01 Julho 2015
O militante ecologista, enviado especial do presidente para o tema do planeta, vê na carta pontifícia sobre o meio ambiente um apoio de uma força inesperada, a seis meses da Conferência das Nações Unidas sobre o Clima.
A nota foi publicada por L’Observateur, 28-06-2015. A tradução é de Vanise Dresch.
Nomeado, em 2012, enviado especial de François Hollande para o assunto da proteção do planeta e presidente da Fondation pour la nature et l'homme, Nicolas Hulot assinou o prefácio da edição francesa da encíclica papal sobre a ecologia. Nesse texto dirigido aos 1,2 bilhões de fiéis e a “todos os homens de boa vontade”, o papa Francisco expõe seu posicionamento sobre a ecologia e o aquecimento climático.
A seis meses da realização em Paris, em dezembro, da 21ª Conferência das Nações Unidas sobre o Clima, Nicolas Hulot vê nessa carta pontifícia um apoio de uma força inesperada. Ele assina, com exclusividade, um artigo no “L’Obs”, aqui reproduzido.
Publicada pelo papa Francisco a seis meses da Conferência de Paris sobre o Clima e ao final de meio século de aprendizado sobre a ecologia, a encíclica Laudato Si’ é inédita por duas razões. Em primeiro lugar, por ser integralmente dedicada à ecologia, à “nossa casa comum”, e, além disso, porque não se dirige unicamente aos católicos, mas “a todos os homens de boa vontade”.
A constatação é indubitável. Para o Sumo Pontífice, a crise atual é primeiramente “uma crise ética, cultural e espiritual da modernidade”, uma perturbação na relação com a Terra que caminha de mãos dadas com uma perturbação na relação com o outro. A alma do mundo está, de fato, doente, e nós divagamos numa profunda crise de sentido. Onde está o Homem universal, fraterno? Onde estão sua dimensão espiritual e sua sabedoria? Onde está a unidade entre o Homem e a Natureza? Onde estão o respeito e a paz?
Diante dessa crise civilizacional, é preciso trazer uma dimensão nova: recolocar o Homem no universo, na Natureza, eis a exigência prévia à solução sustentável.
A humanidade no despontar de uma metamorfose
Defendendo uma “ecologia humana e integral”, a encíclica Laudato Si’ pode contribuir para isso em larga medida. Esse texto eleva a reflexão e incentiva o espírito humano a compartilhar uma visão. Pode constituir uma bússola providencial para encontrar sentido em um mundo desorientado. Uma ponte inesperada para reatar com a humildade, a moderação e a solidariedade.
Para vencer essa crise ambiental e climática profunda, o papa Francisco faz um apelo a “toda a família humana”, aos crentes e não crentes, aos católicos e outros, para empenharem todos os esforços em superá-la e iniciar uma mudança radical “de estilo de vida, de produção e de consumo”, no intuito de cuidar da “casa comum”. Ele exorta a avançar na direção de uma economia “sem carbono”, investindo em grande escala nas energias renováveis. Na condição mesma de investidor, o Vaticano terá um papel a desempenhar nessa transição.
Como por ocasião da queda do Muro de Berlim, e mais ainda por se tratar de uma problemática universal, a humanidade encontra-se no despontar de uma metamorfose, escrevendo uma nova página de sua odisseia. Façamos com que essa encíclica seja um substrato fecundo para inspirar nossa imaginação e orientar nossas energias.
O papa Francisco soleniza e sacraliza o desafio ecológico. Ele sela um diagnóstico, associando ciência e moral. Esse texto traz à luz a dívida ecológica dos países do Norte para com os países do Sul e pede que assumamos e honremos essa realidade que, às vezes, insistimos em dissimular. Ao nos fazer um convite à coragem e à honestidade, Jorge Mario Bergoglio propõe um novo roteiro para a humanidade, abre um caminho de maturidade, balizado por valores incontornáveis.
Uma sociedade baseada na realização humana
Para responder a esse desafio universal que põe a família humana no centro da prova, os primeiros degraus já foram galgados num espírito ecumênico. Assim, o apelo que lancei, na França, às diferentes autoridades religiosas culminará na entrega pelos líderes de cultos, em 1º de julho, de um texto interreligioso sobre o clima ao presidente da República. Depois, em 21 de julho, realizar-se-á no Conselho Econômico, Social e Ambiental (Cese), em Paris, uma “cúpula das consciências”, que dará a palavra a personalidades morais e espirituais do mundo inteiro.
Surge, assim, da parte dos crentes e dos não crentes, uma extraordinária vontade de construir uma sociedade baseada na realização humana e no respeito à biosfera. Caberá a cada um de nós, agora, participar ativamente, assumindo este adágio de Claude Lévi-Strauss:
Seria necessário postular, no início, uma espécie de humildade originária: o homem, começando por respeitar todas as formas de vida diferentes da sua, estaria protegido do risco de não respeitar todas as formas de vida dentro da própria humanidade.
Nicolas Hulot
#MyPositiveImpact
No âmbito de sua missão de enviado especial de François Hollande para o planeta, Nicolas Hulot mobiliza a sociedade civil francesa e internacional, assim como personalidades morais e espirituais em torno das questões do clima.
Com sua fundação, ele lançou, também, a campanha “My Positive Impact”, com o objetivo de eleger e promover os melhores projetos inovadores em matéria de combate às mudanças climáticas. A votação está aberta aos internautas até 05 de julho aqui.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Nicolas Hulot: “O papa Francisco sacraliza o desafio ecológico” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU