21 Março 2015
Os primeiros anos do pontificado do Papa Francisco despertaram esperanças e expectativas, tanto dentro quanto fora da Igreja Católica. Os sinais e palavras desse papa estão modificando a ordem simbólica – entendendo-se com isso o mundo afetivo, cultural, linguístico, intelectual e narrativo – sobre o qual a Igreja Católica se fundamenta, com possíveis efeitos também para o cristianismo e o mundo secular.
A opinião é do teólogo austríaco Kurt Appel, professor da Universidade de Viena, em artigo publicada na revista Il Regno, n. 22, 2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Os sinais e as palavras postas em ação pelo Papa Francisco desde o início do pontificado estão modificando profundamente a ordem simbólica, isto é, o mundo afetivo, cultural, linguístico, intelectual e narrativo sobre o qual se fundamenta a Igreja Católica, com possíveis efeitos de rearranjo também para o cristianismo como um todo e para a humanidade inteira.
O porte dessa mudança pode ser mais bem percebida se esse início de pontificado é examinado contra o pano de fundo dos pontificados pós-conciliares, evidenciando, em um olhar sintético, o caminho percorrido pela Igreja Católica nesse meio século e as peculiaridades que já se perfilam no ministério de Francisco como caracterizantes e fundamentais, seja em nível de reorientação simbólica (Kurt Appel), seja em nível de linhas teológicas (Walter Kasper). Projetando, ao mesmo tempo, essa nova sistematização da identidade cristã sobre os grandes desafios que ela tem pela frente: uma renovada capacidade de celebrar a alegria do Evangelho, uma nova abordagem à Escritura, uma nova relação com as outras culturas e um novo papel das mulheres na Igreja.
É um fato incontestável que o primeiro ano do pontificado do Papa Francisco despertou esperanças e expectativas, tanto dentro quanto fora da Igreja Católica. Os sinais e palavras desse papa estão modificando a ordem simbólica – entendendo-se com isso o mundo afetivo, cultural, linguístico, intelectual e narrativo – sobre o qual a Igreja Católica se fundamenta, com possíveis efeitos também para o cristianismo e o mundo secular.
Para observar mais de perto esse processo de mudança, sobre o qual ninguém pode dizer exatamente aonde vai levar, serão analisados, em primeiro lugar, os desafios culturais e eclesiais aos quais os pontífices anteriores quiseram responder, considerando também as questões que permaneceram em aberto. Depois, se tentará fazer uma avaliação das mudanças iniciadas pelo Papa Francisco no seu primeiro ano, junto com as possíveis consequências para os desdobramentos futuros da Igreja. Por fim, serão indicados alguns grandes desafios para a Igreja hoje.
Paulo VI: grandeza e tragicidade de um pontificado
A grande virada da Igreja Católica para a modernidade foi iniciada pelo Concílio Vaticano II. Paulo VI teve que assumir a responsabilidade de grande parte da realização desse Concílio e, principalmente, do acompanhamento e da liderança da primeira fase do processo pós-conciliar.
Deve-se destacar que, provavelmente, nenhum papa e pouquíssimos bispos, sacerdotes e teólogos daquele século tinham à disposição uma formação cultural tão vasta quanto Montini.
As suas encíclicas, cartas, discursos, a sua política eclesial e, em particular, as nomeações episcopais são testemunho da profunda compreensão da modernidade e dos seus desafios que ele mostrou.
Ele reconheceu a importância da opção pelos pobres, que se impunha sobre uma Igreja cada vez mais globalizada e deslocada para o Hemisfério Sul, assim como a necessidade de um diálogo com o mundo secular da Europa e do Ocidente.
Ele também confiou a Ostpolitik às mãos dos melhores diplomatas vaticanos (por exemplo, Casaroli) e bispos da Igreja universal (por exemplo, König), criando, assim, um dos pressupostos para a sobrevivência da Igreja Católica nos países dominados pelo comunismo.
No entanto, um evento desse pontificado marcou uma cesura especial: a encíclica Humanae vitae, promulgada em 1968, no momento da grande revolta estudantil. Muitas vezes, o pontificado de Paulo VI é até diferenciado entre o período até 1968 e o posterior.
A consequência cultural dessa encíclica foi, acima de tudo, o fato de que foi vista como um despedaçamento do "aggiornamento" [atualização] iniciado por João XXIII e pelo Concílio, ou seja, o diálogo entre a Igreja e a modernidade cada vez mais consciente da sua autonomia.
A autonomia de pensamento do mundo ocidental, defendida também pela revolução estudantil, havia encontrado uma das suas expressões mais disruptivas na autonomia da sexualidade (feminina) com relação à reprodução.
Justamente isso parecia ser posto em discussão pelo texto Montini. Sobre isso, alavancou-se a acusação levantada, tanto dentro da Igreja quanto na sociedade, contra o papa e a Igreja, vistos como incompatíveis com a autonomia e contrários à modernidade, partidários de uma restauração do Ancien régime.
A particular tragicidade para Montini estava no fato de que, com esse julgamento, as suas intenções não eram compreendidas de modo algum. Como poucas outras pessoas, Montini tinha entendido que toda a vida, e também o seu início, superam toda perspectiva causal, cronológica e mecanicista: como a completude da vida humana brota da dimensão espiritual, isto é, do encontro pessoal do homem e da mulher, e não simplesmente da fusão de um óvulo e de um espermatozoide, não se deveria reduzi-la a uma ação mecanicista.
Essa visão de alto nível espiritual, subtrai a vida à vontade humana de decidir (por assim dizer, contra a moderna autonomia de pensamento), mas também a qualquer perspectiva naturalista (como emerge da conexão entre sexualidade e reprodução, segundo a moral eclesial tradicional), e a toda dependência hierárquica (que constituía o fundamento moral do Ancien régime).
Com essa visão profética, Paulo VI estava tragicamente oposto a todas as frentes, embora seja preciso notar que as passagens da Humanae vitae que abordam diretamente a questão da contracepção refletiam o fato de que a intenção do papa estava revestida por uma linguagem jurídica que não podia expressar adequadamente os conceitos que ele pretendia expor.
Em todo o caso, a Humanae vitae representou, tanto dentro da Igreja quanto na relação entre Igreja e mundo ocidental, uma ruptura que prejudicou de modo determinante a missão dessa grande testemunha cristã.
João Paulo II: modernidade e mobilização da Igreja
Quando Paulo VI morreu, em 1978, a Igreja estava significativamente dividida entre a maioria dos bispos da época [1], que apoiavam o esforço de reconciliar o catolicismo com a aspiração da modernidade à autonomia, e uma minoria que perseguia a vontade de restauração, ao menos dentro da Igreja [2].
Esta última se uniu à ideia segundo a qual, através de uma aliança com os políticos conservadores, a Igreja poderia (de novo) alcançar a supremacia política e social no Ocidente e em todo o mundo cristão. Ao mesmo tempo, criou-se uma distância cada vez mais claramente percebida entre a Igreja do rico Norte e a Igreja do Sul, progressivamente emergente, e que, especialmente na América Latina, buscava uma forma de expressão na teologia da libertação.
Um âmbito que não se encaixava nessa dicotomia, por estar marcado por problemas muito específicos, consistia nas Igrejas particulares do mundo dominado pelo regime comunista. Nessa perspectiva, a eleição a papa de Karol Wojtyla não foi apenas um sinal evidente de querer enfrentar o desafio do comunismo, mas também foi vista como uma possibilidade para superar, através de uma terceira via, as contraposições evocadas.
Antes de entrar no mérito do pontificado de Wojtyla, é oportuno fazer uma observação: na Praça de São Pedro, quando foi feito o anúncio de que João Paulo II havia morrido, um aplauso espontâneo explodiu por parte das milhares de pessoas reunidas lá, muitas das quais eram jovens. Esse gesto se voltada a toda a sua obra de sumo pastor da Igreja. Esse aplauso também colocou em evidência a imensa cobertura midiática desse pontificado: com João Paulo II, um "superstar" dos eventos midiáticos saía de cena, no verdadeiro sentido da palavra.
Esse pontificado, portanto, deve ser examinado em dois níveis: no plano das diretrizes intraeclesiais traçadas e no plano das imagens midiáticas (images) transmitidas, já que as duas dimensões não coincidem necessariamente.
Se uma diferença entre modernismo e pós-modernismo está justamente na possibilidade de que as imagens virtuais se separem da realidade, então esse pontificado mostrou a passagem da modernidade (simbolizada por Paulo VI) à pós-modernidade.
Considerando o pontificado de Wojtyla no nível das images, houve três grandes períodos, cada um dos quais marcado por um evento midiático emblemático: João Paulo II foi, na primeira fase do seu pontificado (1978-1990), uma figura-símbolo contra o comunismo ateu e repressivo.
A imagem midiática determinante desse período foi dada pelo atentado contra a sua pessoa, provavelmente organizado pelos serviços secretos comunistas e que elevou o papa ao status de mártir.
Na segunda fase do pontificado (1991-2000), em que ele conquistou, em certa medida, a coroa de vencedor sobre o comunismo, João Paulo II foi o símbolo de uma Igreja missionária e universal sobre o fundamento de Israel. A sua oração no Muro das Lamentações, em Jerusalém, assim como o pedido de perdão pelos pecados cometidos na história da Igreja no ano 2000, início de uma nova evangelização, foram as imagens mais expressivas desse período.
Por fim, a última parte do seu pontificado (2001-2005) exerceu o maior impacto simbólico e midiático: o papa tornou-se a imagem do servo sofredor de Deus e um símbolo de paz, fé em Deus e dignidade humana [3]. Talvez a imagem mais forte seja a última bênção pascal que o papa, extremamente enfraquecido, pôde dar, então, só da janela.
A extraordinária presença midiática do papa teve duas consequências: de um lado, trouxe à Igreja e o Evangelho novamente para o centro da atenção global, por outro, porém, também gerou uma forte virtualização do catolicismo. O que facilitou isso de maneira significativa foi o mundo pós-moderno, em, que, sistematicamente, a tradição e a relativa especificidade são extraídas do seu contexto para se tornarem sinais midiáticos abstratos, comercializáveis em todo o lugar e substituíveis à vontade.
Essa descontextualização das tradições se encontrou, no âmbito eclesial, com uma descontextualização das Igrejas locais e das suas narrativas, em cujo lugar apareceu uma Igreja cada vez mais universal e midiática, com João Paulo II como guia e conteúdo.
Assim, enfraqueceu-se um grande potencial da Igreja Católica, ou seja, o fato de ser uma rede global de comunidades locais em vez de um espaço virtual multimidiático universal, e a Igreja tornou-se cada vez mais parte da virtualidade pós-moderna.
Do ponto de vista da política eclesial, João Paulo II foi significativamente influenciado pela história da Polônia. Contra os totalitarismos, por causa dos quais ele havia sofrido na Polônia (o satânico nacional-socialismo de proveniência alemã e o repressivo e totalitário bolchevismo de origem russa) [4], era necessário opor apenas uma incondicional resistência espiritual e, se possível, também política.
E, exatamente como na Polônia, a aristocracia e, especialmente, os sacerdotes tinham defendido por séculos a dignidade nacional contra ataques externos, segundo o papa polonês, também era tarefa do sacerdócio (celibatário) ser a ponta de lança na resistência e detentor da ordem simbólica e da identidade da Igreja Católica.
O papa, porém, via uma ameaça de duas partes: a primeira vinha da América Latina. Aqui, entrevia-se o perigo de que o continente católico fosse à deriva rumo ao comunismo, também com o apoio da teologia da libertação e com a conivência de diversas Conferências Episcopais [5], de muitos bispos e, sobretudo, das principais ordens religiosas. Aos olhos de Wojtyla, eles não rejeitavam de modo suficientemente enérgico as tendências marxistas.
O segundo cenário ameaçador tinha a ver com uma experiência traumática desse pontificado, isto é, o referendo de 1981, na Itália, sobre a revogação da Lei 194 sobre o aborto. A "mãe pátria" e centro da Igreja Católica tinha se manifestado a favor da conservação da lei que permitia o aborto (com algumas restrições), com uma elevada taxa de participação e com 88% e 68% dos votos nos dois quesitos.
Era claro que a Igreja tinha perdido a soberania cultural (também) na Itália. João Paulo II, a partir dessa votação, tirou a conclusão de que o ateísmo teórico do Oriente correspondia a um desumano ateísmo prático do Ocidente, que, como o primeiro, devia ser combatida com todos os meios.
Depois desse evento, João Paulo II fez uma distinção entre aquela parte da Igreja (bispos, sacerdotes, religiosos e leigos) que estava disposta a viver com ele a luta contra uma modernidade completamente fora de controle, e aquela que evitava essa contraposição [6].
Através da nomeação dos bispos, reorientando a formação dos sacerdotes e com a promoção dos novos movimentos eclesiais, Wojtyla queria preparar a Igreja para uma "guerra cultural", na sua opinião, inevitável, em que estava em jogo a identidade do cristianismo e, em última análise, também a dignidade humana.
A força de impacto nesse confronto, portanto, devia ser reforçada, concentrando-se em assuntos específicos que seriam capazes de determinar os choques decisivos. Depois de ter "vencido" a luta contra o comunismo, apareceram em primeiro plano os chamados "valores inegociáveis", como a luta contra o aborto, a contracepção (considerada uma premissa hostil ao primeiro) e a eutanásia.
Os principais defensores de João Paulo II, além das novas comunidades eclesiais como o Opus Dei e o Comunhão e Libertação, foram o prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, o cardeal Joseph Ratzinger, que tinha a tarefa de liderar a batalha contra a teologia da libertação, principalmente em um plano espiritual [7], e o vigário de Roma, durante muitos anos secretário-geral e, depois, presidente da Conferência Episcopal Italiana (CEI), o cardeal Camillo Ruini.
Este último não só é o autor de expressões como a já citada "valores inegociáveis", mas também buscou uma aliança com os partidos e os políticos italianos, incluindo Silvio Berlusconi, para readquirir para a Igreja na Itália uma autoridade política e cultural.
A Itália serviu de modelo para outros Estados que deviam fazer a mesma coisa: na Espanha, através de uma renovação da Conferência Episcopal, foi definida uma coalizão com os conservadores; até mesmo nos Estados Unidos, desde os tempos de Reagan, houve uma colaboração entre republicanos e o Vaticano, em um primeiro momento não apoiada pela maioria da Conferência Episcopal [8].
Quando João Paulo II morreu em 2005, depois de 27 anos de pontificado, deixou atrás de si uma Igreja que era mobilizável em nível global como nunca antes na sua história (prova disso são as centenas de milhares de pessoas de todo o mundo que foram ao seu funeral, mas também as Jornadas Mundiais da Juventude, os Congressos Eucarísticos e as visitas papais), mas também caracterizada por um episcopado fraco e por uma parte das Igrejas locais significativamente enfraquecidas.
No caso dos bispos, tratava-se, na maioria das vezes, de pessoas que buscavam servir à missão geral do papa, mas que tinham perdido completamente o contato cultural com a situação local. Além disso, a situação global, mas também o mapa religioso tinham mudado radicalmente: o comunismo tinha sido varrido e, no seu lugar, tinha chegado um capitalismo desenfreado.
Além disso, a influência da secularização na Europa e em algumas partes da América tinha aumentado radicalmente; na América Latina, Ásia e África, os movimentos pentecostais irrompiam de forma cada vez mais maciça nas zonas tradicionalmente católicas; por fim, em muitos países do Norte da África e do Oriente Médio, tinha-se chegado a uma islamização com consequências muitas vezes dramáticas para os cristãos dessas regiões.
Mas, talvez, o que mais pesava era a crescente fragilidade da paisagem intelectual e cultural. Uma urbanização em nível global, acompanhada pelo desenraizamento de amplas camadas sociais e por um enorme individualismo, muito além da Europa e da América do Norte, levou cada vez mais ao abandono dos tradicionais sistemas de referência simbólicos (família, tradições e costumes locais etc.) e à necessidade de buscar novos.
O resultado é uma grande complexidade e a fragilidade das ordens simbólicas, da qual nem mesmo a Igreja foi poupada.
Bento XVI: a modernidade como desafio espiritual
Joseph Ratzinger foi eleito papa não só porque, como prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, tinha sido por quase 25 anos o mais próximo colaborador de João Paulo II, mas também porque, evidentemente, acreditava-se que ele seria capaz de enfrentar a crescente fragilidade da paisagem intelectual e cultural [9].
Ele parecia ser o papa capaz de aceitar o desafio intelectual e cultural da (pós-)modernidade e capaz de levar adiante a herança do seu antecessor. O enfrentamento desses desafios também constituiu o centro do seu pontificado. Bento XVI tentou opor à invasão do secularismo e do individualismo uma visão intelectual e cultural do cristianismo.
Ele agiu em vários níveis: nas suas encíclicas, discursos e livros, mostrou-se no papel de ensinante para o mundo cristão ou, melhor, global. Abordou as virtudes centrais do cristianismo (a caridade, a esperança, a fé [10]: deve ser acrescentada a justiça, na encíclica social Caritas in veritate) e a pessoa de Jesus, embora este último tema, não como ato magisterial.
Ele também se dedicou particularmente à liturgia, nível simbólico central da Igreja Apostólica. Ponto de partida e centro de um universo festivo e redimido, ela deveria ser uma espécie de mundo alternativo em oposição ao mundo espiritual e culturalmente corrompido da pós-modernidade.
Nessa polarização, também pode ter desempenhado um papel o fato de que Ratzinger alimentava um profundo ceticismo em relação aos modernos esforços de emancipação da pessoa manifestados no Iluminismo e, posteriormente, no marxismo. Com o acréscimo de que também foi crescendo a consciência de que o mundo se encontrava diante da possibilidade da própria ruína (causada por fatores externos, como as mudanças climáticas e a destruição dos recursos naturais, mas também por paradigmas filosófico-naturais que levam em conta um insensato desaparecimento do ser humano e de toda a ordem cósmica) [11].
Se a principal ênfase de Bento XVI era a renovação intelectual e litúrgica da Igreja e a criação de um mundo religioso-simbólico alternativo, com uma língua, sensibilidades, valores próprios etc., no seu pontificado, contudo, continuou o confronto político.
Na Itália, na Espanha, nos EUA e em muitos outros países, os episcopados criados por Wojtyla e Ratzinger sempre estiveram em estreita aliança com as forças políticas conservadoras e conduziram, embora muitas vezes sem a capacidade intelectual do papa, uma guerra cultural perdida de partida.
Isso não porque as preocupações expressas fossem equivocadas, mas porque não levavam em conta as citadas fragilidade e complexidade do nosso mundo. Como consequência, muitos observadores e contemporâneos receberam o confronto sobre os valores não como uma divergência objetiva sobre o mérito das questões, mas principalmente como uma luta por posições de poder social e cultural.
Depois, verificou-se outra circunstância, particularmente trágica para Bento XVI (e, naturalmente, não só para ele), ou seja, os vários escândalos eclesiais, dos milhares de casos de pedofilia (muitas vezes encobertos) cometidos por homens da Igreja, às práticas homossexuais de bispos e padres, até nos ambientes próximos ao papa, passando pelas irregularidades financeiras em instituições vaticanas e eclesiásticas.
Assim, a visão de uma Igreja como sociedade "alternativa" foi pesadamente desacreditada: o "mundo" tinha alcançado também os sacerdotes, guardiões do sagrado, e a "guerra cultural" contra uma pós-modernidade permissiva parecia perdida para sempre.
Nesse contexto, Bento XVI decidiu um gesto extraordinário, isto é, a sua renúncia. Assim, ele assumiu sobre si uma radical renúncia do poder, dando à Igreja um ponto de referência para o caminho, como se ele quisesse ainda explicar que a sua essência não deveria estar na hegemonia e na sacralização das posições de poder.
O papa, como vigário de Cristo, não era o fundamento inatacável do poder sagrado, mas era frágil e influenciável pelos eventos do tempo. O fato de que a admissão da própria vulnerabilidade e fragilidade pediu uma força interior particular, no entanto, era e muitas vezes é ignorado.
Em todo o caso, o Papa Bento XVI, com a renúncia ao seu ministério, levou a uma profunda reorientação simbólica, retomada e continuada pelo seu sucessor.
Francisco e a reorientação simbólica da Igreja
A escolha do nome foi um ato revolucionário de Jorge Mario Bergoglio, depois da eleição, também ligada aos grandes desafios e dificuldades que a Igreja na América Latina e no terceiro mundo deve enfrentar: a difusão dos pentecostais nas novas megalópoles [12], a erradicação e a individualização das populações indígenas e a consequente busca de modelos de referência [13].
Com esse nome, Bergoglio se colocou na tradição jesuítica de todos os santos. Francisco de Assis renunciou não só às propriedades e ao título, mas também trouxe sobre si os estigmas de Jesus, isto é, encarnou a vulnerabilidade e a acessibilidade do próprio Filho de Deus.
O nome do papa evoca outras associações: Francisco atuou em um período de maciça urbanização, quando a Igreja tinha perdido o contato com as novas classes sociais cidadãs. Naquele contexto, ele não tentou intervir nas guerras culturais daquele tempo, mas tentou convencer com o seu exemplo e mostrar novas formas de humanidade e de interação social.
Um ato decisivo do novo papa foi a conclusão da "guerra cultural": a frase "Quem sou eu para julgar o meu irmão?", com que Bergoglio "respondeu" à pergunta sobre a pecaminosidade da homossexualidade, marcou o fim de uma série de disputas infrutíferas entre a Igreja e a sociedade.
Naturalmente, isso não significa que o papa tenha se desconectado do ethos eclesial, do magistério ou mesmo do Evangelho. Foi apenas uma admissão de fragilidade e da complexidade das situações da vida, em relação às quais tanto a nossa sociedade quanto a Igreja devem aprender a aceitar uma pergunta a mais e uma resposta a menos para permanecer críveis.
Isso vale igualmente para a sexualidade, em que as incertezas e as incoerências do nosso sistema simbólico cultural e individual encontram particular expressão.
Vulnerabilidade e acessibilidade estão estreitamente associadas com o primeiro grande ato simbólico do papa, a sua viagem a Lampedusa, naquele lugar no fim da Europa, onde a ordem ocidental está entrando em colapso, onde o "outro", com todas as suas necessidades, pede para ser acolhido e onde se torna evidente a "globalização da indiferença".
A questão decisiva nesse lugar não é apenas o fato de que milhares de refugiados tornam-se destroços arrastados para a orla, testemunhas vivas também de uma política europeia fracassada ou inexistente em relação à África e ao Oriente Médio, pessoas que estão no fundo da hierarquia social e cujas histórias não encontram escuta real nas nossas sociedades e na mídia.
Igualmente importante é o fato de que Lampedusa marca um lugar que mostra a fragilidade do projeto europeu e, com ele, do cristianismo. De fato, não há respostas imediatas para os problemas que lá são colocados, nem mesmo da parte eclesial.
Com o Papa Francisco, o debate simbólico se desloca desafio da "globalização da indiferença", ou seja, é uma questão de misericórdia e compaixão, de deixar-se tocar e encontrar pelas pessoas nas suas feridas e perguntas. As linhas de demarcação entre a Igreja e a cultura continuam existindo, mas há o esforço de reconhecer as feridas das pessoas que se tem pela frente e de enfrentá-las de modo respeitoso.
Atualmente, por parte de alguns bispos, há um novo esforço, uma luta pela supremacia simbólica na cultura, contra a chamada "ideologia de gênero". Aqui também emerge que não é suficiente insistir em posições ainda consideradas corretas, se não forem primeiro reconhecidas as feridas profundas que se escondem atrás de problemas muito delicados de identidade de gênero.
Talvez, ainda seja necessário enfatizar que é importante que um papa extraeuropeu, com a sensibilidade que está demonstrando, enfrente muitas das questões levantadas hoje sobre a identidade individual, sexual, social e cultural. Como a extraordinária globalização do nosso mundo, a difusão global do capitalismo e o fato correlato de que todas as culturas da terra estão "infectadas" pela ideia ocidental de autodeterminação, isso significa que nenhuma cultura pode fugir do profundo abalo da própria ordem simbólica (afetiva, cultural, social, linguística etc.).
São testemunhas disso a histeria coletiva que pode ser observada em alguns países islâmicos, a busca de identidade, muitas vezes violenta, da Rússia à Índia, passando pelos países africanos e, naturalmente, também na Europa, só de olhar para os resultados das eleições europeias. A única coisa certa é que nunca mais será possível voltar à velha ordem e às velhas tradições.
Uma nova conjugação da identidade cristã
A Igreja Católica, assim como outras religiões, países, culturas e comunidades, tentou oferecer, nas últimas décadas, uma identidade bem definida diante dessa "liquefação" dos nossos modos de vida.
A ponta de lança nisso deveriam ter sido os eclesiásticos, que, apesar do seu compromisso com a fé, não conseguiram estar à altura da tarefa. Isso não por causa de um erro moral, mas pelo fato de que as identidades, que antes se expressavam com características exteriores evidentes, hoje muitas vezes acabam na virtualidade, onde as tradições se perdem, tornando-se "sinais" que podem ser mudados à vontade.
Isso se mostra, além disso, de modo muito evidente, também, na atual discussão sobre o gênero, sobre como o gênero também pode se tornar uma "marca", seja para aqueles que querem dispor livremente dele na busca de absoluta autodeterminação, seja para aqueles que acreditam que podem manter os tradicionais papéis de gênero e consolidá-los na sociedade pós-moderna.
O milagre do Papa Francisco está no fato de que ele não se dirigiu nesse caminho de marcar as identidades. Isso teria sido óbvio em relação à particular agitação cultural vivida pelo terceiro mundo (que foi catapultado em velocidade incrível na pós-modernidade) e em relação às populações desenraizadas das novas "periferias" urbanas, que foram forçadas a deixar as suas identidades.
Na realidade, esse é exatamente o caminho percorrido por muitos pentecostais: oferecer às pessoas identidades bem definidas (ser cristão significa: nada de álcool, nada de sexo antes do casamento, a fé na criação em sete dias, o sucesso econômico etc.), tornando, também, ao mesmo tempo, extremamente flexíveis essas mesmas identidades para se adaptar às necessidades.
Ao contrário, o papa destaca que "a identidade" cristã não está nas limitações e definições, mas na sua essência e, desde as suas origens, significa, confiando em Cristo, ser chamados a se tornar amigos de cada pessoa de boa vontade, independentemente de sexo, raça e nação (e religião) [14]. Significa, além disso, buscar os próprios amigos também fora do próprio círculo de gênero, nação, classe e religião.
Em terceiro lugar, a "identidade" cristã está, em última análise, no ethos da acolhida hospitaleira ao outro, das suas histórias e das suas feridas, e na vontade de sair de si mesmo e se deixar acolher pelo outro.
Formar uma rede de amizades e ser um lugar de hospitalidade universal é aquilo a que Francisco quer encorajar a Igreja e as suas lideranças. A isso se relaciona, de um ponto de vista institucional, a necessidade de reforçar a autonomia das Igrejas locais (dioceses, conferências episcopais) e das comunidades locais (paróquias), assim como deriva daí uma tarefa completamente nova para as comunidades religiosas, que, nas últimas décadas, passaram um pouco para o segundo plano. Porque elas têm, de modo especial, a tarefa de criar nas suas pessoas e na sua vida lugares de hospitalidade e trazer uma rede de amizade onde a Igreja perde cada vez mais a sua presença, ou seja, nas periferias das novas megalópoles, entre os pobres que tiveram que abandonar definitivamente a sua casa, sem perspectiva de retorno.
O Papa Francisco mostrou em todos os seus gestos simbólicos que pode evitar uma armadilha: embora seja mestre do gesto simbólico, ele parece ser capaz de não se tornar uma figura completamente midiática: a partir do momento em que ele rompe as expectativas da mídia, ele também é capaz de escapar delas e, acima de tudo, busca encontros pessoais e "físicos" críveis [15].
Um desafio importante, porém, que requer dele uma resposta adequada, é a questão da institucionalização (e, portanto, de uma nova forma de concretização) desse novo percurso, que, caso contrário, corre o risco de deslizar para mera virtualidade.
Exemplos concretos são as ordenações episcopais, que precisam de um maior envolvimento das Igrejas locais para fortalecê-las realmente [16], uma renovação do clero através de um forte vínculos das vocações com as comunidades e o fim da possibilidade de transferência dos bispos.
Justamente a respeito deste último ponto, nasce a suspeita de que o apelo contra o carreirismo eclesiástico continuará caindo no vazio, enquanto os bispos puderem ser transferidos das suas dioceses para assumir papéis "mais significativos".
Alguns desafios para os próximos anos
O Papa Bento XVI, assim como os padres conciliares do Vaticano II, estava consciente do fato de que qualquer reforma da Igreja inicia com a liturgia. Hoje, o primeiro desafio para a Igreja, seja nas "cansadas" Igrejas da Europa, seja nas da África e da América Latina, parece ser o de aprender de novo a celebrar "a alegria do Evangelho".
O Papa Francisco deixou isso muito claro sua exortação apostólica programática Evangelii gaudium, sob o emblema da alegria. Podemos nos perguntar por que muitas liturgias dão a impressão de serem celebração fúnebres. Em parte, depende, talvez, do fato de que toda verdadeira festa celebra também o fato de que o ser humano pode ser vulnerável, não é uma ilha "em si mesmo" inacessível, não é como Deus, o que constitui em si mesmo a sua essência.
As nossas festas parecem dominadas pelo medo, mais propensas a afastar essa vulnerabilidade. Na celebração da Eucaristia, por um lado, parece desaparecer a memória do Crucificado e parecem estar em primeiro plano o medo da mudança e do "mundo", enquanto, por outro lado, muitas vezes, parece ter se perdido o contato com as expressões culturais do tempo e com as formas de piedade popular que, em cada época, se redesenham.
Naturalmente, um papa não pode determinar uma nova cultura da festa, mas, em certo sentido, é o guia espiritual da Igreja universal e pode convidar à alegria e à esperança dos corações para si e para toda a Igreja e, por sua vez, pode pedir e obter a oração dos fiéis.
O segundo desafio consiste em uma nova abordagem à Escritura. A Igreja só se tornará uma rede de espiritualidade e de amizade se aprender a celebrar e se conseguir interpretar e inculturar a palavra de Deus em relação ao tempo e em relação àqueles que estão longe.
Essa seria uma tarefa importante da teologia de hoje, ou seja, garantir que a cultura da interpretação das Escrituras melhore, algo para o qual há a necessidade de um suficiente espaço de manobra.
Atualmente, não se pode evitar a impressão de que, na maioria dos lugares de formação eclesial, aprende-se muito, mas tudo viaja ao longo de trilhos pré-formulados, com poucas conexões entre cultura, pastoral, dogmática, filosofia e exegese.
Em estreita relação com uma nova abordagem à Escritura, está a oração para implorar uma nova cultura da oração. Os Salmos como Escritura que se faz oração devem se tornar muito mais presentes na vida das comunidades, e os sacerdotes devem recuperar a própria compreensão de si mesmos justamente a partir do fato de serem guias espirituais das suas comunidades.
Contribuir para explicar a Escritura nas nossas culturas e facilitar o acesso à celebração e à oração, especialmente para uma sociedade que não possui mais as palavras da tradição, são desafios muito fundamentais para a Igreja inteira.
Já foi citada a necessidade de reconstruir uma rede global de amizade e de espiritualidade, assim como o imperativo da opção pelos pobres, que deve novamente ter um papel mais relevante na Igreja. "Onde a Igreja é desprezada pelos pobres, não é mais a Igreja de Deus" [17] é uma advertência nunca bastante clara.
Por fim, é preciso mencionar ainda dois desafios: um diz respeito à '"inculturação" da Igreja. Hoje, como já indicado anteriormente, em muitos casos, a Igreja perdeu o contato com as culturas locais e as suas formas de expressão religiosa, e deve se abrir de maneira radical para os seus problemas, desafios, histórias e feridas.
Isso vale não só para a África, a América e a Ásia, mas também para a Europa. O caminho percorrido por alguns bispos, que fazem referência a tradições atemporais e supostamente sempre válidas, ignorando os contextos culturais e com uma resposta pré-fabricada para tudo, leva às seitas e ao apagamento da Igreja.
Ao contrário, é necessária uma cultura do respeito e do debate, que requer abertura e honestidade, e deve novamente encontrar um lugar dentro da Igreja. O fato de ter reiniciado isso é um dos grandes méritos de Bergoglio.
Um desafio eclesial particular é representado pela inculturação do cristianismo na China e na Índia. Nesse âmbito, os teólogos europeus são chamados a respeitar os esforços dos seus colegas (sobretudo indianos) ao percorrer novas estradas na tradução dos Evangelhos, a apoiá-los o máximo possível e também são chamados a se deixar inspirar pelas suas questões e intuições, e a aprender com eles.
O último ponto, mas mais importante, é a questão do papel das mulheres na Igreja. Se a Igreja, através de uma busca paciente, não encontrar nenhum caminho novo para envolver as mulheres também nas funções de responsabilidade e na interpretação do Evangelho, corre-se o risco de pecar contra o Espírito Santo.
O Papa Francisco novamente deixou claro que a práxis da Igreja de não admitir as mulheres ao sacerdócio não está em discussão. Mas também encorajou a buscar novos modos para tornar visível (em nível institucional) o carisma das mulheres.
Poderia ser um belo sonho se o papa e os bispos encarregassem renomadas mulheres católicas de todo o mundo para organizar um encontro para desenvolver intuições para uma nova colaboração na Igreja, sob a orientação do Espírito Santo...
Notas:
1. Isso é evidente na composição dos Sínodos dos bispos (até 1985 inclusive), mas também nos presidentes das principais Conferências Episcopais. A título de exemplo: Dom Joseph Bernardin, Cincinnati, depois cardeal e arcebispo de Chicago, EUA, presidente da Conferência dos Bispos dos Estados Unidos (USCCB) de 1974 a 1977; Dom John Quinn, San Francisco, EUA, presidente da USCCB 1977-1980; cardeal Aloisio Lorscheider, Fortaleza, depois Aparecida, Brasil, presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil de 1971 a 1979, e de 1976 a 1979, também presidente do Conselho Episcopal Latino-Americano (Celam); Dom Ivo Lorscheiter, Santa Maria, Brasil, presidente 1979-1987; cardeal Anastasio Ballestrero, Turim, presidente da Conferência Episcopal Italiana (CEI) 1979-1985; cardeal Vicente Enrique y Tarancón, Madri, Espanha, presidente da Conferência Episcopal Espanhola de 1971 a 1981.
2. Um representante significativo desse grupo era o cardeal Giuseppe Siri, de Gênova, que foi contado entre os muitos adversários de Paulo VI. Também pertencia a uma área bastante conservadora, embora ligado por amizade a Paulo VI, o cardeal Albino Luciani, futuro Papa João Paulo I.
3. Discutiu-se sobre o fato de que João Paulo II não renunciou ao seu cargo quando os problemas de saúde começaram a ser evidentes. Ele deliberadamente quis dar visibilidade pública às imagens de sua condição para pôr no centro da atenção o tabu do sofrimento. Em um mundo em que tem direito de existir apenas o que é midiático, ele devia, assim, dar novo direito de existência e dignidade a doentes e sofredores.
4. João Paulo II sabia distinguir claramente entre os dois. O comunismo era para ele um mal, mas o nazismo era "o mal".
5. Estavam particularmente na mira as Conferências Episcopais brasileira, peruana e chilena; eram "confiáveis" sobretudo os bispos colombianos e argentinos, fato que certamente desempenhou um papel na escolha de Bergoglio.
6. O conflito com a Conferência Episcopal Alemã sobre a consulta em caso de interrupção da gravidez deve ser entendida exatamente nesse contexto.
7. Do mesmo modo, um papel muito importante foi desempenhado pelo cardeal colombiano Alfonso López Trujillo, que foi o primeiro secretário-geral e, depois (1979-1983), presidente do Celam, e que parecia ser um forte adversário da teologia da libertação.
8. Através das nomeações dos bispos e da crescente atenção para a questão do aborto, que nos anos 1970 e principalmente 1980 levou os bispos norte-americanos a colocarem em segundo plano o problema da justiça social, reforçou-se a aliança entre a Conferência dos Bispos dos EUA e o Partido Republicano (a partir da eleição do cardeal Francis George, de Chicago, a presidente da USCCB, em 2007), em favor do qual os principais cardeais e bispos dos EUA se pronunciaram de maneira muito aberta (por exemplo, o cardeal Raymond L. Burke, Saint Louis, depois prefeito da Signatura Apostólica e, após o Sínodo de 2014 sobre a família, nomeado patrono da Soberana Ordem Militar de Malta, e o arcebispo Charles Chaput, Denver, agora Filadélfia).
9. Na realidade, foram dois os cardeais que – de modos diferentes – davam sinais de um confronto intelectual com a nova cultura global. De um lado, o arcebispo de Milão, cardeal Carlo Maria Martini, muitas vezes intimamente ligado às pegadas de Montini, de outro, Joseph Ratzinger, intimamente ligado à Wojtyla.
10. A encíclica sobre a fé, Lumen fidei, no entanto, foi publicada pelo seu sucessor.
11. Na minha opinião, na filosofia, na teologia e nas ciências sociais, reflete-se muito pouco sobre o que as grandes narrativas da atual ciência popular, que abordam os temas do fim do ser humano ou do vazio congelamento entrópico do universo, significam para a autocompreensão cultural do nosso mundo. Talvez, a crise ecológica de hoje seja abordada de modo tão cínico não só por motivos econômicos, mas também porque, ao menos no Ocidente, não se prevê que se consiga vencê-la.
12. Como exemplos de megalópoles com um número significativo de católicos, podem ser citadas São Paulo, Rio de Janeiro, Buenos Aires, Cidade do México, Manila, Mumbai, Lagos, mas também Kinshasa, Saigon, Xangai (com uma população cristã em rápido crescimento).
13. Para grandes grupos da população das novas megalópoles, um papa dos "confins do mundo" é um importante modelo de referência. Não por acaso, Bergoglio destacou esse aspecto durante a sua apresentação.
14. O Facebook, em certo sentido, é uma extensão desse ethos, na medida em que qualquer um pode me chamar de "amigo". A diferença radical entre o ethos cristão e a perversão gnóstica do Facebook está na absoluta "desencarnação" que ele expressa.
15. Com uma expressão enfática, se poderia dizer que podemos imaginar que o Papa Francisco existe também "fora" da mídia.
16. Um problema fundamental da Igreja Católica está no fato de que o procedimento em si mesmo extremamente positivo, pelo qual, nas nomeações episcopais, o papa tem e deve ter a última palavra, na Igreja, no entanto, foi invertido, de modo que o papa também tem a primeira palavra. Em outras palavras, a exceção de que uma nomeação episcopal passe pelo papa tornou-se a regra geral.
17. Essas palavras me parecem ter sido expressadas por Dom Franz Kamphaus, bispo emérito de Limburg, na Alemanha.
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Francisco e os antecessores: uma nova ordem simbólica na Igreja. Artigo de Kurt Appel - Instituto Humanitas Unisinos - IHU