16 Julho 2015
Quem esteve na Praça de São Pedro, em meados de junho, durante a audiência papal das quartas-feiras, notou uma estranheza. Ao lado dos compassados agentes da Gendarmeria Vaticana de terno preto, camisa branca, gravata e fone de ouvido, distinguiam-se algumas pessoas que tentavam proteger Francisco com modos incomuns para os padrões romanos. Com efeito, eram agentes do Serviço Secreto estadunidense.
A reportagem é de Massimo Franco, publicada no jornal Corriere della Sera, 09-07-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Quem logo percebeu isso foi uma senhora que assistia à audiência atrás do altar, ao lado da Basílica de São Pedro: "Aqueles ali não parecem italianos". Ela tinha razão. Aqueles três 007 norte-americanos estavam ali apenas por essa vez: inseridos no grupo que escolta o pontífice, para se acostumarem com os métodos de Jorge Mario Bergoglio.
Eles estavam se "treinando" para garantir a segurança do papa em vista da viagem que ele fará entre os dias 21 a 25 de setembro. A ideia teria sido da Gendarmeria e de Joseph Clancy, escolhido por Barack Obama como chefe do Serviço Secreto em fevereiro passado: Clancy, naqueles dias, estava em Roma, de férias, com a família.
Logo se entendeu que a sua tarefa não será fácil. Eles devem proteger uma pessoa um pouco especial, que não gosta de ser marcado de perto: especialmente quando lhe impedem o contato com a multidão.
Sabem algo disso na Filadélfia, onde se tinha pensado em instalar uma longa barreira no trecho de maior risco das ruas que Francisco vai percorrer. Quando o projeto foi comunicado aos que conhecem os hábitos papais, o ceticismo foi tão evidente que os organizadores estão pensando em algo diferente. Ver as pessoas amontoadas atrás de um tipo de cerca não agradaria o pontífice.
Até mesmo sobre o carro que o papa vai usar nos deslocamentos houve uma longa negociação: no sentido de que Francisco não quer subir em um veículo blindado, nem com as janelas fechadas. São fragmentos de uma viagem em que se medirão duas culturas diferentes em matéria de segurança.
É a imprevisibilidade papal que cria alguma ansiedade. Os Serviços Secretos dos EUA garantem a sua segurança mesmo que ele tivesse que parar no meio da multidão; mas o pedido é de que as paradas sejam programadas.
No fundo, há o medo do terrorismo islâmico. Os estadunidenses transmitem há meses análises alarmadas sobre as ameaças do Estado Islâmico. E parecem surpreendidos com o pedido vaticano de fornecer informações detalhadas e não indicações consideradas às vezes um pouco genéricas demais.
Obama e Francisco
Até agora, olhou-se muito para como Francisco considera os Estados Unidos; menos para como o "império" norte-americano avalia o pontificado argentino. A história enraizou desconfianças profundas na América Latina contra os gringos, os yankees, apontados como a causa de muitos dos problemas do passado.
Porém, no plano pessoal, Obama e Francisco se encontraram mais do que bem. Se repassarmos as fotos dos encontros entre o 44º presidente dos Estados Unidos e Bento XVI, e aquelas com o papa atual, a diferença é gritante. Os primeiros estavam tão engessados quanto os recentes estavam informais e sorridentes. Talvez também porque, quando Obama esteve na audiência em Roma, ele começou falando mais da própria família do que do Oriente Médio e da Ucrânia: dois temas sobre os quais as diferenças permanecem.
A vontade de conhecer melhor a ideologia de Bergoglio levou os bispos dos EUA a convidar alguns dos seus conselheiros para dar palestras às vésperas da sua chegada. A previsão, em Washington, é de que não haverá tensões nem conflitos: ao menos em nível oficial.
Sobre Cuba, a estratégia é semelhante, embora a transição para o pós-Castro seja avaliada de forma diferente pela Casa Branca. A insistência de Raúl Castro para que o papa continue mediando entre Havana e Washington cria alguns atritos. "O cardeal Jaime Ortega, arcebispo de Havana, é o teórico de uma linha que pode ser resumida com: 'Não nos diga o que devemos fazer'", explica uma fonte norte-americana.
O tema da superação do embargo veio à tona desde o primeiro colóquio entre Francisco e Obama, no dia 27 de março de 2014. Sobre a América Latina, acabado o comunismo, os EUA afrouxaram a garra ideológica, favorecendo uma reconciliação do continente do qual Bergoglio não esconde que quer e pode ser um dos diretores.
Na sua opinião, confirmada pela viagem desses dias ao Equador, Bolívia e Paraguai, a América do Sul e do Norte devem dialogar e se aproximar, não se confrontar. Quanto à frente interna estadunidense, a ajuda à imigração e a luta contra a pobreza são duas questões sobre as quais o papa e o presidente falam uma língua quase idêntica, ao contrário dos republicanos.
"Se eu tivesse que escolher um tema comum, é a imigração", sugeriu o arcebispo de Boston, Sean O'Malley, quando perguntado sobre uma opinião. A própria encíclica sobre as mudanças climáticas e o reconhecimento do Estado palestino alarmaram especialmente os adversários da Casa Branca. Mas, com os democratas, permanece a fratura sobre alguns valores de fundo.
A sentença com a qual, no último dia 27 de junho, a Suprema Corte dos EUA legalizou os casamentos homossexuais perpetua o confronto entre o episcopado católico e Obama, que saudou com entusiasmo a decisão. A convicção norte-americana, no entanto, é que o tema não será abordado na conversa que o chefe da Casa Branca terá com Francisco, que falará – como primeiro papa na história – ao Congresso e irá a Nova York e Filadélfia.
Foi muito destacado que, no dia 27 de maio, quando a Irlanda legalizou por referendo o casamento entre pessoas do mesmo sexo, a reação confiada ao secretário de Estado, Pietro Parolin, foi muito dura. Sobre a decisão da Suprema Corte, no entanto, a Santa Sé se mostrou cautelosa. Foi uma decisão institucional, não popular; e os EUA não são a Europa.
Na Casa Branca, "leram" essa diversidade de comportamento também como um sinal de que o papa não quer o confronto. Isso não significa uma fratura doutrinal. No máximo, é a confirmação de uma abordagem diferente: o reconhecimento de que declarar a "guerra cultural" contra Obama, como fez o episcopado nos tempos de Bento XVI, não é suficiente para frear o enfraquecimento dos valores cristãos.
"Para os bispos, é hora de admitir a derrota e seguir em frente", escreveu de Washington o jesuíta Thomas Reese. "O casamento homossexual está aí e vai ficar." Parece um convite a mudar de configuração e a se somar à do papa.
Por outro lado, até agora, a ofensiva contra Obama dividiu mais do que unificou o mundo católico norte-americano. O desafio de Francisco é o de recompactá-lo, superando as desconfianças que afloram também contra ele.