15 Junho 2016
"A Igreja Ortodoxa Russa ainda permanece apegada à sua dimensão imperial e não segue aquela missão universal sonhada por Bartolomeu." O professor Andrea Riccardi, historiador da Igreja e fundador da Comunidade de Santo Egídio, cultiva há décadas boas relações com o mundo ortodoxo.
A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada no sítio Vatican Insider, 14-06-2016. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Nesta entrevista com o Vatican Insider, Riccardi comenta a decisão comunicada na noite do dia 13 de junho do Santo Sínodo da Igreja Ortodoxa Russa, que solicitou o adiamento do Concílio pan-ortodoxo a ser realizado em Creta a partir do dia 19 de junho. E, caso contrário, informou que não participará da cúpula, alinhando-se com as posições já expressadas pelas Igrejas ortodoxas de Antioquia, Bulgária e Geórgia.
Eis a entrevista.
O que representa a decisão russa?
No momento, de fato, representa o fracasso do projeto de um Concílio pan-ortodoxo. É uma decisão que expressa e fotografa a fragmentação dos ortodoxos restritos às suas fronteiras nacionais. Ao contrário, o grande sonho do Patriarca Ecumênico de Constantinopla sempre foi o de levar a Ortodoxia para fora do tradicionalismo e do nacionalismo, para dizer e anunciar algo ao mundo. Bastaria que o Concílio pan-ortodoxo fosse celebrado, independentemente dos resultados, para representar, mesmo assim, um sinal importante para todos os cristãos e para o mundo inteiro.
O que está fazendo fracassar esse projeto?
Pessoalmente, eu não acho que o fracasso se deva inteiramente a uma manobra dos russos. Acho, ao contrário, que, no fim, a Igreja de Moscou não se esforçou para fazer chegar a bom termo o projeto do Concílio pan-ortodoxo. Explico-me: uma coisa é especular que as divisões, as novas dúvidas e recriminações que levaram algumas Igrejas ortodoxas a pedir o adiamento tenham sido, de algum modo, "provocados" pelos russos. E isso eu não penso. Até porque, se eles realmente quisessem fazer com que o Concílio fracassasse, eles tiveram a possibilidade na fase preparatória. Outra coisa, contudo, é constatar que, diante das primeiras dificuldades e deserções, a Igreja Ortodoxa Russa não fez nada para impedir ou resolvê-las. E é isso que eu acho que aconteceu, também por causa de divisões presentes na própria ortodoxia russa.
Em outras palavras, o senhor diz: eles não agiram para fazê-lo fracassar, mas não fizeram nada para fazê-lo ter sucesso...
Exato. Moscou optou por deixar as coisas andarem, e assim demonstra que não tem um grande interesse pelo Concílio. Demonstra que não sente a necessidade daquela dimensão universal que Bartolomeu busca, embora na fraqueza do Patriarcado de Constantinopla, uma fraqueza que representa a sua força. Bartolomeu quer relançar a missão da Ortodoxia no mundo, defrontando-se com os problemas do mundo e mostrando o rosto de uma Igreja unida. Os russos, contudo, continuam olhando para as fronteiras "imperiais", para as fronteiras do seu grande país. Enquanto as outras Igrejas que, no último momento, retiraram a sua participação correm o risco de se tornarem minorias nacionalistas e tradicionalistas em países em crise demográfica onde avançam grupos cristãos protestantes. Estamos diante de uma grave crise da Ortodoxia.
O que vai acontecer agora?
Será preciso esperar, avaliar os próximos passos e o que será dito a partir do dia 19 de junho, quando as 10 Igrejas que continuaram aderindo ao projeto comum vão se reunir em Creta. As perguntas são muitas. Que atratividade pode exercer hoje a Igreja Ortodoxa no mundo moderno? As Igrejas ortodoxas com uma forte conotação nacional poderão continuar sobrevivendo como se a história não existisse?
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Por que a Igreja russa não vai ao Concílio de Creta. Entrevista com Andrea Riccardi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU