11 Junho 2015
Diante da maior crise em seus 35 anos de historia, o Partido dos Trabalhadores (PT) chega ao seu 5º Congresso, nesta quinta-feira, com a meta de unificar sua base ou assistir ao esvaziamento da legenda que, há mais de uma década, permanece no governo do país. Diante da repercussão que sua ausência causaria a “Um partido para tempos de guerra”, como o classifica o historiador Valter Pomar, um dos principais líderes da corrente Articulação de Esquerda, mais à esquerda no espectro das correntes que integram a legenda, a presidenta Dilma optou por antecipar seu retorno de Bruxelas, na Bélgica, e desembarca no epicentro dos acontecimentos, na capital baiana.
A reportagem é publicada por Correio do Brasil, 10-06-2015.
Nesta quinta-feira, a presidenta deixa Bruxelas logo após as 13h – 8h de Brasília -, já em direção ao Brasil. O avião presidencial realizará uma escala técnica para abastecimento em Las Palmas, na Espanha, e de lá atravessa o Atlântico em direção a Salvador. Um entrave eventual poderia ser a greve de controladores de tráfego aéreo na Espanha. Se chegar a tempo, Dilma verá que o 5º Congresso do PT se transformou em um fórum de discussões sobre políticas do governo como o ajuste fiscal, liderado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, com manifestações irritadadas de setores à esquerda na agremiação partidária. Entre as vozes dissidentes está a do jornalista Celso Lungaretti, em seu blog.
“Que o PT imponha o afastamento de Levy e Temer ou se assuma como Partido dos Traíras!”, titula o autor. Segundo o artigo que assina, nesta quarta-feira, “o Partido dos Trabalhadores nasceu da resistência à ditadura militar, das batalhas sindicais contra o patronato e da luta dos melhores brasileiros contra o capitalismo. A ditadura militar acabou, o PT fez sórdidas alianças políticas com muitos dos antigos apoiadores do arbítrio e sempre negou fogo quando surgiram oportunidades para a apuração e punição dos crimes cometidos pelos terroristas de Estado”.
Ainda segundo Lungaretti, “se a primeira bandeira deixou de existir, as duas outras estão sendo atiradas no lixo agora, pois a opção neoliberal em política econômica equivale à definitiva capitulação do PT aos patrões e ao capitalismo. Capitulação que também se expressa, politicamente, na divisão do poder governamental com o maior partido fisiológico, oportunista e imobilista do país”.
“Então, no 5º congresso do PT, os delegados terão de decidir entre: uma rejeição inequívoca e contundente dos valores que Joaquim Levy e Michel Temer expressam, incluindo a exigência de exoneração do primeiro e de retirada da articulação política das mãos do segundo; ou o reconhecimento de que o partido oPTou pelos exploradores e não mais representa os explorados, apenas os mistifica. No segundo caso, se tiverem um pingo de honestidade, os petistas adequarão sua denominação à nova realidade. Que tal Partido dos Traíras?”, sugere.
Divergências
Para o jornalista Ricardo Kotscho, petista histórico e ex-assessor pessoal do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, “o 5º Congresso Nacional do PT não poderia acontecer em pior hora para o partido e seus principais líderes”.
“Anunciado como palco do lançamento da candidatura presidencial de Lula para 2018, o encontro, que foi há tempos marcado para Salvador, na Bahia, de 11 a 13 de junho, vai colocar frente a frente as divergências do partido e do governo diante do ajuste fiscal e dos rumos tomados pelo segundo mandato da presidente Dilma Rousseff”, afirma o jornalista.
Da mesma forma que Lungaretti, Kotscho vê um PT “dividido e contestado como nunca antes em sua história”. Segundo afirma, “o PT tem dificuldades tanto para tratar do espólio dos casos do ‘mensalão’ e do ‘petrolão’, que abalaram profundamente a militância do partido, como em encontrar um discurso comum com propostas para o futuro do país”.
“O maior sinal dos problemas que antecederam a abertura do congresso está no vai não vai” da participação de Dilma. Confirmada na semana passada, a ida da presidenta a Salvador foi cancelada na terça-feira, por conta de uma viagem à Bélgica e, horas depois, reconfirmada, após pressão da cúpula do partido.
Como observa o jornalista, “as decisões a serem tomadas pelos 800 delegados petistas em Salvador poderão definir o futuro político de Lula e do governo Dilma”. Em uma defesa prévia de seu ponto de vista econômico, Dilma pediu na segunda-feira que o ministro da Fazenda Joaquim Levy não fosse tratado como “judas” pelas tendências que combatem o ajuste fiscal “e Lula se empenhou para amenizar o tom do texto do documento a ser apresentado pela ala majoritária, a ‘Partido que Muda o Brasil’, que propõe a volta da CPMF e a taxação de grandes fortunas – nada de novo, portanto”, afirma Kotscho.
Tempos difíceis
Ainda nesta quarta-feira, Pomar lançou a atualização de sua tese sobre Um partido para tempos de guerra com uma atualização para seu texto, que será apresentado aos congressistas.
Eis a tese de Pomar.
Um partido para tempos de guerra: manifesto à militância petista, às delegadas e aos delegados ao 5º Congresso Nacional do Partido dos Trabalhadores
“A Nação brasileira — e muito especialmente a população pobre, a classe trabalhadora, os setores progressistas da classe média — acompanha os debates e aguarda as resoluções do 5º Congresso do PT.
As decisões de nosso congresso incidirão sobre o presente e o futuro de todos os setores sociais, das classes trabalhadoras ao empresariado; dos que ampliaram recentemente sua capacidade de consumo aos setores médios tradicionais; dos que venceram aos que perderam as quatro eleições presidenciais realizadas desde 2002.
Partidos e governos de todo o mundo também aguardam com interesse as decisões do 5º Congresso do PT.
As decisões de nosso congresso vão influenciar a política externa brasileira, as nossas relações com os Estados Unidos e com os BRICS, os rumos da integração latino-americana e caribenha.
Mas quem aguarda com maior esperança os resultados de nosso 5º Congresso é a “nação petista”.
“Nação” composta por dezenas de milhões de brasileiros e de brasileiras que desde 1980 dedicaram suas esperanças, empenharam suas melhores energias e recursos para construir um Partido que fosse capaz de representar os interesses e ajudar a organizar a ação das classes trabalhadoras na luta por um Brasil democrático, popular e socialista.
Parte da “nação petista” compareceu às etapas livres e aos debates preparatórios do 5º Congresso e pediumudanças. Mudança na linha política e no funcionamento do Partido, mudança na ação de nossas bancadas parlamentares e na ação do governo Dilma.
O melhor e mais recente exemplo deste apelo por mudanças imediatas e profundas é o manifesto assinado por todos os petistas que integram a executiva nacional da Central Única dos Trabalhadores, intitulado “O PT de volta para a classe trabalhadora”.
O 5º Congresso deve encampar as afirmações e as diretrizes indicadas naquele Manifesto, com destaque para o que citamos a seguir:
“É certo que na última década a classe trabalhadora teve ganhos significativos. Foram adotadas políticas econômicas e sociais positivas para a maioria do povo brasileiro, como a valorização do salário mínimo e a criação de 22 milhões de novos empregos formais. Ao final de 2014 a taxa de desemprego era de 4,8%, com a inflação controlada, com 40 milhões de pessoas saídas da extrema pobreza e com uma nova dinâmica de desenvolvimento regional no país, priorizando o investimento federal nas regiões Norte e Nordeste”.
“Vieram as eleições de outubro de 2014, onde a CUT e os movimentos sociais foram imprescindíveis para a reeleição de Dilma em defesa dos direitos e contra o retrocesso. Mas o governo, em vez de dar continuidade a essa relação positiva que garantiu a vitória no 2º turno, optou por uma guinada na política econômica, com medidas de ataques a direitos dos trabalhadores, sem sequer dialogar com as centrais sindicais.
Aproveitando-se dessa situação, a oposição e a direita cresceram nas ruas e nas instituições, com o apoio da grande imprensa”.
“Nessa situação, o PT ficou no meio do fogo, ora dando sustentação às medidas de ajuste fiscal do governo, ora defendendo corretamente as nossas bandeiras, como na luta contra o PL 4330 da terceirização. Causou profunda decepção na militância sindical petista a aprovação das MPs 664 e 665, que restringem o acesso das camadas mais vulneráveis de nossa classe a direitos trabalhistas e previdenciários”.
“É urgente interromper as tentativas de implementação de uma agenda neoliberal no país que têm como objetivo central reduzir o custo do trabalho através do desemprego e da flexibilização das Leis Trabalhistas. O Projeto 4330, da Terceirização, é parte fundamental dessa agenda, por isso o PT precisa seguir lutando por sua derrota agora no Senado (PCS 30)”.
“Consideramos que a política de ajuste fiscal regressivo e recessivo inaugurada com a nomeação de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda coloca o PT contra a classe trabalhadora e as camadas populares que sempre foram sua principal base de apoio. Trata-se de uma política econômica que diminui o papel do Estado, corta investimentos e eleva juros, acabando por restringir direitos sociais, rebaixar salários e aumentar o desemprego, com impactos negativos no PIB”.
“Sabemos o que ocorreu na história recente com partidos de esquerda que aplicaram políticas de ajuste fiscal inspiradas pelo FMI, como se viu em alguns países da Europa: entraram em crise, foram derrotados em eleições, perderam sua base social. Não queremos que o mesmo aconteça com o PT!”
“Hoje o PT, que já gozou do apoio constante de mais de 30% do eleitorado, atinge a sua mais baixa popularidade. Assistimos a tentativas vindas de forças inimigas de criminalização de nossos dirigentes e do próprio PT, às quais o nosso partido não reagiu à altura. Segmentos do Judiciário, a mídia e partidos conservadores vem tentando criar um cenário que permita abreviar o mandato de Dilma e até mesmo levar à extinção do PT”.
“Estamos seguros que só sairemos dessa crise se retomarmos a nossa tradição de partido da classe trabalhadora, de organização da militância para a luta social e política. Basta de diretórios esvaziados e burocratizados, com direções que muitas vezes não têm relação com o movimento dos trabalhadores e setores populares. É preciso mudar nossos métodos de debate e decisão, em favor de mecanismos que permitam a real participação dos militantes na vida partidária”.
“É preciso que o PT afirme a necessidade do Estado atuar a favor do crescimento, é necessário reduzir a taxa de juros, fazer com que as tarifas públicas contribuam para a queda da inflação e implementar programas governamentais de incentivo à atividade produtiva. O sistema tributário deve ser progressivo, taxando grandes fortunas e heranças, com uma reforma que desonere salários, taxe lucros, dividendos e ganhos com a especulação financeira, ao mesmo tempo que se estimule o aumento de renda dos mais pobres. Os programas sociais do programa eleito precisam ser iniciados de imediato”.
“Enfim, uma agenda política positiva, que tenha no centro a valorização do trabalho, com uma política econômica anti-neoliberal que implica a democratização do Estado e a realização de reformas estruturais (reforma política democrática, reforma agrária, reforma tributária e democratização da comunicação)”.
“Ainda é tempo de mudar de política e de plano econômico, o que, na nossa opinião, é essencial para a sobrevivência do PT como partido dos trabalhadores”.
Estamos convencidos de que o espírito presente neste manifesto dos petistas cutistas é amplamente majoritário nas bases do Partido.
Em resumo: ganhamos a eleição presidencial na perspectiva de uma transformação democrático-popular do Brasil, mas corremos um sério risco de desmonte e reversão das mudanças feitas ao longo dos últimos 12 anos.
Desmonte e reversão que causariam danos graves aos BRICS, à integração regional, à soberania nacional, ao desenvolvimento do país, à democracia e ao bem estar da maioria trabalhadora. E, claro, causariam danos graves também ao conjunto da esquerda brasileira.
Os delegados e as delegadas ao 5º Congresso nacional do PT precisam estar cientes, contudo, de que nossas principais dificuldades não decorrem da ação da oposição de direita, do oligopólio da mídia ou do grande capital, seja transnacional, financeiro, agropecuário ou monopolista.
Nossos inimigos e nossos adversários estão apenas fazendo a sua parte: Cunha presidente da Câmara, ofensiva conservadora no poder legislativo (redução da maioridade penal; ampliação da terceirização pela retomada do PL 4.330; constitucionalização do financiamento empresarial de campanha; PEC 451/2014 que extingue o direito social à saúde, PLS 200/2014 etc.), Operação Lava Jato, ataque à Petrobras, prisão do tesoureiro do PT, mobilizações da direita golpista, governos estaduais tucanos barbarizando professores…
Mas se hoje estão tendo maior êxito em seus ataques, é devido às dificuldades existentes em nossas próprias fileiras.
As causas fundamentais de nossas dificuldades não estão certamente nos movimentos sociais em que atuamos, mas tampouco devem ser buscadas em nossas bancadas parlamentares e governos, a começar pelo governo encabeçado pela presidenta Dilma.
Em última análise, as dificuldades que enfrentamos têm origem nas fileiras do Partido. É principalmente nelas que devemos encontrar e corrigir o que nos afeta negativamente. Se o fizermos, será muito mais fácil corrigir os problemas existentes nos governos, bancadas e movimentos.
Quando olhamos para nosso Partido, entre virtudes e defeitos, percebemos um problema central.
Por um lado, parte importante de nós, inclusive uma parcela importante de nossas direções, reconhece que a situação é grave.
Por outro lado, ao mesmo tempo, um grande setor de nosso partido ainda resiste a promover mudanças imediatas e profundas na linha política, no funcionamento, no financiamento e no relacionamento do Partido com as classes trabalhadoras.
Recusam-se, por exemplo, a democratizar o sistema de eleição das direções partidárias; resistem a abrir mão do financiamento empresarial privado; resistem a ir fundo no tratamento e no debate da questão da corrupção; resistem a admitir o esgotamento da “aliança estratégica” com o PMDB.
Um dos principais desafios do 5º Congresso consiste exatamente em não permitir que este comportamento conservadorimpeça nosso Partido de mudar na direção certa e em tempo hábil.
Os delegados e as delegadas ao 5º Congresso foram eleitos no ano de 2013. Naquela época, já havia sinais abundantes de que a situação estava exigindo do Partido uma nova orientação política, uma nova conduta, um novo padrão de funcionamento, uma nova relação com as classes trabalhadoras.
Mesmo reconhecendo (em parte) estes problemas, prevaleceu no PED 2013 a opção por não antecipar o debate de medidas alternativas, muito menos começar a adotar as medidas preventivas.
As opções feitas e as não feitas em 2013 explicam em boa medida o tamanho da confusão, desorientação e insatisfação instaladas no Partido, já durante as eleições de 2014 e até hoje.
Para que o 5º Congresso tenha sucesso, os delegados e as delegadas eleitas em 2013 precisam atualizar seu ponto de vista com a radicalidade necessária para dar conta da situação política.
A maioria das teses inscritas para debate no 5º Congresso promete mudanças no comportamento do Partido, não apenas na formação política, na comunicação ou no combate à corrupção, mas especialmente no sentido de reatar laços com um grande setor da classe trabalhadora que confiava em nós, mas agora se distanciou.
A maioria das teses defende que o PMDB não é aliado das mudanças, sendo necessário construir uma frente com os partidos, movimentos, setores e personalidades de esquerda, democráticos e populares que garantiram a eleição de Dilma no segundo turno de 2014.
A maioria das teses aponta para mudanças na estratégia do Partido, no sentido de que para transformar o Brasil é preciso combinar luta social e institucional, luta cultural e organização, tendo como objetivo não conciliar, mas derrotar o grande capital, a oposição de direita e o oligopólio da mídia.
A maioria das teses sugere mudanças na política do governo Dilma, no sentido do programa vitorioso no segundo turno das eleições presidenciais, não aquele vitorioso nas eleições da Câmara dos Deputados no primeiro turno e tampouco o da atual política econômica.
Mais importante do que as teses em debate no 5º Congresso, é a já citada opinião e principalmente a atitude prática da militância petista e simpatizante que atua nos movimentos sociais, sindicais, populares, comunitários, de juventude, estudantis, mulheres, quilombolas, contra o racismo, contra a homofobia, pelos direitos humanos e muitos outros.
Esta militância, através das organizações em que atua, tem feito um esforço imenso para incidir na conjuntura e na direção correta, inclusive dando passos concretos para construir uma frente democrática e popular, pela democracia, contra o retrocesso e por reformas estruturais.
Vale dizer que desde o segundo turno até agora, cresceu a presença espontânea do petismo nas ruas, por exemplo nas jornadas de luta protagonizadas pela CUT.
Na mesma linha e como já foi dito, grande parte da militância que compareceu aos debates realizados em todo o país por conta do 5º Congresso pediu algo que pode ser resumido de forma simples: que tome posse aquela presidenta Dilma que nós elegemos no segundo turno da campanha presidencial!
Para dar consequência ao que é insinuado em parte das teses e exigido por grande parte da militância petista, especialmente a sindical, nosso Congresso deve iniciar um giro estratégico, análogo ao que fizemos no 5º Encontro (1987) e no 10º Encontro (1995).
Mesmo quem defendeu a estratégia adotada a partir de 1995 e vigente (com inflexões) até agora, deve reconhecer que as condições gerais da luta de classes no mundo e no Brasil modificaram-se, inclusive devido à nossa ação.
Nossas vitórias eleitorais, inclusive quatro eleições presidenciais seguidas, não se demonstraram suficientes para fazer as chamadas “reformas estruturais” (reforma agrária e urbana, reforma política e do Estado, democratização da comunicação, reforma tributária etc.).
E sem reformas como a tributária, por exemplo, especialmente na atual conjuntura internacional e nacional, o Estado brasileiro não terá recursos suficientes para financiar o crescimento, ampliar as políticas públicas e criar as condições para melhorar a vida dos setores populares.
Neste sentido, o PT deve defender com desassombro, junto com a reforma tributária, políticas públicas de qualidade e para toda a população brasileira, com destaque para a efetiva implantação do Sistema Único de Saúde e para a radical qualificação e o acesso universal à educação.
Tais propostas marcam a opção do nosso partido pela implantação de políticas públicas inspiradas na solidariedade social, em contraposição às políticas que atendem aos interesses econômicos privados e que visam extinguir direitos sociais e transformar a saúde e a educação em mercadoria.
Escolhas terão que ser feitas, sendo que o nível de organização, mobilização e consciência das classes trabalhadoras cresceu mais devagar do que o ódio dos setores médios e a oposição do grande capital contra nós. Grande capital que abandonou a política de “convivência pacífica” que chegou a manter, durante curto período, com governos e com políticas dedicadas a elevar salários, reduzir o desemprego e ampliar direitos sociais.
Vivemos e seguiremos vivendo tempos de conflitos cada vez mais agudos, sendo que depois de anos priorizando disputas eleitorais, ação parlamentar e de governo, nosso Partido exibe fortes sinais de atrofia política e ideológica, inclusive um esquecimento progressivo do nosso objetivo de construir uma sociedade socialista.
Por todas estas razões, nós da tendência petista Articulação de Esquerda, que apresentamos ao 5º Congresso a tese “Um partido para tempos de guerra”, defendemos que para seguir avançando é preciso adotar uma nova linha política global, uma nova estratégia, da qual decorrem um novo padrão de funcionamento e um novo comportamento do Partido na luta de classes.
Comportamento que deve se traduzir, entre outros terrenos, numa política de comunicação partidária de massas — articulando impressos (jornais e revistas), rádio, televisão e redes sociais — voltada a defender as posições da classe trabalhadora, fortalecer os laços com os movimentos sociais, lutar pela ampliação de direitos e liberdades democráticas, amplificar o alcance do programa democrático-popular e socialista na disputa ideológica, no plano nacional e internacional, dialogar e organizar nossa ampla base social, realizar a disputa política e ideológica permanente com nossos adversários e também com nossos inimigos de classe.
Essas e outras medidas político-organizativas estão detalhadas na parte final do projeto de resolução “Um partido para tempos de guerra”.
Ao 5º Congresso cabe iniciar este giro estratégico, aprovando uma declaração política e convocando, para o segundo semestre de 2015, um Encontro Nacional Extraordinário, com delegados eleitos nos encontros estaduais, distrital, municipais e zonais, para eleger um novo Diretório Nacional.
Este giro parte da compreensão de que o Partido dos Trabalhadores está diante da maior crise de sua história.
Ou mudamos a política do Partido e a política do governo Dilma; ou corremos o risco de sofrer uma derrota profunda, que afetará não apenas o PT, mas o conjunto da esquerda política e social, brasileira e latinoamericana.
A crise do PT decorre, simultaneamente, de nossas realizações e de nossas limitações.
Tivemos êxito em ampliar o bem-estar social, a democracia e a soberania nacional. E é este êxito que explica termos conseguido vencer quatro eleições presidenciais seguidas.
Mas não fomos capazes de realizar transformações estruturais, que retirassem do grande capital o controle sobre as alavancas fundamentais da economia e da politica brasileira.
Controlando estas alavancas, a oposição de direita, o oligopólio da mídia e o grande capital desencadearam uma ofensiva geral que inclui a desmoralização política e ideológica do petismo e da esquerda em geral, o estímulo à sabotagem por parte de setores da base aliada, a pressão para que o governo aplique o programa dos que perderam a eleição, a mobilização de massas dos setores conservadores, a ameaça permanente de impeachment e a promessa de nos derrotar eleitoralmente em 2016 e 2018.
Frente a esta situação, o 5º Congresso do PT deve aprovar resoluções que permitam ao Partido, ao conjunto de sua militância, executar cinco tarefas principais.
A primeira tarefa é reocupar as ruas. A oposição de direita controla parte importante do Judiciário, do Parlamento e do Executivo, em seus diferentes níveis. Agora está trabalhando intensamente para também controlar as ruas, utilizando para isto sua militância mais conservadora, convocada pelos meios de comunicação, mobilizada com recursos empresariais e orientada pelas técnicas golpistas das chamadas “revoluções coloridas”. Caso a direita ganhe a batalha de ocupação das ruas, não haverá espaço nem tempo para uma contraofensiva por parte da esquerda. Assim, a primeira tarefa de cada petista deve ser apoiar, participar, mobilizar e ajudar a organizar as manifestações programadas pelos movimentos e organizações das classes trabalhadoras.
A segunda tarefa é construir uma Frente Democrática e Popular. Há várias iniciativas em curso, algumas delas sem o PT e até mesmo contra o PT. Nosso Partido deve procurar as forças que elegeram Dilma no segundo turno presidencial e que defendem as reformas estruturais, propondo a elas que se constitua uma frente popular em defesa da democracia e das reformas.
O programa mínimo desta Frente Democrática e Popular deve incluir a revogação das medidas de ajuste recessivo; o combate à corrupção; a reforma tributária com destaque para o imposto sobre grandes fortunas, a implantação do imposto progressivo, o combate feroz à sonegação fiscal; a defesa da Petrobrás e da industrialização nacional; a ampliação das políticas públicas universais como saúde, educação, cultura e mobilidade urbana; a reforma urbana, a reforma política e a democratização da mídia.
A Frente Democrática e Popular é essencial para derrotar o golpismo e libertar o governo da chantagem peemedebista.
Mas o objetivo principal da Frente Democrática e Popular é lutar por transformações estruturais, sendo para isto necessário construir instrumentos de articulação política e de comunicação de massas que nos permitam enfrentar e vencer o oligopólio da mídia.
A terceira tarefa é mudar nossa estratégia. Se queremos melhorar a vida do povo, se queremos ampliar a democracia, se queremos afirmar a soberania nacional, se queremos integrar a América Latina, se queremos quebrar a espinha dorsal da corrupção, é preciso realizar reformas estruturais no Brasil, que permitam à classe trabalhadora controlar as principais alavancas da economia e da política nacional. Para isto, precisamos de uma aliança estratégica com as forças democrático-populares, com a esquerda política e social. Precisamos, também, combinar luta institucional, luta social e luta cultural. Recuperar o apoio ativo da maioria da classe trabalhadora, ganhar para nosso lado parte dos setores médios que hoje estão na oposição, dividir e neutralizar a burguesia, isolando e derrotando o grande capital transnacional-financeiro. Isso implica abandonar a conciliação de classe com nossos inimigos.
A quarta tarefa é alterar a linha do governo. É plenamente possível derrotar a direita se tivermos para isto a ajuda do governo. É possível derrotar momentaneamente a direita, até mesmo sem a ajuda do governo. Mas é impossível impor uma derrota estratégica à direita, se a ação do governo dividir a esquerda e alimentar a direita.
Por isto, o 5º Congresso do PT deve dizer ao governo: que os ricos paguem a conta do ajuste, que as forças democrático-populares ocupem o lugar que lhes cabe no ministério, que a presidenta assuma protagonismo na luta contra a direita, contra o PIG e contra a especulação financeira.
A quinta tarefa é mudar o próprio PT. O Partido que temos não está à altura dos tempos em que vivemos. Das direções até as bases, é preciso realizar transformações profundas. Precisamos de um partido para tempos de guerra. O que inclui a adoção de algumas medidas organizativas que estão listadas no projeto de resolução “Um partido para tempos de guerra”.
Neste espírito de “dar um giro estratégico”, propomos que o Congresso altere sua metodologia de debates e votações.
Ao invés de começar aprovando um texto-base, propomos que se inicie travando um debate político aberto e que se conclua aprovando uma Declaração Política — que pode ser intitulada “Declaração à classe trabalhadora e ao povo brasileiro” (por exemplo) — contendo as principais conclusões políticas do 5º Congresso.
Em nossa opinião, tal “Declaração” deveria incluir os seguintes pontos:
1) Análise da situação internacional, que parta da constatação de que o mundo vive hoje nos marcos da mais profunda crise do capitalismo desde 1929;
2) Crítica ao receituário que as nações imperialistas, os governos conservadores e os partidos neoliberais têm proposto, receituário que inclui medidas como redução de salários e direitos, corte dos gastos públicos, salvaguarda estatal dos bancos privados, protecionismo comercial e imposição de novas medidas para a integração subordinada das nações emergentes à ordem econômica mundial;
3) Reafirmação de que nossa alternativa inclui, entre seus pilares, uma política externa baseada na soberania nacional, na integração regional latino-americana e na ação dos BRICS;
4) Constatação de que, no mundo pós-crise de 2008, para melhorar a vida do povo, ampliar a democracia, exercer a soberania e praticar a integração regional, é preciso combinar políticas públicas com fortes reformas estruturais;
5) Percepção de que vivemos e viveremos um período de agudização da luta de classes, em âmbito nacional e internacional, seja porque as nações imperialistas e os grandes capitalistas desejam ampliar seus ganhos às nossas custas, seja porque as nações em desenvolvimento e as classes trabalhadoras querem ampliar seus direitos;
6) Indicação de que, neste novo quadro internacional e nacional, faz-se necessária uma nova estratégia e uma nova conduta por parte das forças progressistas, democráticas e populares, movimentos sociais e partidos políticos;
7) Admissão de que esta nova estratégia e esta nova conduta devem incidir, também, na ação dos governos encabeçados por petistas, a começar do governo federal dirigido por nossa companheira presidenta Dilma Rousseff;
8) Reconhecimento de que não há terceira via: ou seguimos pelo caminho das reformas estruturais ou abrimos espaço para a retomada de políticas de tipo neoliberal;
9) Esboço de um novo programa para um novo ciclo de desenvolvimento, cujo núcleo fundamental é um conjunto de reformas estruturais — como a política, democratização da comunicação, tributária, agrária, urbana, educacional, sanitária e de transportes — as quais, combinadas com o fortalecimento do Estado, a manutenção do regime de partilha na exploração do Pré-Sal, a industrialização e a ampliação do mercado interno, tornem possível garantir mais democracia, mais bem-estar social, mais soberania nacional e mais integração regional;
10) Apresentação de um elenco de medidas imediatas que visem fortalecer a ação do Estado e quebrar o rentismo, entre as quais:
a) reversão da política de juros altos;
b) adoção de impostos sobre grandes fortunas, heranças e dividendos;
c) mudança das alíquotas do Imposto de Renda, elevando seu teto para 50% e aliviando a carga tributária sobre a maioria dos assalariados;
d) retomada da contribuição sobre movimentação financeira, como instrumento para financiar a saúde pública;
e) tributação de helicópteros, barcos e jatos particulares;
f) controle de entrada e saída de capitais estrangeiros, estipulando taxação inversamente proporcional ao tempo de permanência no país;
g) Aumentar o Imposto Territorial Rural de acordo com tamanho e utilização e produtividade da terra;
h) Fim da isenção sobre lucros e dividendos (PF e Remessas ao Exterior);
i) Majorar a alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) a cargo dos bancos de 15% para 20%, expresso na MP 675/2015.
11) Estruturação de um novo modelo de governabilidade e de alianças, assentado pela construção de uma frente democrática e popular, de partidos e movimentos sociais, do mundo da cultura e do trabalho, baseada na identidade com as mudanças propostas para o período histórico em curso, reunificando os que fizeram a diferença no segundo turno de 2014. Prosseguir na luta pela Constituinte exclusiva, precedida por um plebiscito oficial, pela reforma política, pelo fim do financiamento empresarial privado.
12) Proposta de execução de uma política que mobilize a juventude e as mulheres, os coletivos LGBTT e antirracistas, os grupos ecológicos e as organizações de direitos humanos. A frente democrática e popular deve encabeçar a luta pelo fim dos autos de resistência e pela desmilitarização das polícias militares estaduais; pela universalização e implantação efetiva do Sistema Único de Saúde (SUS); pela regulamentação da produção, comercialização e consumo de drogas; pela descriminalização do aborto; pelo reconhecimento pleno da união homoafetiva e outros direitos civis. Destaque para a punição de todos os agentes de Estado que cometeram crimes contra a humanidade durante a ditadura militar.
13) Democratização do Partido, com formação e comunicação interna, fim do PED e regresso ao sistema dos encontros democráticos, autofinanciamento do PT pelos seus apoiadores, não receber mais doações empresariais (nem para candidaturas, nem para o Partido). Reafirmação de que somos um partido que organiza a luta da classe trabalhadora aqui e agora, que disputamos eleições e governamos, mas que o fazemos tendo como perspectiva acumular forças na luta por uma nova sociedade, socialista e democrática.
As delegadas e os delegados ao 5º Congresso têm em suas mãos imensas responsabilidades. A principal delas talvez seja manter viva a esperança simbolizada por nosso Partido, por nossa estrela, por nossa bandeira vermelha e pela nossa luta por um Brasil democrático, popular e socialista.
Viva o Partido dos Trabalhadores!
Viva a classe trabalhadora!
Viva o povo brasileiro!”
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