26 Fevereiro 2016
Recife, um grupo de amigos, dois deles de mãos dadas. Foi o suficiente para gerar a ira de um desconhecido. "Suas bichas, vou atirar em você", ele ameaçou apontando uma arma. E da situação de desespero e impotência, nasceu a ideia de um documentário que empoderasse quem se encontra desprotegido.
A reportagem é de Renata Nogueira, publicada por UOL, 25-02-2016.
O publicitário Marlon Parente idealizou "Bichas, o documentário" em cem dias. Juntou seis amigos com histórias e perfis diversos, pegou uma câmera emprestada e ouviu o que eles tinham a dizer. Gravou na luz natural por não ter equipamento e só investiu em um microfone, que custou R$ 10. Colhidos os depoimentos, editou todo o material sozinho.
"Eu tinha duas opções: deixar esse episódio tomar conta de mim e me corroer ou fazer algo para que eu pudesse superar", conta Marlon em entrevista ao UOL.
Como é publicitário, ele usou uma estratégia de soltar trechos curtos para promover o projeto. Desde o último sábado (20), "Bichas" está disponível completo e de graça no YouTube.
A grande sacada de Marlon foi desmistificar a palavra bicha e mostrar que ela pode ser um elogio no lugar de xingamento. Em três dias, seu primeiro documentário já tinha mais de 100 mil visualizações. Mais dois dias e o número dobrou. Até a tarde desta quinta (25), 205 mil já haviam acessado "Bichas" no YouTube.
O deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) compartilhou "Bichas" em sua página do Facebook, que conta com quase 900 mil seguidores. "O documentário cumpre a tática de se apropriar do insulto e de esvaziá-lo de seu sentido negativo e preenchê-lo com um significado de afirmação da diferença. Eu sou Jean Wyllys, tenho 41 anos e também sou bicha!", escreveu.
Luciana Genro, que foi candidata à Presidência da República em 2014, também recomendou "Bichas" para seus quase 500 mil seguidores no Facebook. "Excelente e emocionante documentário que empodera as bichas!", elogiou. Fora do meio político, também tiveram recomendações da banda UÓ e de atrizes globais, segundo o diretor.
Tanta repercussão já rendeu um convite para Marlon exibir "Bichas" no festival de cinema O Cubo, no Rio de Janeiro. O pernambucano diz não ter investido dinheiro na divulgação e garante que tudo o que aconteceu até agora foi espontâneo e orgânico. "Estou bem ansioso pra conhecer o que os cariocas têm pra dizer sobre as minhas bichas".
O diretor e os personagens do filme têm recebido depoimentos de pessoas que se identificam com as histórias. Marlon se diz impressionado com o efeito de 39 minutos de vídeo sobre as pessoas. Jovens estão botando o filme na sala de casa para se assumir para os pais. "A ideia era gerar identificação e mostrar para as pessoas que tudo se resolvia quando se tem coragem e amor. "Ser bicha é mais do que se assumir, é um ato político".
O trabalho que surgiu do preconceito e da intolerância deve agora render mais frutos para Marlon Parente, que pretende seguir filmando sobre o tema. "É muita bicha, é muita sapatão e é muita gente que não é nem um nem outro, mas que procuram entender e respeitar esses citados. Tá tudo muito lindo", conclui.
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Com orçamento de R$ 10, documentário "Bichas" nasceu após ameaça com arma - Instituto Humanitas Unisinos - IHU