28 Abril 2015
“É simples de entender: devemos tentar nos colocar do outro lado, – falou o escritor espanhol Javier Cercas – imaginar sermos nós aqueles rapazes, aqueles pais, aquelas mulheres grávidas que atravessam o mar. Porque todos somos emigrantes. Todos fomos migrantes, ou os foram nossos avós, nossos pais, nossos antepassados. Migrantes da pobreza, das guerras, em busca de uma vida melhor. Fiz isso uma vez em Tijuana, última cidade mexicana antes de San Diego.
Pensei em atravessar a fronteira entre o México e os Estados Unidos. Aquela é a maior linha divisora dos confins entre o primeiro e o terceiro mundo. A nossa, aquela europeia, é a segunda.
Em Tijuana, improvisadamente tudo se torna claro. O senso de humilhação para os que se aproximam do muro que foi erguido e é muito grande, comove. Mas é também onde se entende que o desespero não para frente a obstáculos. Carregamos no nosso DNA o desejo de uma vida melhor para nós mesmos, e acima de tudo para nossos próprios filhos, é a nossa natureza”.
A entrevista é de Omero Ciai, publicada no jornal La Repubblica, 24-04-2015. A tradução é de Ivan Pedro Lazzarotto.
Eis a entrevista.
Que impressões tem sobre as embarcações que naufragam no Canal da Sicília?
O que aconteceu é assustador e frente ao terrível fato da morte de 900 pessoas engolidas pelo mar é necessário encontrar soluções. Do contrário somos cúmplices. E isso não quer dizer levar o assunto em termos sentimentais ou emotivos mas em fatos reais. Todo dia pessoas morrem tentando entrar na Europa. Todo dia. Nos meios de comunicação, como é inevitável, fala-se somente sobre o quanto o número de vítimas é monstruoso, inaceitável. Quando morrem 5 ou 10 não acontece nada.
O que deveriam fazer as instituições europeias?
A Europa não pode permitir isso. Não pode ser somente um mercado, deve ser também uma ideia, um conceito político, social e humano. É uma ideia de inclusão, uma ideia de dignidade. Se não somos capazes de construir um espaço de dignidade neste mundo, não vale em nada prosseguir com a ideia de uma Europa unida. Não se pode consertar, pensar em soluções provisórias e precárias, precisamos de soluções definitivas.
Abrir as fronteiras seria uma solução?
Abrir as portas a todos de uma maneira desordenada é impossível e nos colocaria em colapso. Mas seria falso também acreditar que com políticas de controle mais severas se possa parar com essa onda de migração. Existe um ditado espanhol que fala: ‘Não se pode colocar portas em um campo aberto’. E quem não tem nada, não tem nada a perder, cantava Bob Dylan. Não pode pará-lo. Deve acolhê-lo. Por mais duras que possam ser as tuas medidas contra eles não poderá impedir que cheguem até aqui. A única coisa que pode fazer é regulamentar essa migração, administrá-la. Eles vêm e continuaram vindo, queiramos nós ou não.
Como fazer?
A emergência de migração não é uma anedora, é uma grande crise a ser enfrentada e continuará sendo por muito tempo. Mas como no caso da Grécia, a Europa não leva a sério: não existe uma política econômica e muito menos uma política externa comum. Não pode ser um problema hoje da Itália, amanhã da Espanha ou depois de amanhã de Malta. Quantas pessoas devem ainda morrer devido a nossa incapacidade de agir de maneira comum? Nada pode parar as migrações, somente poderá se enfrentada e gerida com dignidade e racionalidade.
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“Chega de humilhações, somos todos migrantes” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU