18 Setembro 2015
Não temos certeza da quantidade de petróleo, gás ou carvão que ainda resta debaixo da terra. Mas o que começa a ficar claro é que, se queimarmos tudo para mover carros e indústrias, aquecer as casas ou fazer plásticos, a Antártida vai derreter. Um grupo de pesquisadores analisou o impacto das futuras emissões de carbono procedente dos combustíveis fósseis na calota polar. Em todas suas simulações, ela vai perder boa parte do gelo e, na pior das hipóteses, toda. Não vai ser amanhã, mas a consequência direta será a elevação do nível do mar várias dezenas de metros.
As últimas estimativas da OPEP calculavam as reservas provadas de petróleo em quase 1,5 trilhões de barris de petróleo. Na última década, foram produzidos cerca de 160 bilhões de barris, mais do que o consumido de 1870 até este século. Uma divisão simples mostra que há petróleo por mais um século. No entanto, estes números devem ser tomados com cuidado. Não incluem o carvão e, como demonstrou o fracking, ainda há muito gás e petróleo não convencional que o avanço da tecnologia trará à tona.
Mas, considerando apenas as reservas conhecidas hoje, um grupo de pesquisadores norte-americanos e alemães demonstrou como é arriscado continuar apostando no petróleo para mover o mundo. Partindo do carbono liberado em sua combustão e acumulado na atmosfera e oceanos até 2010, mediram o impacto que terá na Antártida o esgotamento das reservas ainda restantes. O interesse na evolução do continente gelado é evidente: se todo o gelo que se acumulou durante milhares de anos derretesse, o nível do mar subiria cerca de 60 metros, altura suficiente para inundar as cidades e vilas onde vivem mais de 1 bilhão de pessoas.
“O que estamos fazendo hoje, o que fizermos nas próximas décadas, está provocando mudanças, como a perda do gelo da Antártida e o consequente aumento do nível do mar, que vai durar por milênios”, diz a pesquisadora do Instituto para a Pesquisa do Impacto Climático da Universidade de Potsdam (Alemanha), Ricarda Winkelmann, que esteve na Antártida estudando a evolução de seus gelos. “Se queremos evitar que a Antártida fique sem gelo precisamos deixar o carvão, o gás e o petróleo debaixo da terra”, acrescenta.
Para apoiar estas alegações, Winkelmann e seus colegas, entre os quais está o renomado climatologista Ken Caldeira, analisaram a evolução do carbono (C) na atmosfera liberado pelos combustíveis fósseis. Em 2010, ponto de partida de suas simulações, havia no ar cerca de 600 gigatoneladas de carbono (1 GTC equivale a 1 bilhão de toneladas de carbono). De acordo com estimativas do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), se quisermos manter o aumento da temperatura média global abaixo dos 2 graus, o número de GTC não deveria exceder as 1.000 gigatoneladas.
“Além desse ponto, o risco do impacto da mudança climática aumenta drasticamente. Se continuarmos queimando todos os recursos de combustíveis fósseis conhecidos, acabaremos com emissões acumuladas de cerca de 10.000 GTC”, afirma Winkelmann. Com um modelo climático para estudar o comportamento do gelo desenvolvido por seu instituto, a pesquisadora alemã e seus colegas aplicaram o aumento global da temperatura à escala regional da Antártida.
Na evolução do gelo no continente há muitos fatores intervindo, como a neve caindo, a orografia do terreno e a proporção de gelo que flutua no mar. Os dois principais agentes de mudança em sua estabilidade são o aumento na temperatura do Oceano Antártico e do ar. De acordo com suas projeções, o primeiro a golpear será o mar. O aquecimento gradual das águas oceânicas vai minar a cobertura de gelo marinho por baixo. Segundo as estimativas, para cada grau mais quente, a linha de gelo vai recuar entre 7 e 16 metros anuais.
Numa segunda fase, o ar mais quente vai terminar a tarefa. Recentemente foi demonstrado que o aumento da temperatura do ar no polo sul está levando mais umidade para o interior da Antártida o que, no curto prazo, aumentará as precipitações e, portanto, a quantidade de gelo. Mas, junto com a ação do oceano, essas neves só servem para desestabilizar a camada de gelo se a temperatura continuar subindo.
A primeira área a sucumbir por culpa do acúmulo de carbono na atmosfera será a Antártida Ocidental, que há anos está perdendo gelo. A partir das 1.000 GTC, em apenas 100 anos se continuar a progressão atual, a próxima área a cair será a Terra de Wilkes, uma enorme bacia que, por si só, poderia causar uma elevação do mar de três a quatro metros. E Wilkes já está na Antártida Oriental, até recentemente imune aos vaivéns do clima. Com um acúmulo de carbono de 2.500 GTC, praticamente a totalidade do gelo da Antártida terá derretido.
De acordo com este estudo, publicado na revista Science Advances, apesar de que suas projeções chegam aos 10.000 anos, a maior parte do derretimento vai acontecer no próximo milênio, com uma elevação do nível do mar de três metros por século. Mas será o que fizermos com o petróleo nas próximas décadas que vai determinar o futuro da Antártida.
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Queimar o petróleo que resta vai derreter todo o gelo da Antártida - Instituto Humanitas Unisinos - IHU