06 Julho 2015
Um antigo cardeal vaticano que se tornou alvo de um inquérito nacional na Austrália sobre abusos sexuais infantis institucionais tem atraído um forte apoio do seu sucessor em Sydney, que, na quarta-feira, chamou as duras críticas contra o histórico do cardeal George Pell de "tremendamente injustas".
A reportagem é de John L. Allen Jr., publicada no sítio Crux, 02-07-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
"Na realidade, ele foi o primeiro bispo do país a seguir em frente [enfrentando os escândalos de abuso]", afirmou o arcebispo Anthony Fisher, nomeado em setembro passado para suceder Pell em Sydney.
Fisher, geralmente visto como um protegido e confidente de Pell, sugeriu que os críticos do cardeal estão atrás de algo mais do que justiça.
"Há um desejo de um escalpo, de que um grande nome desabe", disse. "Eles querem colocar [Pell] no palco e jogar tomates nele, eles querem humilhação."
Apesar disso, Fisher disse que acredita que Pell tem o apoio do Papa Francisco e previu que Pell vai manter o seu cargo no Vaticano.
Fisher falou em Roma, três dias depois de receber o pálio, um pano de lã curto, símbolo do ofício do arcebispo, das mãos de Francisco.
Pell, 74 anos, atua hoje como prefeito da Secretaria para a Economia, um novo departamento vaticano criado pelo Papa Francisco para supervisionar uma arrebatadora reforma financeira. Ele serviu como arcebispo de Melbourne de 1996 e 2001, e, depois em Sydney, até ser nomeado ao seu posto atual em Roma.
A Comissão Real da Austrália sobre Abusos Sexuais Infantis Institucionais foi criada em 2013 para examinar os abusos de crianças em ambientes como igrejas, escolas, clubes de jovens e instalações do governo. O seu mandato é produzir um relatório final, com vários relatórios intermediários sobre casos ou temas específicos ao longo do caminho.
O painel de seis membros teve um interesse especial no histórico da Igreja Católica na cidade de Ballarat, onde um notório ex-padre chamado Gerald Ridsdale foi condenado por dezenas de acusações de agressão e abuso indecentes, em alguns casos com crianças de apenas quatro anos, de 1960 a 1980.
Fisher disse que "as provas são bastante contundentes de que [o caso Ridsdale e outros] foram tratados de uma forma muito, muito mal pelo então bispo", Ronald Mulkearns, que deixou o cargo em 1997.
Pell nasceu e foi criado em Ballarat, e serviu como jovem padre na diocese. De 1977 a 1984, ele foi membro do colégio de consultores Mulkearns.
Alguns críticos que testemunharam perante a comissão deixaram implícito que Pell tinha conhecimento dos abusos na época, mas não os denunciou, enquanto outros sugeriram que ele ajudou a acobertá-los depois que ele começou a subir a escada eclesiástica.
Peter Saunders, uma vítima de abuso inglesa e um membro de uma comissão vaticana que aconselha Francisco sobre a reforma, disse a um programa de televisão nacional da Austrália que o tratamento dado por Pell às vítimas foi "quase sociopático" e chamou o próprio Pell de "uma grave ameaça" para a proteção das crianças. Alguns meios de comunicação australianos pediram a renúncia de Pell ou que o Papa Francisco o demita.
Fisher, no entanto, disse que a maior parte dessa reação tem a ver com assuntos que vão além do abuso de crianças.
"Por muito tempo, ele foi o clérigo mais proeminente da Austrália, por isso, as pessoas assumem que ele está no comando de tudo, e isso desde o seu nascimento", ironizou, observando que Pell nunca foi bispo de Ballarat e não tinha responsabilidade direta por Ridsdale ou por outros padres da diocese.
"Acrescente a isso que muitas pessoas não gostavam dele pela posição conservadora muito firme que ele assumiu em uma série de questões, e eles ficariam felizes em vê-lo humilhado", disse Fisher.
Fisher afirmou que também há uma ponta pessoal no sentimento anti-Pell.
"Provavelmente, algumas pessoas também estão à procura de uma contrição pública. Eles acham que George [Pell] parece muito autoconfiante ou muito rude, muito desafiador. Há uma espécie de elemento 'macho' em todo o seu comportamento que eles não gostam", disse.
"Eles gostariam de vê-lo chorando, eles gostariam de vê-lo corar. Eles gostariam de vê-lo magoado de alguma forma", disse Fisher. "Talvez, eles estejam pensando que, fazendo-o passar por isso de novo, ele finalmente vai quebrar."
Lembrando que Pell respondeu à maioria dessas acusações várias vezes antes, Fisher disse que a experiência de fazer com que ele faça isso novamente parece uma espécie de pedágio.
"As pessoas acham que ele é indestrutível, mas, ao vê-lo desta vez, eu senti que ele está ficando tocado", disse. "Isso só continua. Não importa quantas investigações existam, elas apenas voltam, e isso se torna um pouco mais vicioso a cada vez."
Fisher previu que Pell irá voltar para a Austrália no fim deste ano para enfrentar uma nova rodada de interrogatórios por parte da Comissão Real e disse que é possível que o relatório final contenha "resultados adversos", acusando Pell de ter deixado de agir de forma adequada.
É improvável que haja qualquer acusação criminal contra Pell, afirmou, mas poderia haver processos adicionais como resultado do relatório, desencadeando o que ele chamou de um "julgamento-show" sobre a conduta de Pell.
"Isso faz parte da punição, penso eu, para alguém nessa situação", disse. "É o envergonhamento, em vez do ressarcimento pelos danos finais."
Apesar disso, Fisher previu que Pell vai sobreviver.
"Eu não acho que as pessoas estejam esperando novas provas, novas descobertas ou alguma nova revelação no sentido de dizer 'todo o tempo eu sabia disso e ajudei o padre X a fazer essa coisa terrível'. Não há nenhuma pistola fumegante à espera de ser descoberta", disse ele.
"Eu acho que isso vai terminar com a volta de Pell a Roma e a continuidade do seu trabalho aqui", disse Fisher. "Eu posso ser surpreendido, mas essa é a minha crença sobre o que vai acontecer."
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Críticos australianos querem ''humilhar'' o cardeal Pell, afirma arcebispo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU