08 Setembro 2015
Arquibancadas cheias de gente, protestos desinflados e um princípio de tumulto. Apesar de ter ouvido algumas vaias e ganhado um boneco inflável gigante que a satiriza, a presidenta Dilma Rousseff atravessou a parada militar deste 7 de Setembro sem maiores sobressaltos vindo das ruas. Os organizadores de atos contra e a favor do Governo petista tiveram suas expectativas frustradas: a adesão dos dois lados foi abaixo do esperado. Entre os que defendem o impeachment, havia cerca de 1.000 pessoas, enquanto que os que são contrários, havia 200. Os dois grupos esperavam ao menos dez vezes mais. O público que foi assistir à parada militar foi composto por 25.000 espectadores. As estimativas foram divulgadas pela Polícia Militar.
A reportagem é de Afonso Benites, publicada por El País, 07-09-2015.
Ainda assim, ela não teve alívio no front político. A lista de ausências de autoridades na tribuna presidencial demonstrou exatamente o momento de crise e isolamento da gestão Rousseff. A maioria dos ministros presentes era filiada ao seu partido, o PT.
O vice-presidente, Michel Temer, que nas últimas semanas deu declarações polêmicas que foram interpretadas como um afastamento do seu PMDB da gestão petista estava lá, mas apenas um dos seis ministros peemedebistas o acompanhou. Nem representantes de outros poderes que costumam participar de atos solenes como esse apareceram.
Duas das ausências notadas foram dos também peemedebistas Renan Calheiros, presidente do Senado, e Eduardo Cunha, da Câmara.
Nesta terça-feira, Temer, que teve de divulgar nota para dizer que não "conspira" contra a chefe do Planalto, se reúne com governadores e congressistas do PMDB para debater a situação e todos esperam que venha desse encontro sinais que esclareçam se é real ou não o descolamento do vice de Rousseff.
A presidenta não discursou na cerimônia em Brasília. Antes do desfile, e em um pronunciamento divulgado na internet para evitar eventuais panelaços, Rousseff voltou a defender a sua gestão, admitiu que o seu Governo cometeu erros e disse que o remédio para superar a crise será amargo. “Se cometemos erros, e isso é possível, vamos superá-los e seguir em frente”, afirmou e completou: “Alguns remédios para essa situação, é verdade, são amargos, mas são indispensáveis”.
Nas Esplanada dos Ministérios ficou evidente a preocupação do Governo com os protestos. Para tentar frear as manifestações, o Ministério da Defesa instalou tapumes de aço entre os gramados da esplanada e o trecho onde ocorreu o desfile. A tentativa não surtiu resultado e causou revolta nos anti-dilmistas, que batizaram o tapume de “Muro da Vergonha”. Em alguns momentos do desfile, manifestantes a favor do impeachment batiam panelas e colheres nas chapas de aço
Mas nem toda a dificuldade para demonstrar insatisfação eles podem atribuir ao Planalto. Os próprios organizadores dos protestos pelo impeachment exibiram desorganização. Havia quatro carros de som. Cada um com um animador diferente que em muitos momentos falavam ao mesmo tempo ou tocavam músicas distintas. Um deles, o que estendia faixas pedindo uma intervenção militar, tinha somente um seguidor. Os demais, eram rodeados por centenas de pessoas, muitas delas segurando um boneco do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vestido de presidiário, batizado de “Pixulequinho” e vendido na hora por 10 reais – a camiseta com a mesma imagem custava 30 reais. “Estou aqui porque não aguento mais ver tanta roubalheira e descaso com a população”, afirmou o empresário Paulo Gioffoni, que viajou 1.100 quilômetros entre Cruzeiro (SP) e Brasília para participar do protesto.
No gramado em frente aos anti-petistas havia dois bonecos de plástico gigantes, o Pixuleco, representando Lula, e a “Pinóquia” ou “Dilmandioca”, uma sátira da presidenta Rousseff com o nariz grande. A ventania foi um adversário desses dois bonecos que passaram mais tempo desinflados do que cheios, devido a alguns rasgos que tiveram de ser reparados pelos organizadores. “Vim tirar um selfie, mas os dois bonecos estão murchos, caídos. Antes quem tivesse caído fosse a Dilma”, afirmou o vendedor Carlos Freitas, de 21 anos.
Entre os ativistas de esquerda, o cenário não foi muito melhor. Os representantes dos movimentos sociais, que participaram do tradicional “Grito dos Excluídos” e bradavam não ao golpismo, dividiram-se em duas alas. A primeira, formada por filiados ao PT e associados à Central Única dos Trabalhadores (CUT), carregava duas gigantes bandeiras vermelhas. A outra com membros de movimentos feministas, LGBT, trabalhadores sem-terra e sem-teto seguia uma espécie de uma bateria de escola de samba. Neste segundo grupo era possível ouvir gritos de “Fora PT”, sempre entoados pelo Movimento de Resistência Popular (MRP).
“Não temos ligação com nenhum partido. Estamos aqui contra o ajuste fiscal e pedindo mais moradias”, disse Maria Souza, uma das representantes dos sem-teto do MRP que, antes do desfile, atearam fogo em pneus no início da Esplanada dos Ministérios, a avenida onde ocorreu a parada militar, mas distante da tribuna presidencial e dos olhos do público.
O único momento em que todos os que pediam o impeachment falaram em uníssono foi quando um dos animadores iniciou um Pai Nosso e, na sequência, entoou o Hino Nacional.
Nesta segunda-feira, policiais civis do Distrito Federal também aproveitaram o dia para protestar. Cerca de cem deles carregavam bandeiras e faixas pedindo melhorias das condições de trabalho e reajuste salarial. Os policiais locais estão entre os que têm os melhores salários no país: 8.600 reais para os agentes e 16.000 reais para delegados. Dois chegaram a ser detidos por alguns minutos porque tentaram entrar sem autorização no desfile.
Quebra-quebra
Ao final da parada militar, houve um princípio de quebra-quebra. Justamente no momento em que um grupo inferior a 50 petistas passavam pela avenida, os manifestantes começaram a derrubar as chapas de aço instaladas como tapumes pelo Ministério da Defesa. Quando se depararam com os petistas, lançaram garrafas de plástico, latas e cocos. Ninguém foi atingido e a Polícia Militar não deteve nenhuma pessoa, apenas pediu calma para quem incitava a violência.
Mais cedo, havia sido registrado um princípio de vaias à Rousseff. Enquanto alguns espectadores do desfile vaiaram quando o seu nome foi pronunciado nos alto-falantes, outros a aplaudiam. Ao jornal Valor Econômico, o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Miguel Rossetto, disse que as ações contra a presidenta não preocupavam o Governo.
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Dilma enfrenta protestos desinflados e diz que remédio da crise será amargo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU