Por: André | 14 Outubro 2015
Como no romance de Agatha Christie, O Caso dos Dez Negrinhos, cada vez vão diminuindo o número de cardeais que garantem ter assinado ou estar de acordo com a polêmica “carta dos 13”, criticando a metodologia do Sínodo e, no final das contas, contra o próprio Papa. Assim, aos desmentidos Scola, Vingt-Trois, Erdö e Piacenza, somam-se agora George Pell, que nega ter assinado um escrito com esse conteúdo, e o cardeal Napier, que anunciou que retirava sua assinatura do texto. Na falta de novas ausências, restam apenas sete dos signatários originais, cujo silêncio os retrata.
A reportagem é publicada por Religión Digital, 13-10-2015. A tradução é de André Langer.
O que ninguém pode evitar, a esta altura, é que a publicação desta carta, denunciando a metodologia utilizada e uma tentativa de manipular o resultado do Sínodo sobre a Família, criou mal-estar entre os participantes e turvou a celebração da reunião.
O jornalista do semanário italiano L’Espresso especializado no Vaticano, Sandro Magister (que foi descredenciado após publicar antecipadamente a última encíclica papal), publicava na segunda-feira em seu blog uma carta assinada por 13 cardeais pertencentes à área mais conservadora da Igreja católica na qual informavam ao Papa sua oposição à metodologia aplicada neste Sínodo.
Também o acusavam de querer manipular o resultado ao concentrar-se muito em questões como a de permitir o acesso aos sacramentos aos divorciados recasados.
As dúvidas sobre se a carta era verdadeira surgiram depois que vários cardeais desmentiram que tivessem assinado a carta. Mas a imprensa italiana publicou na terça-feira declarações do cardeal George Pell que confirmam a existência deste documento enviado ao Papa sobre o Sínodo, embora desminta categoricamente o conteúdo publicado.
“As assinaturas estão erradas, mas, acima de tudo, o conteúdo está errado. A maior parte do conteúdo não corresponde (à carta enviada ao Papa). Não sei por que isso aconteceu e quem a vazou assim”, explicou Pell, também prefeito da nova Secretaria de Economia, em declarações publicadas na terça-feira pelo jornal La Repubblica.
O mistério está servido e, como em outro escândalo que no passado convulsionou o Vaticano, o Vatileaks, agora os membros da Igreja se perguntam quem vazou o documento ao jornalista, com que objetivo e qual era o verdadeiro conteúdo da carta.
Quatro cardeais disseram explicitamente que não assinaram nada: o arcebispo de Milão, Angelo Scola, e o arcebispo de Paris, André Vingt-Trois; o relator geral do Sínodo, o húngaro Peter Erdö, e o penitenciário maior, Mauro Piacenza.
Diferente é a versão do cardeal sul-africano Fox Napier, que disse que retirava a assinatura da carta porque o texto não correspondia ao conteúdo que lhe haviam comunicado.
O cardeal alemão Ludwig Müller, prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé (o ex-Santo Ofício), também aparece entre os signatários, e, na terça-feira, em declarações ao Corriere della Sera, embora não queira confirmar nem desmentir sua assinatura, denuncia o fato de que tenha sido publicada.
“É um escândalo que se publique uma carta privada do Pontífice. Isto é um novo Vatileaks (...). A intenção de quem quis tornar pública esta carta é a de semear intrigas e criar tensões. Parece-me claro”, disse Müller.
Por enquanto, os demais, entre os quais se encontra o cardeal Jorge Urosa Savino, arcebispo de Caracas, guardam silêncio.
Na carta publicada, lê-se que “a nova metodologia que dirige o Sínodo parece assegurar uma excessiva influência sobre as deliberações do Sínodo e o documento sinodal final”.
Particularmente, refere-se ao maior espaço de discussão dos chamados Círculos Menores, nos quais os participantes se agrupam por idiomas, e em que a comissão para a redação do documento final não foi escolhida, mas nomeada pelo Papa, assim como também criticam o conteúdo do Instrumentum Laboris, o documento sobre o qual se baseia a discussão.
Mas, o que consideram mais “urgente” é que “vários padres expressaram sua preocupação com o fato de que um Sínodo planejado para enfrentar uma questão pastoral vital – reforçar a dignidade do matrimônio e da família – possa ser dominado pelo problema teológico/doutrinal da comunhão aos divorciados que casaram novamente no civil”.
A carta teria a data de 05 de outubro, justamente o dia em que começou o Sínodo. Isso explicaria a intervenção não prevista, no dia seguinte, do Papa Francisco, quando tomou a palavra no Sínodo e convidou os 270 padres sinodais a evitar pensar que existem “complôs” ou “manipulações”.
O Papa falou aos presentes sobre a “hermenêutica da conspiração” e convidou-os a ter “uma plena confiança uns nos outros, a estar convencidos do que se diz, e que o processo sinodal se realiza em plena liberdade e expressão sincera das próprias opiniões”.
Este novo episódio voltou a demonstrar que mesmo que o Papa os tenha convidado a não pensar no Sínodo como um “Parlamento” composto por facções, a Igreja está dividida, e a ala mais conservadora segue mostrando suas inquietações diante da possibilidade de que haja aberturas ou mudanças na que consideram a intocável doutrina.
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Já são apenas sete os signatários da “carta dos 13” cardeais contra o Papa - Instituto Humanitas Unisinos - IHU