23 Março 2015
Em frente à igreja da Consolação, na rua de mesmo nome, o corretor Sérgio Santos, 50, levanta os braços e chama seus batedores.
Os seis motoqueiros de um grupo cristão de motociclismo, todos de preto e a bordo de suas Harley-Davidson, respondem ao chamado e dão a partida nas motos.
São eles que abrem o caminho para a multidão de católicos que saiu às ruas do centro de São Paulo, na tarde deste domingo (22), Dia Mundial da Água, em uma procissão para pedir chuva.
A reportagem é de Lígia Mesquita, publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, 23-03-2015.
Antes mesmo da caminhada promovida pela Arquidiocese de São Paulo ter início, a água já caía do céu. Segundo os organizadores, 1.500 pessoas participaram do ato, que terminou com uma missa rezada pelo arcebispo paulista, dom Odilo Scherer, na Catedral da Sé. O último evento desse tipo na cidade havia ocorrido em 1957.
No carro de som, um padre passa um sermão: "Muitas vezes jogamos os problemas nas costas de alguns e não assumimos nossas responsabilidades com nossa cidade".
Carregando uma imagem de São José na mão esquerda e um guarda-chuva na direita, Conceição Santos, 55, concorda com a bronca e diz que a chuva que cai já é "uma resposta de Deus" à marcha pela água. "Deus está nos mostrando que não se brinca com a mãe natureza. Ficamos esbanjando e deu no que deu."
Para a aposentada, em um primeiro momento, a procissão pela chuva não salvará a capital de um possível racionamento de água. "Mas Jesus está vindo aos pouquinhos. Sem água não vamos ficar."
Funcionária de uma padaria, Andressa Araújo, 20, também caminha pedindo chuva. Moradora da Vila Mariana, ela nunca ficou sem água, mas não descarta passar pelo problema. "Acredito que esse pedido aqui vai dar certo. Deus pode ajudar, mas temos que fazer nossa parte."
Protesto
Logo atrás dos motociclistas, integrantes da Pastoral do Povo da Rua, coordenada pelo padre Júlio Lancellotti, aproveitam o evento para protestar. Seguram faixas e cartazes pedindo água para a população de rua.
A professora Mara Zanin, 50, carrega uma cartolina com a mensagem "Higienização não. A cidade é de todos".
"O poder público tinha que ter olhado para esse problema da falta de água há dez anos. Agora, estamos correndo atrás do prejuízo, então nos resta mesmo rezar", fala.
Para o padre Lancellotti, a crise hídrica "é muito grave" e não há um plano contingencial do poder público. "A procissão é um sinal de que quando estão faltando planos do governo, temos que recorrer a Deus", afirma.
O arcebispo de São Paulo, dom Odilo Scherer, caminha em meio aos fiéis. E defende a realização desse tipo de procissão, normalmente feita em cidades do interior e do Nordeste, na maior cidade do país. "Não é coisa de cidade pequena. A fé se faz em toda parte. São Paulo também precisa de água", diz.
Segundo dom Odilo, a marcha da igreja serve também para conscientizar a população sobre o uso racional da água. "Pedir água [a Deus] não exime ninguém, nem políticos nem cidadãos, da responsabilidade. Agora descobrimos que conseguimos viver com menos água."
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No Dia Mundial da Água, católicos fazem procissão pedindo chuva em São Paulo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU