representam” e “nada de nós sem nós”.
Mais que dizerem, agem, fazem, realizam ações. Desierarquizados e descoordenados, não se sentem atingidos esses movimentos pela alcunha de anarquistas. Embora a grande maioria não se declare anarquista, dizem-se, no mais das vezes, representantes de seus próprios coletivos. Reportam-se diretamente a seus/suas pares. Praticam relações de decisão horizontal, conversando muito, decidindo juntos(as). Não ouvi, nas visitas que fiz a escolas, nem nos espaços coletivos de algumas de suas reuniões, nos debates públicos que tive o privilégio de participar – alguns dos quais muito tensos e com desfechos incertos – a expressão “vamos levar para as bases” ou “vamos consultar as bases”. E, é claro, nunca a soberba de decidirem sozinhos(as) em nome de seus pares. Diziam: “vamos conversar com os colegas”, “com o movimento”, “vamos voltar a cada uma de nossas escolas e conversar”, “nosso movimento é horizontal”... A horizontalidade deixou de ser um conceito e passou a ser um jeito de fazer, ou um conceito aplicado a práticas sociais.
Foram e são meninas e meninos, adolescentes em sua maioria, jovens em um contingente menor, e poucas crianças. Pessoas. Pessoas que, segundo a Constituição Federal de 1988, gozam de absoluta prioridade no Brasil. Pessoas que, no espaço escolar e fora dele, deixaram ou têm deixado de ser espectadores(as), alunos(as), e têm se transformado em estudantes. Altivos e altivas buscam-se nos olhares. Desconfiam de adultos(as), mesmo daqueles(as) que dizem querer apoiá-los(as). E fazem muito bem! Apoios não são desinteressados e nem ingênuos. A autonomia que buscam e nutrem é fundamental. Inclusive, com essa postura tanto eles e elas quanto qualquer pessoa ou organização também pode e deve dizer a que veio. E, quando não dizem, já vi e ouvi falar de situações de dispensa de apoios e mesmo de convites a ser retirarem destinados a apoiadores(as) “que só vêm buscar quadros” ou “vender nossa luta em troca de acordos partidários”... Viva! Afinal, quadros se buscam em lojas de molduras e se tem uma coisa que eles e elas não têm querido essa é se enquadrarem.
No Rio Grande do Sul foram quase 200 as escolas ocupadas, e, portanto, quase 200 experiências diferentes de que venha a ser isso. Houve ocupações na capital e no interior. Enquanto escrevo este texto, tenho conhecimento da existência de cerca de duas dezenas de escolas ainda ocupadas, e as informações que tenho são informações de pouco mais do que 20% das 497 cidades gaúchas. Em mais da metade dessas escolas ocupadas não havia e não há grêmio estudantil. Em muitas delas o Conselho Escolar, previsto em uma lei que visa(va) a existência de escolas democráticas, existe formalmente, mas não se relaciona com a comunidade escolar, nem ao menos diretamente com cada segmento nele representado. Situação que, em parte, é denunciada e justifica algumas das ocupações de escolas e seus prédios precários, com goteiras que impedem aulas, refeitórios inexistentes ou muito aquém da necessidade, falta de cozinha, insuficiência de merenda (mesmo com os insistentes ‘cardápios’ a base de bolacha e massa) à R$ 0,30... E, mesmo com essa absurda realidade, a luta deles e delas não têm sido só contra os trinta centavos, como em 2013 não, não foi só por vinte centavos!
A situação é muito pior no Rio Grande do Sul, as verbas para manutenção cotidiana das escolas estaduais, poucas e repassadas com atraso, têm, por via de regra, outro inimigo que não o governo. Seu uso, em muitas escolas, é definido unilateralmente por um diretor ou uma diretora, sem consulta e, por vezes, ainda sem prestação de contas à comunidade escolar.
Eles e elas têm talado de fios desencapados e desencapam as belas edições impressas de leis e outras normas descumpridas. Nas suas escolas, símbolo de adultos e adultas que esqueceram-se de como se conversa, nas paredes estão estampados cartazes com regras de convivência. Regras torpes. Regras desregradas! Na quase totalidade ditos do que eles e elas não podem e não devem. Regras de convivência não seriam regras que diriam respeito a relações entre estudantes, entre estudantes e professores(as), entre professores(as) e direções, entre mães, pais, responsáveis e quaisquer outras pessoas que integram ou adentrem o ambiente escolar? Mas não. Não mesmo! São, em regra, regras de tolhimento e de (des)direito...
Essa lógica no social mais amplo é seguida à risca em postos de saúde e em outros serviços públicos, em que são afixadas placas onde se escreve que desacatar servidor público é crime, citando até o número da norma penal. Mas não é dito onde nem como a pessoa (criança, adolescente ou adulta) pode reclamar do mau atendimento ou da precariedade do serviço.
Construímos e temos alimentado uma sociedade de poetas mortos, onde vamos tolhendo e reduzindo corpos-vidas em subservientes e tímidos(as) consumidores(as), não cidadãos e cidadãs. Em pessoas que devem saber seu lugar e que seu lugar é o lugar diverso daqueles e daquelas que podem. Dias atrás, por exemplo, numa audiência de conciliação em Porto Alegre, tratando sobre Escolas Ocupadas, presentes adolescentes e jovens estudantes, autoridades estaduais da educação e todo aparato jurídico administrativo de uma audiência, foram estabelecidas duas regras simples. Falas não deveriam ser interrompidas e celulares não usados. Perfeito. Mas, quando estudantes interrompiam eram censurados e recebiam lições breves de civilidade. Quando autoridades o faziam, nada de reprimenda. Quando estudantes e outros(as) participantes sacavam do celular para lerem mensagem ou qualquer outra coisa, eram mandados guardar ou sair para fazer isso. Quando autoridades, à mesa, empunhavam seus celulares, nenhuma objeção. E quando se alertou de tal descompasso entre a regra e sua validade veio à informação (mais ou menos literal) que dá conta de, porque SIM, a educação tem de ser questionada: nós já conduzimos muitas audiências aqui, inclusive de ocupações, com gente muito pobre, até analfabetos que tinham que utilizar almofada [para assinar], mas nunca tivemos esse tipo de questionamento. E, pasmemo-nos(?), a regra foi mantida – inquestionável – de que vale para uns e umas e não para outros e outras.
Portanto, não pasmemo-nos! Questionar o instituído é condão indispensável para novos pactos sociais e – antes deles – para a explicitação das injustiças perpetradas por aqueles(as) que não veem o(a) outra(a) como seu igual, como pessoa, gente, cidadã e cidadão.
Generosamente, a luta dos(as) estudantes têm sido mais ampla, não querem uma escola que lhes tolha ainda mais a capacidade de pensar, por isso insurgem-se contra o projeto da ‘Escola Sem Partido’ e querem que a escola pública, conquista dos movimentos populares do século XX, continue existindo pública!
Mas, como escolas não são ilhas é importante vermos esse fenômeno em outros contornos. Muito do tecido social daquilo que se busca instituir como controle social sobre o Estado está rasgado, com remendos que não dão conta dos rasgos e com muita gente entendendo que o tecido não só está bom, como ainda é seda puríssima. Mas nem uma chita bonita chega a ser... E não me refiro ao Congresso Nacional, estampa simbólica de uma sociedade em frangalhos. Digo mesmo que, em outro espaço social, de modo muito parecido com o que acontece nas escolas e suas gestões distantes de processos horizontais, consultivos e de corresponsabilidade, os conselhos de direitos humanos por segmentos etários ou por grupos populacionais, assim como aqueles de políticas setoriais, que deveriam ser espaços mais aprofundados técnica e politicamente, também se verificam processos de descolamento dos segmentos sociais que deveriam ser representadas. Percebe-se certa burocratização e, até mesmo, desvio de compromisso e finalidade.
Essa avaliação, que não é nova, tem demandado estudos e pesquisas variadas em todo nosso país. Cotidianamente, contudo, hábitos, usos e costumes, se impõem frente a qualquer crítica.
A mim interessa, por proximidade e implicação, pensar sobre Conselhos de Direitos da Criança e Adolescentes a partir dos episódios das Ocupações de Escolas ocorridos no Rio Grande do Sul, e para isso, em cenários de práticas, tenho que me servir de práticas.
Bem, iniciadas as Ocupações de Escolas, o que não se viu foi apoio desses conselhos. E uma ou outra cidade e conselheiro(a) não muda o cenário mais amplo. E quando o Sistema de Garantia de Direitos se desocupa da proteção, essa não acontece. Mas, felizmente, nem sempre gera a vítima quieta e cabisbaixa, humilhada e subserviente, digna de comiseração e pena. Às vezes, que bom, faz eclodir revoltas e quando essas se coletivizam causam mal-estar quase insuportável aos/às carcereiros(as) de direitos, àqueles e àquelas que se julgam juízes legítimos(as) do que é bom (e correto) e do que é mal (e incorreto), que se alvoram a dizer quando de sua desocupação – ou impotência – frente à quebra de direitos como deveria ser a reação dos(as) violados(as) em seus direitos, em suas dignidades enquanto pessoas.
Desculpem, fosse válida e útil tal prescrição não teria gerado ou teria impedido a violação ocorrida. Não o fez, não o fizemos. Respeitemos, então, e apoiemos quem faz, em nome próprio, a partir da dor que sente e do(s) sonho(s) que tem, com suas estratégias próprias, desautorizadas e insubmissas. Do contrário, calamos vozes, escondemos o mal feito, e, exatamente como queremos evitar em certos atos pretensamente técnicos (e neutros), acabamos por culpar a vítima pela violação sofrida. Ou, como temos discutido de norte a sul deste país, acabamos por criminalizar os movimentos sociais.
Então, não quero falar sobre direitos e deveres. Quero falar sobre direitos e responsabilidades, sobre direitos e solidariedade. E com essa mudança semântica quero dizer de conteúdos irreconciliáveis entre aqueles e aquelas que defendem direitos humanos e aqueles e aquelas que defendem a ordem calada e ceifadora de vitalidades e de vida. Que defendem a letra fria da lei e não os direitos que essa anuncia e nem sempre oferece. Não precisamos autorizar, “o que não tem governo e nem nunca terá”, pois desconhecemos os sentidos, sentidos pelos(as) que sentem.
Ora, desavergonhadamente se tem defendido desconhecer ou desdenhar do direito de estudantes lutarem por escola pública de qualidade no RS porque “os problemas vêm de outros governos”, “porque tem partido por trás”, “porque eles e elas estão sendo manipulados(as)”... Acaso autoria precisa só vir de cima, de adultos(as), de autoridades, de sábios(as), de técnicos(as)? Acaso crianças, adolescentes e jovens são ‘cabeças ocas’ ou ocas são nossas compreensões e esvaziadas de sentidos protetivos algumas de nossas ações/omissões? Por exemplo, a um conselho de direitos da criança e do adolescente cabem reprimendas e imposições de limites à luta por direitos de crianças e adolescentes, oferecendo contornos ao que pode e que não pode? É seu papel social? Não temos outras instituições, inclusive e primeiramente, pais e responsáveis por esses/as, para essa ação? Em uma Nota Pública, o Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente do Rio Grande do Sul, que integro, se posicionou, em 02 de junho de 2016 [1], alertando que: “as pessoas em regime de ocupação devem respeitar o patrimônio público, evitando atos de vandalismo e depredações, mantendo as escolas limpas e em ordem, assim como recomenda-se que seja feito documento listando as pessoas que realizam a ocupação para resguardar direitos ou para eventual responsabilização no caso de dano ao patrimônio público”.
Minha crítica não é no sentido de retirar o mérito da referida nota em outros aspectos, mas para evidenciar o que estou tentando pôr em relevo. Afinal, as ocupações de escolas não vieram – em uma de suas mais fortes motivações – senão justamente a denunciar o estado de precariedade das escolas. Denunciavam, portanto, a lesão institucional continuada ao patrimônio público. Antes de ‘orientar’ dever-se-ia saudar a luta, inclusive por suas consequências a favor do patrimônio público! Dizer que a situação de precariedade das escolas é obra de estudantes é, no mínimo, irresponsabilidade. Outra Nota do Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Sul, 03 de junho, apresenta longa apreciação do direito a buscar direitos e seu caráter pedagógico [2] e não fez, por exemplo, nenhum tipo de orientação ao movimento. Até porque não cabe àquele órgão, como descabe ao conselho de direitos da criança e do adolescente.
Ao que parece, para alguns(mas) conselheiros(as) faz-se necessário justificar a defesa de direitos humanos de crianças e adolescentes ou, pior, que esses(as) só são merecedores(as) de direitos se provarem ser ‘boas pessoas’, como se a construção de parâmetros sobre o que venha a ser o cuidado com o espaço coletivo, de casa, da escola e do planeta, não fosse um processo contínuo e para o qual o movimento de ocupar-se mais da escola, provavelmente, tenha efeitos por demais positivos. Ainda mais de adultos que aceitam como natural e sem maiores problemas o fato de termos escolas públicas de primeira, de segunda e de terceira classe, consagrando e cristalizando certo lugar de cada um(a), conforme sua origem de classe e sociocultural mais ampla.
Finalmente, por conta da ocupação da Secretaria da Fazenda do Estado do Rio Grande do Sul pelo Comitê das Escolas Independentes, em 15 de junho e sua retirada à força na mesma manhã, sem nenhuma tentativa de escuta e mediação com os(as) estudantes, temos que tratar da criminalização e da falta de autocrítica, penso, do próprio Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente, especialmente do segmento governamental.
Ora, entre os aspectos positivos da nota emitida no dia 2 por esse órgão, estava o apelo a soluções não violentas. Diz a nota “deve ser assegurada, pelas direções das escolas e pelas autoridades constituídas e responsáveis, segurança dos/as alunos/as e seus familiares nos locais de ocupação, bem como um ambiente de respeito e de paz, sem qualquer tipo de violência”. E o que se viu na Secretaria da Fazenda foi arbitrariedade, truculência e nenhuma abertura ao diálogo.
E o pior é que, ao invés de criticar ou se autocriticar pela postura que resultou em 43 prisões, entre os(as) quais de 33 adolescentes estudantes, pelo menos metade dos(as) conselheiros(as) do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente têm dito que foi irresponsabilidade dos(as) estudantes, que não havia o que fazer, que cada um colhe o que planta... E, quando se busca fazer comparações, como ao tratamento dado aos(às) estudantes que ocuparam a Assembleia Legislativa entre 13 e 14 de junho, ou os(as) professores(as) que ocuparam o Centro Administrativo Fernando Ferrari, de 14 a 17 de junho, as pessoas se ofendem e rebatem com argumentos do tipo: “as entidades centrais deliberaram e a minoria tem que acatar numa democracia” ou “nós somos conselheiros(as). Que não seria adequado dizer que uns(umas) são sociedade civil e outros(as) governo... Que isso causaria divisão... Ora, que se manifeste a divisão, se são irreconciliáveis os entendimentos!
Na manhã do dia 15, antes da Brigada Militar retirar à força, humilhando e expondo estudantes ao constrangimento vexatório, descumprindo flagrantemente vários artigos do Estatuto da Criança e do Adolescente, conversei pessoalmente com o Secretário da Fazenda, Giovani Feltes, me identificando como conselheiro e pedindo para que víssemos uma solução negociada. Disse-me ele que a situação estava com a Brigada e me indicou o chefe da operação, com quem fui falar e não houve diálogo. Argumentou que, na sequência me chamaria e que havia já outros(as) conselheiros(as) aguardando.
Encontrei uma conselheira, a presidente do nosso colegiado, e outro colega da Polícia Civil. Não vislumbrando como evitar o pior, fiz um apelo no meio formal e ágil (virtual) do conselho, um grupo de Whatsapp:
“Colegas, apelo aos colegas que são da parte governamental do conselho que tentem incidir em alguma solução negociada. Quando cheguei e conversei com o Secretário Giovani Feltes, que estava entrando no prédio. Me identifiquei como conselheiro do CEDICA. Não tinha visto ainda que outros colegas estavam. E ele me disse que a situação ia ser com a Brigada. O secretário está no prédio e, portanto, ele pode interferir. Nós temos vários conselheiros aqui do CEDICA. Nós podemos auxiliar. Não é necessária uma ação violenta, pelo menos, sem uma tentativa, por favor, de negociação. Chamo a todos e todas pra responsabilidade deste conselho.” (Áudio).
E nada foi feito. Nenhuma tentativa foi feita. A Brigada Militar só autorizou um conselheiro a ficar no ambiente e a mim para contribuir no ultimato à saída. Tanto no dia, quanto depois, em plenária do CEDICA e reunião de um GT que se formou, nenhum(a) conselheiro(a) governamental relatou qualquer tentativa de intermediação. E isso é muito sério! O princípio da paridade nos conselhos de direitos é para que tenhamos representantes porta-vozes do governo e da sociedade civil, com legitimidade, não para se esconder atrás de justificativas torpes como só analisar a condução da Brigada, mas para buscar assegurar direitos a partir de seus lugares de representação.
Eles(as) só queriam uma audiência com o governador. Esse servidor público que poderia recebê-los sem mais delongas não o fez. Quanto aos estragos se houvessem, poderiam dar o mesmo tratamento dado na Assembleia Legislativa e no Centro Administrativo Fernando Ferrari. Mas não, para adolescentes estudantes e jovens, foi utilizado o Código de Menores e o AI5 e não o Estatuto da Criança e do Adolescente. E na Assembleia, com outros(as) estudantes no Centro Administrativo, a Constituição Cidadã. Mas, felizmente, enquanto o conselho que deveria defender direitos da criança e do adolescente se cala, numa votação empada entre dois entendimentos diametralmente opostos, outros se pronunciam, como o Conselho Estadual de Direitos Humanos e o Instituto de Psicologia da UFRGS, repudiando a opção do Governo do Estado em utilizar a Brigada Militar para uma ação de criminalização.
São vazias de sentido, e boa fé, as alegações que a Secretaria da Fazenda não é uma Escola. Ou acaso a Assembleia ou o Centro Administrativo o são?
Em 1995, em Porto Alegre, quando era conselheiro tutelar, fiz uma abordagem desastrada em uma situação de mendicância, em que havia crianças. Após o fato, tive certeza que minha ação foi higienista e que, por pouco, não rendeu algum acidente grave na via pública. O episódio, ao invés de escondido ou negado, faz parte de um texto publicado em 2007 [3] (e antes muito falei dele), para uma capacitação de conselheiros(as) tutelares eleitos(as) naquele ano. E se relato o acontecido aqui é no sentido de apelar novamente a que repensemos nossas ações, nossas condutas e, sendo o caso, façamos a crítica com a altivez necessária e também, quem sabe, a autocrítica. Pois, muito ensinamos com nossas práticas. Pouco com nossas prescrições.
Notas:
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E quando o Sistema de Garantias de Direitos se desocupa da proteção? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU