13 Março 2015
Dois anos de Papa Francisco. Dois anos que mudaram a Igreja. Na qual, também, as tensões e as resistências permanecem. Mas, desde aquele 13 de março de 2013 em que Jorge Mario Bergoglio impôs a si mesmo o nome do santo de Assis, o Vaticano parece ser um lugar transformado. "Ele veio para reparar a Igreja", diz o cardeal Oscar Andrés Rodríguez Maradiaga, seu principal colaborador à frente do Conselho dos nove purpurados chamados para fazer as reformas, considerado por muitos como o "vice-papa".
A reportagem é de Marco Ansaldo, publicada no jornal La Repubblica, 12-03-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis a entrevista.
Eminência, todos concordam que houve uma reviravolta com a chegada de Bergoglio. Mas talvez ninguém mais do que o senhor, que o conhecia bem antes, e a quem ele quis fortemente no pontificado, pode nos dizer como a Igreja mudou nesses dois anos.
Mudou muito, desde o dia da sua eleição, quando, antes de nos abençoar, pediu que rezássemos por ele, pelo novo início. Ninguém podia imaginar isso. O bispo de Roma que pede que os seus fiéis rezem por ele.
E o seu programa?
Ficou logo muito claro. Ele escolheu o nome de Francisco porque admirava São Francisco de Assis, que pedia uma Igreja pobre para os pobres. E o seu estilo próximo, humilde e cheio de alegria trouxe à Igreja esperança e ar fresco. Acho que, interiormente, ele respondeu àquilo que o Cristo de São Damião disse a São Francisco: "Repara a minha Igreja".
Não só a Igreja, mas o próprio Vaticano mudou. Mas aonde o papa quer chegar exatamente?
Eu acho que o seu propósito é simplificar o suficiente o serviço da Cúria vaticana, para que não seja uma espécie de burocracia administrativa, mas um instrumento ao serviço da Igreja universal com os critérios do Evangelho. Essa reforma da Cúria foi um desejo da maioria dos cardeais no pré-conclave, inclusive este Conselho dos Cardeais ao qual eu pertenço e que foi sugerido por vários deles. Desejava-se um impulso que viesse da base da Igreja, dos cinco continentes.
Cada vez mais, no entanto, o pontífice não poupa críticas à Cúria. Há quem resista à mudança. Quem vencerá?
Parece-me lógico que aqueles que estavam acostumados com outros tempos resistam a uma simplificação do estilo curial. O que o papa nos pede é um testemunho do Evangelho muito clara nos seus critérios. As suas críticas são um chamado "profético" à pobreza, também nas coisas exteriores. Isso aproxima mais as pessoas, especialmente aqueles que se afastaram. Acho que quem vai vencer será o Senhor Jesus, que guia a Igreja.
O Sínodo de outubro parece ser decisivo sobre questões como a comunhão para os divorciados em segunda união e as aberturas aos homossexuais. Mas a intenção do papa é a de tocar também questões doutrinais, como o celibato dos sacerdotes?
Eu acho que há um erro na mídia sobre o processo de focalização do Sínodo sobre a família. Não devemos esperar apenas um documento. É uma viagem para encontrar as respostas pastorais para uma situação que mudou muito. Concentrar-se na comunhão para os divorciados em segunda união ou nas uniões entre pessoas do mesmo sexo é reduzir a perspectiva notavelmente. Não há nada a se fazer sobre o celibato dos padres. Enganam-se aqueles que pensam que o Santo Padre pretende mudar o Evangelho. A Igreja é uma instituição divina e humana, imanente e transcendente ao mesmo tempo. Não se trata de agradar o mundo com aquilo que o mundo pede, mas de levar a cumprimento o plano de Deus.
Demos um passo atrás e vamos por um momento à renúncia de Bento XVI. O senhor não pensa que, justamente graças a esse gesto clamoroso foi possível chegar a um papa como Francisco, que quis marcar um claro corte com o passado?
O Papa Bento XVI desenvolveu um pontificado muito corajoso e determinado, com um magistério precioso que enriqueceu a todos nós. Mas, dando-se conta de que não era mais acompanhado pela força física, teve a coragem de renunciar. Essa passagem de grande fé é, ao mesmo tempo, um grande exemplo para o futuro. Não concordo quando você fala de "claro corte com o passado". O Papa Francisco sabe que não iniciou a Igreja de Cristo hoje, mas que é herdeiro de uma tradição de séculos. A sua tarefa é a de conjugar a "tradição" com a "novidade", buscando a resultante, impulsionado pelo Espírito Santo.
Mas, na sua opinião, as razões da renúncia não devem ser buscadas além da idade e da saúde de Joseph Ratzinger? Por exemplo, por causa da amargura do caso Vatileaks?
Acho que há muita lenda nas especulações sobre a renúncia do Papa Bento XVI. Ao retornar da sua viagem ao México e Cuba, em 2012, ele disse aos seus colaboradores que não se sentia com forças suficientes para continuar no seu serviço como pontífice e que estava pensando em renunciar. Portanto, foi uma decisão amadurecida na oração e no tempo. Quase um ano. E ele não terminou o seu serviço amargurado ou triste. Certamente, o Vatileaks lhe causou dor. Mas a sua renúncia foi uma decisão de fé.
E para o senhor, pessoalmente, o que mudou com Francisco?
Mudou principalmente a proximidade com o pontífice. Antes, a única possibilidade de ter uma conversa com o Santo Padre era através da Casa Pontifícia. Agora, é ele que se aproxima de nós. Uma missa na Casa Santa Marta, uma saudação em um corredor ou em no elevador, um encontro no caminho para a Aula do Sínodo. E a atitude fraterna e a amizade são algo que todos nós apreciamos enormemente.
O papa diz de si mesmo que vai durar pouco. O senhor acredita?
Só Deus sabe quanto ele durará. Esperamos que viva muitos anos pelo bem da Igreja. Essa sua frase foi uma piada. Mas ele está convencido da sua missão e quer completá-la.
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''O Papa Francisco veio para reparar a Igreja. Há quem não queira as reformas, mas Jesus é quem vai vencer.'' Entrevista com Oscar Maradiaga - Instituto Humanitas Unisinos - IHU