02 Dezembro 2015
Antes da tragédia com uma barragem em Mariana (MG), a mineradora Samarco havia registrado, desde 2005, pelo menos outros cinco episódios de rompimento de suas estruturas – quatro dos quais tiveram vazamentos de lama que chegaram até a matar peixes e paralisar a captação de água.
A reportagem é de Estêvão Bertoni e Thiago Amâncio, publicada pelo jornal Folha de São Paulo, 02-12-2015.
Embora não sejam comparáveis ao desastre do último dia 5 que devastou a bacia do rio Doce, eles resultaram em danos sob discussão até hoje.
Um dos episódios, em 2005, envolveu um dique de contenção da Cava do Germano, próximo ao local onde em 2008 passou a funcionar a barragem do Fundão – a que provocou um "tsunami de lama" no mês passado, deixando ao menos 11 mortos (oito pessoas estão desaparecidas).
Ele foi relatado pela própria Samarco, controlada pela Vale e pela anglo-australiana BHP Billiton, em um de seus relatórios de sustentabilidade – que acabou retirado nos últimos dias da página da mineradora na internet.
"A causa foi excesso de chuva. A gente estava passando por um momento de chuvas intensas, mas, mesmo assim, esse dique teria que suportar", afirma Sérgio de Moura, funcionário da empresa desde 1984 e diretor do sindicato dos trabalhadores da mineradora em Mariana.
O rompimento nesse caso só afetou equipamentos da unidade. Mas, no mesmo ano, um vazamento de um dos espessadores (tanque onde é feita a separação entre sólidos e líquidos) de Germano atingiu a vegetação de uma encosta e a estrada. A empresa foi autuada pela Fundação Estadual do Meio Ambiente.
Em 2006, novo vazamento, desta vez de polpa de minério, foi registrado em Barra Longa (MG), atingindo dois córregos. A Samarco teve que construir uma bacia de contenção e distribuir material de limpeza e água para seis famílias que utilizavam os córregos para lavar roupas.
Em 2008, 1.890 m³ de polpa de minério (equivalentes a 75% de uma piscina olímpica) vazaram do mineroduto da empresa em Anchieta (ES), atingindo uma área de pastagem e um córrego. Naquele ano, ela foi multada em R$ 1,6 milhão pelo Instituto Estadual de Meio Ambiente do Espírito Santo.
Em 2010, 433 m³ de polpa de minério causaram morte de peixes no rio São João e a interrupção, por três dias, de captação de água em Espera Feliz (MG). "Dois anos depois, a Samarco reintroduziu peixes no rio. Não sei se vingou, pois não temos estudos", diz Rodrigo Carrara, diretor de Meio Ambiente da prefeitura.
O promotor Bruno Guerra diz que a lama causou danos em áreas de preservação. "O Ministério Público busca indenização dos danos ambientais irrecuperáveis e danos morais coletivos." Há um inquérito civil aberto.
O consultor em barragens Jehovah Nogueira Jr. afirma que quantidade vazada é grande e pode indicar que a empresa demorou para agir.
Outro Lado
Procurada, a Samarco não respondeu sobre os casos específicos citados pela Folha.
A mineradora afirmou, por meio de sua assessoria, que "tem respeito à vida como um de seus valores" e "segurança como prioridade em suas operações." Disse ainda que tem índices de acidentes de trabalho abaixo da média mundial da mineração, mas não informou quais são.
Segundo a Samarco, os minerodutos são monitorados em tempo real, e o fluxo de polpa de minério é interrompido "tão logo sejam detectadas possíveis falhas".
"A Samarco acionou planos de emergências específicos e realizou ações para mitigação dos danos, além de promover a limpeza das áreas afetadas. Cabe ressaltar que a polpa de minério de ferro é inerte", diz.
A empresa afirma que os relatórios não estão mais no site por estar priorizando as divulgações sobre Mariana.
O diretor jurídico da Vale, Clovis Torres, disse que a mineradora não pode ser responsabilizada legalmente pelo rompimento da barragem da Samarco em Mariana (MG).
"Você pode até discutir que a Vale tem responsabilidade enquanto acionista da Samarco, mas responsabilidade legal, a resposta é não", afirmou em evento na Bolsa de Nova York, nesta terça-feira (1º). A Samarco é controlada em conjunto pela Vale e pela BHP.
O diretor jurídico afirmou que a Vale não foi notificada formalmente da ação civil planejada pelo governo federal, que prevê a criação de um fundo de R$ 20 bilhões para recuperar a bacia do rio Doce.
A companhia reconheceu que os acionistas podem ser chamados a resolver danos ambientais caso se comprove que a Samarco não tem condições de arcar com os prejuízos.
"A Samarco não é uma empresinha qualquer, não é um botequim. É uma companhia de US$ 10 bilhões, que fatura US$ 2 bilhões por ano. Não há que se falar, neste momento, em responsabilidade dos acionistas e muito menos em provisão por parte dos acionistas", disse Torres.
Diante do tamanho da tragédia no rio Doce, que ainda está em curso, não é possível afirmar quanto da bacia hidrográfica entupida pela lama poderá ser recuperada. O que não significa, segundo especialistas, que se deva desistir de tentar.
O plano da ONG WWF é oferecer uma ferramenta usada em outras partes do mundo, e também no Pantanal, que ajuda a criar "bombas de água limpa" para tentar desentupir os rios da região.
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Samarco teve outros 4 vazamentos de lama antes de tragédia em MG - Instituto Humanitas Unisinos - IHU