04 Mai 2016
Mais de seis meses depois da maior tragédia ambiental do Brasil, ainda existe um risco real de novos desastres com barragens de mineração no país. O alerta é do engenheiro Bruno Milanez, que aponta 39 barragens em risco só no estado de Minas Gerais.
A entrevista é de César Guerra Chevrand, publicada por Agência Fiocruz de Notícias/AFNE, 03-05-2016.
Professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e coordenador do Grupo de Pesquisa Política, Economia, Mineração, Ambiente e Sociedade (PoEMAS), Milanez é um dos convidados do evento O Desastre da Samarco, que será realizado pela Fiocruz nos dias 5 e 6 de maio em Mariana (MG).
Escalado para a primeira mesa de debates, que discutirá a ampliação sobre riscos de desastres na mineração, Bruno Milanez vai falar sobre as falhas no licenciamento da barragem do Fundão e no monitoramento das barragens de rejeito. Confira abaixo entrevista exclusiva para a Agência Fiocruz de Notícias (AFN).
Eis a entrevista.
A imprensa costuma nomear o rompimento da barragem da Samarco S.A. ora como acidente, tragédia ou crime. Como você classifica o episódio?
Dentro do meu grupo de pesquisa, temos preferido usar a palavra desastre, pois achamos que ela passa melhor a dimensão do que houve. A escala dos impactos foi tamanha que não nos parece que os demais termos conseguem dar conta.
O que a Samarco S.A. poderia ter feito para evitar o desastre?
Os resultados da primeira perícia da Polícia Civil apontam uma série de falhas no monitoramento e na manutenção da barragem. O relatório menciona, entre outros problemas, equipamentos de monitoramento com defeito e em número insuficiente, bem como deficiência no sistema de drenagem próximo à barragem. Da mesma forma, o Diretor Rescue Training International, uma empresa que havia sido contratada pela Samarco para elaborar um plano de emergência, declarou que o plano que eles apresentaram foi substituído por outro, menos completo. Essas informações sugerem que a Samarco não estava utilizando as melhores tecnologias disponíveis em termos de segurança. Se os padrões operacionais fossem mais rigorosos, talvez ela tivesse percebido alterações na barragem e evitado o seu rompimento.
Qual o papel do Estado na regulamentação da atividade de mineração?
O Estado é responsável tanto por regulamentar o acesso aos recursos naturais (no caso do governo federal), quanto por conceder a licença ambiental para o funcionamento das barragens de rejeito (governo estadual). No caso de Minas Gerais, a Fundação Estadual do Meio Ambiente produz anualmente o Inventário de Barragem do Estado de Minas Gerais. Esse inventário indica quais as barragens que não têm estabilidade garantida. Em teoria, o governo estadual deveria obrigar as empresas a corrigir as falhas identificadas, porém nem sempre isso ocorre. Existem barragens que são consideradas não estáveis por até três anos seguidos.
Quais são os direitos da população atingida diretamente pela tragédia?
Essa não é minha área de especialidade. Entendo que elas têm direito a serem plenamente indenizadas por toda a perda material pela que sofreram. Existe ainda um grande sofrimento psicológico atrelado ao processo da tragédia, meses sem emprego, longos períodos morando em casas alugadas pela Samarco, sem garantias sobre o futuro. Deveria ainda haver esforços para minimizar tal sofrimento.
Como está o meio ambiente local seis meses após o desastre?
Estive em Mariana no final do ano passado, 30 dias após o desastre. Desde então não voltei. Naquele momento, a situação nas áreas mais atingidas era de total destruição.
Qual a realidade hoje das barragens de rejeito? Existem riscos de novos acidentes?
Como mencionei anteriormente, o estado de Minas Gerais realiza anualmente um Inventário do estado das barragens no estado. No ano de 2014 existiam 27 barragens onde os auditores não garantiam a estabilidade e ainda 12 para as quais eles não conseguiram apresentar conclusões se estariam estáveis ou não. Isso totaliza 39 barragens em risco só no estado de Minas Gerais. Temos de levar em consideração que a barragem do Fundão, no ano de 2014, foi considerada como estável. Portanto existe um risco real de novos desastres como esse.
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Especialista alerta para risco de novos desastres em barragens de Minas Gerais - Instituto Humanitas Unisinos - IHU