Por: Jonas | 11 Novembro 2015
“A direita cresce quando consegue ganhar terreno ideológico junto aos desempregados desesperados e aos setores mais atrasados dos trabalhadores e das classes médias pobres, que se unem em torno da minoria dos grandes capitalistas ou de um grupo de adventícios e aventureiros a serviço destes”, escreve Guillermo Almeyra, colunista internacional do jornal La Jornada (México), 08-11-2015. A tradução é do Cepat.
Eis o artigo.
Immanuel Wallerstein vê uma reanimação da esquerda, em nível mundial, baseando-se no triunfo de Justin Trudeau no Canadá, na vitória de Jeremy Corbyn pelo Partido Trabalhista britânico e na existência de um novo governo australiano. Estas mudanças no Commonwealth são saudáveis, mas Trudeau é liberal – no melhor sentido da palavra –, não anticapitalista, Corbyn expressa somente uma tendência radical em um partido burguês de origem operária, que busca cursar suas origens para não ser varrido completamente do panorama político, e a Austrália depende muito de seu comércio com a China, o que explica suas reticências nas relações com Londres e Washington.
Na minha avaliação, não se pode falar de uma reanimação da esquerda anticapitalista quando não há grandes movimentos antissistêmicos na Europa, nem na América, e quando a esquerda praticamente não existe na Rússia, onde Putin realiza uma política que mistura os restos do czarismo com os do stalinismo, ao mesmo tempo em que nem existe a não ser em pequenos núcleos na China, cujo governo se dedica com afinco em construir um capitalismo moderado.
Qual “reanimação” pode haver quando na Alemanha se reforça Angela Merkel, na França o primeiro partido é a Frente Nacional lepenista (com o qual, diga-se de passagem, Putin tem relações privilegiadas), na Europa central e na Escandinávia predominam as forças ultradireitistas e crescem os nazistas, na Espanha continua sendo majoritário o franquista Partido Popular de Rajoy e na Itália não há esquerda, mas, sim, direita fascista ou fascistizante, sem falar do que ocorre na Argentina, no Brasil, na própria Venezuela, e dos problemas gravíssimos que todos os governos chamados “progressistas” da América Latina enfrentam?
Nem sequer nos anos 1930, entre as duas guerras, os movimentos que se declaram anticapitalistas foram tão frágeis e tão isolados. Hoje, a direita avança em todos os lugares, sendo que em 1934 os operários socialistas e comunistas impuseram sua unidade classista e esmagaram na rua os clerical-fascistas. Nos anos 1934-1939, com a insurreição de Astúrias e o governo de esquerda de 1936, o povo espanhol combateu a monarquia fascista, no Chile e no Brasil os operários esmagaram o fascismo na rua, na Argentina cresceram enormemente as greves e os sindicatos, em Cuba os estudantes e o povo derrubaram a ditadura de Machado.
Elemento fundamental dessas resistências foi a esperança na possibilidade de uma saída anticapitalista à crise e a existência de um movimento operário de massas anarquista, socialista, comunista, que hoje não existe, pois foi primeiro castrado e finalmente destruído pelas políticas dos partidos social-democratas e comunistas, que culminaram com as transformações das burocracias estalinistas russa e chinesa em milionários capitalistas, mafiosos e corruptos.
A direita cresce quando consegue ganhar terreno ideológico junto aos desempregados desesperados e aos setores mais atrasados dos trabalhadores e das classes médias pobres, que se unem em torno da minoria dos grandes capitalistas ou de um grupo de adventícios e aventureiros a serviço destes.
A esquerda cresce, ao contrário, quando se mede e vê a si mesma atuando nas lutas antissistêmicas, não quando se institucionaliza e se adapta ao jogo eleitoral, após se submeter ao Estado capitalista acompanhando uma direção plebeia “progressista” que não quer, nem pode sair dos marcos do sistema.
Evo Morales não foi o criador da esquerda social boliviana: foram as lutas massivas pela água e pelo gás e as mobilizações camponesas e indígenas que expulsaram Sánchez de Lozada e impuseram eleições, nas quais venceu Evo sobre a base de uma nova relação de forças sociais, que depois permitiu derrotar o separatismo e as manobras da direita. Hugo Chávez não criou o chavismo. Simplesmente canalizou, com sua vontade revolucionária e sua negativa em se render, a exigência de uma mudança social que teria se originado com o ‘Caracazo’ e que depois se organizou para libertar o presidente Chávez, derrotado e preso. Inclusive, o triunfo eleitoral de Kirchner só foi possível em razão da sangrenta mobilização de dezembro de 2001, que obrigou um presidente da União Cívica Radical fugir de helicóptero.
Os governos “progressistas” – ao subordinar os movimentos sociais ao Estado e ao aceitar as regras do establishment querendo parecer “sensatos” e ganhar o apoio eleitoral de setores conservadores – destroem não só sua base social, como também a consciência política da mesma, como o Syriza e o espanhol Podemos. Eles difundem uma ideologia que castra os trabalhadores. O kirchnerismo agiu assim ao sustentar que não existem as classes (em um país onde as classes dominantes tem uma clara e brutal consciência de classe!) e Lula e a direção do PT porque acreditavam que para governar era lícito prescindir da ética, ter políticas conservadoras e entrar em qualquer arranjo para comprar uma maioria.
Sem a luta contra-hegemônica das esquerdas anticapitalistas no campo político e cultural, a direita dominará ideologicamente sem obstáculos. São as deficiências das esquerdas que fazem as direitas crescer. É a falta de independência frente ao Estado capitalista e a seus governos “progressistas” o que desarma e desmobiliza aos trabalhadores, o que lhes impede de varrer as burocracias sindicais agentes do capitalismo, de se auto-organizar, criar poder cotidianamente a partir da base e de desenvolver suas capacidades e iniciativas. Os governos que, como o venezuelano, acreditam poder conduzir uma luta contra o imperialismo e a direita só com o aparato estatal e, sobretudo, as forças armadas e muita retórica nacionalista, preparam sua derrota. Os instrumentos do capitalismo – e o Estado atual é um deles – são frágeis e insuficientes para a luta contra o grande capital. Se você quer democracia, lute pela revolução social.
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Como crescem as direitas? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU