09 Janeiro 2015
"Com George Wolinski – um dos cartunistas mortos em Paris –, trabalhamos juntos anos atrás na Nouvel Obsevateur. É incrível pensar como tudo isso aconteceu no dia em que, no Charlie Hebdo, ocorria a reunião de pauta".
Marcelle Padovani confessa uma "forte emoção", jornalista francesa especialista na história da esquerda italiana, coautora com de Cose di Cosa Nostra (1991) e, atualmente, correspondente de uma das revistas mais importantes da França, a Nouvel Observateur.
Nessa quarta-feira, foi lançado, na França, Soumission, o mais recente romance de um controverso autor como Michel Houellebecq (na Itália, ele deve ser publicado no dia 15 de janeiro).
A reportagem é de Andrea Valdambrini, publicada no jornal Il Fatto Quotidiano, 08-01-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Sabemos que é um livro que tem como alvo a islamização da França. Apenas uma coincidência de tempos com o atentado no Charlie Hebdo?
Certamente não. Esses jovens terroristas não são ingênuos, mas pessoas informadas. São franceses, e não as pessoas que vêm de fora. Frequentaram as escolas francesas. Portanto, seguramente fizeram uma conexão com a data de lançamento do livro.
Por que escolheram o Charlie Hebdo?
Partamos da natureza dessa publicação. Trata-se de um jornal satírico libertário, anárquico, seguramente agudo. É antidireita, mas também antiesquerda. Mas há muito tempo virou no sentido decididamente islamofóbico, desde as primeiras publicações das caricaturas de Maomé em 2006. E, sempre em nome da sua essência rebelde, chegou paradoxalmente a acariciar as ideias da extrema-direita de Marine Le Pen. Infelizmente, os colegas do Charlie pagaram caro pela sua escolha, e isso certamente é condenável. Também devo dizer que tanto o romance de Houellebecq, quanto as escolhas editoriais do jornal satírico que levaram a essa tragédia deveriam levar a uma reflexão profunda. E nos ensinar que só a democracia pode vencer o fanatismo.
A dinâmica parece ser diferente da dos atentados jihadistas vistos anteriormente. Podemos dizer que estamos diante de uma ação paramilitar coordenada? Estamos diante de um salto de qualidade?
Não acredito. Acima de tudo, os terroristas escolheram um objetivo, mas tranquilamente poderiam ter encontrado outro. Devemos levar em conta a situação francesa, em que os jihadistas autóctones dão respostas tragicamente violentas à sua situação de não integração social. Os agressores representam a geração que, há 20 anos, se rebelou nas banlieue. Agora, eles têm entre 35-40 anos e estão irritados com a França, porque não conseguiram aquilo que queriam. Substancialmente, esses terroristas apenas responderam ao chamado do Isis e da al-Qaeda, que convidou os jihadistas no Ocidente a fazerem um atentado. Claro, tenho muito medo dos fenômenos de imitação.
Qual será o impacto do atentado em Paris?
Estou convencida de que, na França, haverá um reflexo de unidade nacional muito forte. As consciências não deverão mais brincar com o fogo, nem com o pró-islamismo, nem com anti-islamismo, como aconteceu até hoje. A direita de Sarkozy e até mesmo a Frente Nacional não poderão se aproveitar em sua própria vantagem de um fato de tal gravidade.
Da Escandinávia à Alemanha, toda a Europa parece se tingir de sentimentos islamofóbicos e de extrema direita. O que está acontecendo?
Estamos na terceira guerra mundial em pedacinhos, para retomar a definição do Papa Francisco. No entanto, devemos ter a certeza de uma coisa: não há nenhum país no mundo onde o terrorismo tenha vencido. O terrorismo certamente desestabilizou as instituições, condicionou a política e a sociedade. Tornou tudo mais difícil. Mas quem sempre venceu foi o Estado. A verdadeira pergunta é a que preço tudo isso chegará. Será a vitória de um Estado democrático ou do autoritarismo e da ditadura?
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''Como diz o papa, é uma guerra'' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU