Por: Jonas | 07 Junho 2016
“O Papa Francisco (foto) foi benévolo e misericordioso com os clérigos aos quais imporá, sem dúvidas, o que disse em seu recente “Motu proprio”. Também com as vítimas desses clérigos, aquelas que o Papa tem o direito e o dever de defender, para lhes devolver a dignidade da qual foram privadas”, escreve o teólogo espanhol José María Castillo, em seu blog Teología sin Censura, 05-06-2016. A tradução é do Cepat.
Fonte: http://goo.gl/6X2RUY |
Eis o artigo.
Certamente, não poucos crentes e muitos clérigos experimentaram um sério mal-estar por causa da decisão tomada pelo Papa Francisco de que sejam expulsos de seu cargo os clérigos que são responsáveis por “causas graves” (can. 193) (Motu próprio”, 4.VI.2016). Entre estas causas se destacam, nestes dias, os casos de ocultamento de abusos sexuais a respeito dos quais tanto se vem falando, há alguns anos, na Igreja.
Ao proceder desta maneira, o Papa Francisco age como um ditador implacável? Se este assunto é analisado com interesse e séria documentação, é preciso dizer justamente o contrário. O Papa, neste tema como em tantos outros, está procedendo com a devida prudência e muita misericórdia. Muito mais do que alguns imaginam. Porque se sabe – e é um assunto bem estudado – que a tradição e a prática da Igreja, durante mais de dez séculos, foi duríssima e contundente nesta ordem de coisas.
Com efeito, está mais do que suficientemente comprovado e documentado que, durante mais de dez séculos, o que dispunham os papas, os concílios, e o que ensinavam os teólogos e os Padres da Igreja, é que os clérigos, especialmente quando se tratava de bispos que tinham comportamentos graves, principalmente se era em matéria sexual e com dano ao próximo, era a decisão não só de expulsá-los do ofício ou cargo que desempenhavam, mas algo muito mais radical, que consistia em privá-los do ministério sacerdotal, de forma que eram reduzidos à condição de leigos: “Laica communione contentus”.
Era a fórmula que expressava a expulsão do clero. Simplesmente, adiante, deixavam de ser sacerdotes e voltavam a ser e viver como leigos, como um entre tantos, tivessem a dignidade que tivessem. A documentação que se conserva sobre este assunto é enorme e foi amplamente estudada (C. Vogel, P. M. Seriski, E. Herman, P. Hischius, F. Kober, K. Hofmann, J. M. Castillo).
Os textos dos concílios afirmam que o sujeito que era punido pela disciplina dos Sínodos ou Concílios tinha que ser “privado da honra, do poder, do sacerdócio”; ou que tinha que “perder a ordem” ou “deixava de ser clérigo”... Simplesmente, retiravam dele a ordenação recebida. Estas afirmações (ou semelhantes) se repetem dezenas de vezes nos volumes que as edições críticas dos Sínodos da Antiguidade ou da Idade Média contêm. E conste que este estado de coisas se manteve, com toda segurança, ao menos até o segundo Concílio de Latrão (ano 1215).
E, ainda, uma advertência. A doutrina do “caráter sacramental” foi inventada no século XI; e foi explicada de três formas muitos diferentes no século XII. Mas nunca se chegou a um acordo comum. De tal forma que nem sequer o Concílio de Trento, na Sessão VII, conseguiu esse acordo entre os Padres e teólogos conciliares. Por isso, na fórmula definitiva do cânon 9 (da Sessão VII) se diz que há três sacramentos (Batismo, Confirmação, Ordem) que imprimem caráter, o que significa que estes sacramentos não podem se repetir, ou seja, só pode ser administrado uma vez na vida (DH 1609).
Quer dizer, o chamado “caráter” sacramental não significa que o sacramento é um “selo” ou que modifica ontologicamente quem o recebe. Tal coisa não é dogma de Fé, nem coisa que se assemelhe. A Ordem é, portanto, um “ministério” que a Igreja concede a determinadas pessoas. E dessas pessoas, o mesmo que o concede pode retirar ou suprimir. Não há, pois, nenhum “Sacerdos in aeternum”.
O Papa Francisco foi benévolo e misericordioso com os clérigos aos quais imporá, sem dúvidas, o que disse em seu recente “Motu proprio”. Também com as vítimas desses clérigos, aquelas que o Papa tem o direito e o dever de defender, para lhes devolver a dignidade da qual foram privadas.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
A bondade do Papa na expulsão de bispos por causas graves - Instituto Humanitas Unisinos - IHU