21 Junho 2016
No dia 17, pelo Twittter, Fernando Oliveira, colunista do Agora S.Paulo, usou sua conta para informar que o iG demitira a repórter que sofrera assédio sexual por parte do funkeiro Biel. A profissional denunciou o funkeiro e o iG prometeu que iria ampará-la. A dispensa da jornalista, que não teve seu nome revelado até agora, foi muito criticada nas redes sociais.
A reportagem foi publicada por Portal Comunique-se e reproduzida por Jornal GGN, 20-06-2016.
O cenário não é bonito e um grupo de jornalistas mulheres resolveu criar no Facebook uma página para amplificar o protesto contra a demissão da colega e também por tantos casos de assédios sofridos por repórteres do sexo feminino.
A jornalista Janaina Garcia foi a idealizadora do movimento. E ela apresentou a página no Facebook, criticando o comando do iG por sua postura diante do assédio sofrido pela funcionária.
“Mulherada, este grupo nasce a partir da demissão de uma colega do portal iG. Colega que, dias atrás, se recusou a ficar calada diante de assédio sexual do ‘cantor’ Biel, durante uma entrevista coletiva, e o denunciou à polícia. Colega para quem o portal iG havia prometido ‘todo tipo de assistência’. E colega que poderia ser, afinal, qualquer uma de nós”, escreveu ela.
Logo a página recebeu vários apoios e, até a tarde deste dia 20, já recebera mais de 4 mil curtidas.
Com este apoio, manifesto foi escrito bem como um vídeo criado, expondo situações de assédio sexual sofridos pelas jornalistas. Além da página e do vídeo, a hashtag #jornalistascontraoassédio tem sido promovida por simpatizantes.
A jornalista idealizadora do movimento conversou com o Portal Comunique-se. Leia abaixo a entrevista concedida e o manifesto. Além disso, o vídeo também poderá ser visto ao final da matéria.
Sobre a razão do movimento e o conteúdo já recebido, Janaina conversou com a reportagem do Portal Comunique-se. Confira:
Você imaginava que o grupo contaria com tanta mobilização, com apoio de mais de 3,6 mil colegas em três dias?
De maneira alguma a gente esperava. Nem eu e nem a Thaís Nunes, outra jornalista que está encabeçando isso. O importante a destacar é que se trata de uma ação completamente espontânea, que nasceu a partir da demissão da menina do iG, o que causou revolta, um sentimento de injustiça muito grande. Mas também de empatia, de a gente se colocar no lugar do outro, de ver que a empresa avisou que ia dar assistência a alguém que está com um processo criminal contra uma celebridade e agora a deixa a ver navios. É algo que poderia acontecer com qualquer uma de nós.
Com o movimento, você teve acesso a quantas histórias de assédio contra colegas jornalistas?
Não consigo quantificar exatamente quantas denúncias recebemos. Tivemos a ideia de fazer o vídeo e fomos pedindo, juntando amigas que tivessem alguma inclinação com movimento feminista. Não só para exposição de frases que são mais comuns do que a gente imagina, dentro e fora das redações; dentro e fora das assessorias de imprensa. Recebemos algumas dezenas de depoimentos.
Infelizmente, por questões de tempo, tivemos que deixar muita coisa de fora [do vídeo]. Na fan page, a ideia é aproveitar esses depoimentos na íntegra. Materiais que são importantes para ilustrar o quanto isso acontece e mostrar que isso não pode ser encarado como normal.
Com a criação do grupo, quais foram as histórias de assédio mais assustadoras que chegaram até você?
Uma coisa que marca é agente público. Delegado, juiz, político... se aproveitar de uma função que ele recebe por nós e usar um cargo desse para manifestar poder e assediar uma jornalista. Para mim, todas essas situações são absurdas. Teve uma fonte que chamou uma colega de “vagabunda” porque ela não quis aceitar o assédio dele. Isso é um absurdo.
Há duas semanas, o próprio iG foi quem divulgou que uma repórter do site foi assediada pelo Biel. Agora, com a demissão da moça, a direção do veículo se cala (ao menos publicamente). Acredita que tal atitude faz outras jornalistas não revelarem nem para as próprias chefias casos de assédio com receio de serem prejudicadas profissionalmente?
A atitude do iG é totalmente prejudicial para nós jornalistas, principalmente mulheres. Na medida em que você denuncia, a empresa te promete respaldo e você é demitido... Quer dizer, que incentivo as mulheres têm para levar isso [casos de assédio sexual] adiante? Ao mesmo tempo, [a demissão] foi uma ação que desencadeou toda essa mobilização. Teve o lado ruim, mas, por outro lado, a reação está sendo muito positiva para que a gente evite esse tipo de comportamento, para que a gente não deixe se “naturalizar” esse tipo de comportamento.
Em sua avaliação, o ambiente nas redações brasileiras é machista?
Está mudando, mas, sim, o ambiente ainda é machista. Isso a gente percebe pelos próprios relatos das colegas. Como, por exemplo: assuntos mais “ligths” ainda são transferidos para mulheres cobrirem. Assuntos como economia e política ainda são, por parte de algumas chefias e de entrevistados, levados majoritariamente para os homens.
Você chegou a conversar com a repórter que foi demitida do iG? Alguma ação planejada para dar apoio a ela?
Quanto à repórter do iG, vale esclarecer que ela é uma estagiária. Tem mais essa questão. Não conversei com ela. Optamos por a todo momento resguardar a privacidade dela, mas tivemos o cuidado para fazer com que pessoas no grupo conversassem com ela, que manifestou apoio à causa.
O mote da campanha é a demissão dela e o quanto isso é uma bola de neve, pois tem outros casos tão ruins quanto.
Íntegra do Manifesto do Grupo criado pela jornalista Janaína Garcia
**** MANIFESTO ****
Jornalista sofre assédio? Onde? Quando? Por quê?
Antes fossem simples como um lead jornalístico as respostas para uma questão como essa – mais comum no dia a dia das profissionais do jornalismo do que se pode imaginar. Dentro ou fora das redações. Dentro ou fora das assessorias de imprensa.
As respostas para o nosso ‘lead’ começaram a surgir com força a partir da demissão de uma colega do portal iG, no último dia 17. A mesma que, semanas antes, denunciara assédio sexual do cantor Biel durante uma entrevista. O caso rendeu reportagens dentro e fora da empresa, que se comprometeu a dar assistência à jovem de 21 anos – mas a decisão de demiti-la surpreendeu a própria redação do portal.
Com os sentimentos de empatia e de desnaturalização de um tema tão grave, nasceu a campanha #jornalistascontraoassédio – de um post no Facebook a grupo de WhatsApp, grupo no Facebook, e, agora, na Fanpage homônima.
O assédio é um dos ranços do machismo nosso de cada dia. Expurgar isso com denúncia e com informação é tarefa não só das mulheres, mas de qualquer jornalista que pretenda, de fato, ver uma sociedade menos desigual de oportunidades, conceitos, direitos e deveres. Um lugar mais legal em todos os sentidos da palavra.
Vamos juntas?
Vamos juntos?
Somos
#jornalistascontraoassédio
{youtube}Z52Nh-E6k6s&feature=youtu.be{/youtube}
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
As jornalistas contra o assédio dentro e fora das redações - Instituto Humanitas Unisinos - IHU