17 Mai 2016
Sem dúvida, a principal história vinda do Vaticano nas últimas semanas é a disposição aparente do Papa Francisco em debater sobre se as mulheres podem servir como diaconisas na Igreja Católica ou não. A palavra “aparente” aqui se faz necessária porque, com aconteceu com tantas outras coisas no atual papado, não se sabe exatamente o que o pontífice quer dizer quando se manifestou sobre o assunto.
Durante uma sessão junto à União Internacional das Superioras Gerais – UISG, esse tema foi levantado. Perguntaram a ele: “O diaconato permanente só está aberto a homens casados e não casados. O que impede a Igreja de incluir mulheres entre os diáconos permanentes, da forma como acontecia na Igreja primitiva? Por que não criar uma comissão oficial que possa estudar a questão?”
A reportagem é de John L. Allen Jr., publicada por Crux, 14-05-2016. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
O papa deu uma resposta bastante longa, mas o essencial foi que ele concordou com a ideia de que uma comissão pode ajudar a lançar uma luz neste debate. Sabemos que ele estava falando sério aqui, pois uma alta autoridade da Secretaria de Estado do Vaticano, o arcebispo italiano Angelo Becciu, tuitou no dia seguinte dizendo que o papa lhe havia telefonado para informar que estava pensando em criar uma comissão para estudar a possibilidade de diaconisas na Igreja.
Porque grande parte da resposta do papa focava-se no que ele ouviu de um teólogo sírio sobre o papel das diaconisas na Igreja primitiva, alguns fizeram uma leitura minimalista de sua declaração como se ele estivesse querendo dizer que, embora esteja aberto a um estudo do que aconteceu séculos atrás, isso nada tem a ver com permitir que as mulheres se tornem diaconisas hoje.
Foi isso o que explicou o porta-voz do Vaticano, o Pe. Federico Lombardi, quem insistiu dizendo que “o papa não disse ter a intenção de introduzir uma ordenação diaconal das mulheres, e muito menos falou em ordenação sacerdotal delas”.
No entanto, essa tentativa de minimizar a significação do que foi expresso pelo pontífice não é convincente. O contexto da pergunta deixa claro que as religiosas da UISG não estavam dialogando simplesmente com base num interesse histórico, mas sim porque gostariam de ver, hoje, mulheres servindo como diaconisas, e se Francisco quisesse dizer um claro “não”, ele poderia ter dito (o que ele fez, por exemplo, toda a vez que lhe perguntavam sobre a ordenação feminina ao sacerdócio).
Supondo que Francisco está, no mínimo, aberto a pensar sobre o assunto das diaconisas, pergunto: Existe uma maneira de antecipar aonde este processo de estudos poderá levá-lo?
A resposta mais segura é “definitivamente não”, dado que este papa é um mestre das surpresas. No entanto, podemos identificar certos pontos que parecem prováveis.
Por um lado, Francisco vem pedindo para que haja papéis mais visíveis para as mulheres na Igreja, e o diaconato para elas seria certamente uma maneira de realizar este desejo. A maioria dos católicos comuns jamais irá participar de um Sínodo no Vaticano ou de uma reunião para resolver questões do Banco Vaticano, mas eles vão às missas. E ver uma mulher ajudando a conduzir a comunidade nas celebrações seria um simbolismo poderoso.
Frequentemente Francisco vem denunciando a violência e a discriminação contra as mulheres, e elevá-las a diaconisas pode ser uma forma de enviar um sinal importante para reverter essa situação. Essas ideias fizeram parte do discurso do arcebispo de Quebec Paul-Andre Durocher no Sínodo dos Bispos de 2015, quando ele lançou a noção de diaconisas.
Além disso, Francisco fala bastante em caridade e em trabalho com os pobres, que é parte central do papel dos diáconos ao longo da história, e portanto reenergizar o diaconato deveria ser um dos seus objetivos.
Mesmo assim, existem também razões para se acreditar que Francisco possa vir a hesitar em suas próximas ações.
De um lado, ele indicou na quinta-feira passada que consultaria a Congregação para a Doutrina da Fé. Quando o fizer, irá descobrir que esse dicastério já estudou o tema a 14 anos atrás, com uma pesquisa sobre o diaconato desenvolvido pela Comissão Teológica Internacional.
Embora os achados aqui não tenham encerrado a discussão, eles claramente tenderam a ser contra a ideia de diaconisas com base em que as “diaconisas” antigas não eram a mesma coisa que os diáconos de hoje, e que, agora, o diaconato faz parte do sacramento das Ordens Sagradas, o que é aberto somente aos homens.
Francisco pode se sentir compelido a respeitar estas conclusões, principalmente por causa de sua ênfase declarada na colegialidade.
Mesmo ainda enfrentando algumas críticas por causa de sua abertura cautelosa à comunhão para os fiéis divorciados e recasados, é igualmente possível que, após certa reflexão, Francisco possa simplesmente decidir que ele não precisa incitar tantos outros problemas que uma outra reforma polêmica poderia vir gerar na Igreja.
Francisco pode vir a crer que abrir o diaconato às mulheres é uma forma errada de empoderá-las, visto que tal iniciativa corre o risco de se tornar mais um capítulo no clericalismo – quer dizer, a noção que a única maneira de ser importante na Igreja Católica é sendo membro do clero, coisa que provavelmente ele detesta.
Em ocasiões anteriores, o papa rejeitou outras formas do que considera uma resposta “clerical” às inquietações femininas.
Numa entrevista em dezembro de 2013 ao jornal italiano La Stampa, por exemplo, perguntaram-lhe sobre a ideia de que ele poderia nomear cardeais mulheres.
“Não sei de onde essa ideia se espalhou”, disse Francisco. “As mulheres na Igreja devem ser valorizadas, não ‘clericalizadas’. Quem pensa em mulheres cardeais sofre de clericalismo”.
Quando o pontífice se sentar para pensar sobre o assunto, fazer das mulheres diaconisas pode parecer-lhe o mesmo que um tipo de clericalismo.
O Papa Francisco, evidentemente, é o tipo de líder que deveria vir com um selo de advertência, como nos maços de cigarro: “Atenção: As previsões não negativas para a sua saúde!”. Seria imprudente tentar prever o que ele estará fazendo.
Com base nestas considerações, no entanto, é possível dizer que as suas conclusões não serão nada fáceis.
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Papa Francisco e a questão das diaconisas: uma decisão nada fácil - Instituto Humanitas Unisinos - IHU