02 Fevereiro 2015
Caros amigos, me desculpo se, por uma vez, intervenho sobre estes temas fazendo referência explícita a certas polêmicas cotidianas. Mas, acima de tudo, peço antecipadamente desculpas ao professor Antonio Livi, renomado teólogo, que, de púlpitos telemáticos, tinha convidado, a mim em particular – e aos jornalistas em geral – a não se ocuparem de teologia e a não escreverem artigos sobre tais assuntos. Uma lição de Jornalismo Teológico ou de Teologia Jornalística de que não vou esquecer. Mas hoje – realmente – não consegui deixar de escrever.
A nota é de Andrea Tornielli, jornalista, publicada no seu blog Sacri Palazzi, 30-01-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Justamente para não invadir impropriamente o campo dos Mestres em Teologia, nem aquele que, embora indignamente, eu pratico, infelizmente para vocês, há alguns anos, o do jornalismo, prefiro permanecer, como vocês verão em um instante, em um nível mais baixo. Muito mais baixo.
Nessa quinta-feira, quando li o último artigo no conhecido blog antibergogliano de Sandro Magister [disponível aqui, em italiano], dedicado à crítica cotidiana de qualquer coisa que o Papa Francisco faça ou diga, não pude me segurar. Convido-os à leitura prévia, porque achei o título – se me é permitido – um pouquinho enganoso.
O conteúdo é este: um jesuíta, com bom conhecimento das Filipinas, padre Pierre de Charentenay, recentemente trabalhando com os escritores da revista La Civiltà Cattolica, escreveu um livro sobre as Filipinas (não um artigo na revista dos jesuítas), no qual estão contidas algumas linhas de crítica muito discutíveis contra os bispos daquele país e às suas posições no que diz respeito às políticas do controle de natalidade.
Tudo isso se torna ocasião para criticar o Papa Francisco. Como não é disso que eu quero falar, deixo aos interessados a leitura e qualquer consideração a respeito.
Ao contrário, o que me chamou a atenção, no artigo publicado nessa quinta-feira no blog antibergogliano, foi a contribuição de outro jesuíta, o padre estadunidense Joseph Fessio, que, para refutar as poucas linhas do coirmão francês republicadas por Magister, escreveu uma contribuição igualmente curta, mas teologicamente densa, que realmente vale a pena ler.
Movendo-me em um campo mais consoante à minha pouca preparação teológica, vou me permitir fazer uma citação cinematográfica, seguramente não alta nem culta, mas, a meu ver, igualmente eficaz: o contador Ugo Fantozzi.
Pois bem, a minha reação à leitura da argumentação teológica contida no artigo de Magister-Fessio foi a mesma frase liberatória que o inesquecível Fantozzi pronuncia, aclamado pelos colegas, depois de permanecer por horas diante da projeção de O encouraçado Potemkin, filme soviético do grande e irrepreensível Serguei Mikhailovitch Eisenstein. [Assista ao trecho do filme aqui.]
O que me fez saltar da cadeira, sugerindo-me a colorida expressão fantozziana, foram as afirmações do padre Fessio, segundo as quais a contracepção é igual ou até mais grave do que o aborto. Porque, abortando, é verdade, mata-se um ser humano nascituro, uma criança que está se formando no seio materno, um ser único, desde o início totalmente outro em relação à mãe etc. Mas, com a contracepção, faz-se com que nunca exista um filho que Deus quis que viesse ao mundo.
Deixo a palavra ao padre Fessio, para não deturpar o seu pensamento:
"Qual é, então, o mal mais grave? Evitar a concepção – e a existência – de um ser humano com uma alma imortal, querido por Deus e destinado à felicidade eterna? Ou abortar um bebê no útero materno? Este último, certamente, é um mal grave. A Gaudium et spes o define como um "crime abominável". Mas, mesmo assim, existe uma criança que viverá eternamente. Enquanto, na primeira circunstância, nunca existe um filho que Deus pretendia que viesse ao mundo."
Com todo o respeito devido às opiniões teológicas de Fessio e de Magister, dizer que a contracepção é mais grave do que o aborto, ou mesmo apenas colocá-los em um mesmo e idêntico plano, provoca em mim a reação expressada pelo inesquecível Fantozzi diante do "tijolão" cinematográfico.
Magister, justamente, apresentou o padre Fessio como "membro de destaque" do "Ratzinger Schülerkreis", o círculo dos discípulos de Ratzinger. Talvez, valeria a pena recordar, concluindo, o que Bento XVI disse na entrevista com Peter Seewald, Luz do Mundo, a propósito da Humanae vitae e também a propósito do preservativo, "justificando o seu uso em casos particulares" (cito aqui, para não errar, as palavras escritas pelo próprio Magister, que, na época, parecia bastante favorável).
Pois bem, o fato de que, para atacar o Papa Francisco de um modo um pouco contorcido – nem sempre é fácil encontrar assuntos cotidianos –, exponham-se essas teses, colocando no mesmo plano contracepção e aborto, e apresentando até a primeira como mais grave do que o segundo, diz muito.
Em particular, diz como uma certa teologia, deste e do outro lado do oceano, corre o risco, às vezes, de ser – falando com todo o respeito e com a devida reverência – um pouquinho fantozziana.
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Quando o preservativo é mais grave do que o aborto - Instituto Humanitas Unisinos - IHU