Por: André | 18 Abril 2016
Lesbos e Lampedusa. Porta Santa e lava-pés. A maleta na mão na escada do avião. Assim Francisco atualiza o teatro pedagógico dos jesuítas do século XVII.
A reportagem é de Sandro Magister e publicada por Chiesa.it, 15-04-2016. A tradução é de André Langer.
Devemos reconhecer a Francisco uma extraordinária genialidade teatral, de verdadeiro jesuíta do século de ouro.
Seu aparecimento no próximo sábado 16 de abril na ilha de Lesbos, nas praias onde chegam os emigrantes do Mar Egeu, terá, por si só, um impacto formidável na plateia do mundo. O programa do dia é reduzido, mas não haverá necessidade de explicar e teorizar nada; bastará a cena.
Assim como aconteceu em Lampedusa no início do seu pontificado, Jorge Mario Bergoglio está reinventando para a hodierna aldeia global o teatro pedagógico da Companhia de Jesus dos séculos XVI e XVII.
Esse sacro teatro barroco tinha suas regras quanto ao seu caráter de espetáculo e exigia muita aplicação dos atores e do público. Com Bergoglio é diferente. Suas representações são de extrema simplicidade e são capazes de conquistar rapidamente a tela, de chegar a todos.
A imponente liturgia católica da Semana Santa ele a concentra em um único gesto, o lava-pés, que, com ele, se converte na notícia do dia, condensada na imagem do Papa ajoelhado, com bacia e avental, lavando e beijando os pés de malfeitores que estão na prisão, prófugos que estão nos campos de acolhida, católicos e não crentes, muçulmanos e hindus, prostitutas e transexuais. Já fez isso quatro vezes e cada vez com pessoas e em lugares diferentes, convertendo cada representação em uma novidade.
Também o ano jubilar tem, com Francisco, sua cena principal: a Porta Santa. As indulgências e o purgatório desapareceram, um Lutero moderno já não tem nada contra o que protestar. A primeira Porta Santa o Papa não a abriu em Roma, mas na profundidade do continente negro, na capital da República Centro-Africana, em plena guerra civil. Um cenário escolhido para demonstrar o que é a misericórdia de Deus que lava todos os pecados do mundo. A Porta Santa de São Pedro Francisco a abriu depois desta, seguida pela da casa dos pobres, perto da estação de trens de Roma.
Além disso, uma sexta-feira por mês o Papa faz uma visita surpresa a um centro para idosos abandonados ou de recuperação de toxicodependentes, lugares que são cuidadosamente escolhidos cada vez.
Estes são os gestos de Francisco que dão volta ao mundo, que são virais. No aeroporto de Fiumicino, quando estava de partida para Cuba em setembro passado, quis que a família síria que acolheu em uma casa do Vaticano, não longe dos muros, fosse despedi-lo. Depois, fez que lhe entregassem sua maleta preta e, com ela na mão, subiu as escadas do avião, como sempre faz. Para que todos saibam que ninguém carrega sua maleta, que faz e decide por si mesmo. De fato, nunca aparece ao seu lado nenhum dos seus dois secretários pessoais.
A teatralidade de Francisco inclui também a capacidade de ocultar o que pode prejudicar sua imagem. Em 21 de março passado, segunda-feira da Semana Santa, recebeu no Vaticano Nicolas Sarkozy e Carla Bruni. E, milagrosamente, conseguiu que a notícia não vazasse.
Com os chefes de Estado e de Governo, nas fotos oficiais, está muito atento a graduar os sorrisos, assinalando a cada um a pontuação que merece.
Expressão séria com François Hollande, recebido pouco depois da legalização na França do casamento para lésbicas e homossexuais.
Expressão severa com o novo presidente argentino Mauricio Macri, leigo e liberal, cuja vitória foi para Bergoglio uma derrota lacerante.
Na Argentina, todos recordam Bergoglio como uma pessoa reservada, com o rosto sempre sério. Mas, desde que é Papa, em contato direto com a multidão, é o contrário. É uma explosão de jovialidade, tão bem representada que parece espontânea.
Ele também gosta de improvisar com palavras e não deixam de florescer as anedotas, que tira de um repertório que não é muito extenso, mas que é bem sortido. Gosta de interagir com o público. Diz uma frase e faz a multidão repeti-la em coro uma, duas, três vezes seguidas, para que as pessoas a gravem em sua mente.
Apenas eleito Papa adotou uma cena para as suas representações cotidianas, que passou a ser a Casa Santa Marta, perfeita para a sua comédia de fantasia, em vez do Palácio Apostólico, tão adequado para os clássicos do teatro.
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Abram a cortina. Entra em cena o teatro do Papa - Instituto Humanitas Unisinos - IHU