07 Janeiro 2015
Já se sabia da imprevisibilidade do Papa Francisco. Mas a lista dos novos cardeais aos quais ele dará a púrpura no consistório do próximo 14 de fevereiro esmigalhou qualquer previsão.
A nota é de Sandro Magister, publicada no seu blog Settimo Cielo, 04-01-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Aqueles que têm menos de 80 anos e, portanto, têm o direito de votar no conclave serão 15. E o papa os anunciou nesta ordem:
Depois dessas nomeações, os cardeais eleitores aumentarão, assim, para 125, cinco a mais do que os 120 regulamentares. Mas, em março e em abril, completarão 80 anos os cardeais Antonio Naguib e Justin F. Rigali; em setembro, os cardeais Velasio De Paolis e Santos Abril y Castelló; e, em fevereiro de 2016, o cardeal Roger M. Mahony, levando em um ano o número dos eleitores novamente para dentro do limite estabelecido (que o papa pode também revogar, como fez João Paulo II de forma maciça).
Além disso, Francisco anunciou que vai dar a púrpura a cinco cardeais com mais de 80 anos, que, na sua opinião, "se distinguiram no serviço à Santa Sé e à Igreja". Na ordem:
Destes, o primeiro, o colombiano Pimiento Rodríguez, 96 anos, foi nomeado bispo ainda por Pio XII, em 1955, e é um dos oito bispos "pacellianos" ainda vivos, enquanto para os outros dois novos cardeais a concessão da púrpura tem o aspecto de um ato reparatório, pelos seus atritos com outros dois papas.
De Magistris, 88 anos, foi o único curial de destaque que se pronunciou contra a beatificação de José Maria Escrivá de Balaguer, o fundador do Opus Dei. E criticou em várias ocasiões as cerimônias de João Paulo II e o seu diretor, Piero Marini, em particular pelas danças exóticas introduzidas no centro da missa. Inimizou-se a tal ponto com o establishment wojtyliano que foi punido com privação do barrete cardinalício que lhe caberia como penitenciário maior, entre 2001 e 2003, único caso na história desse dicastério.
De Rauber, 81 anos, lembram-se, ao contrário, os confrontos com Bento XVI, o último em 2009, quando era núncio na Bélgica. Para a sucessão do progressista Godfried Danneels como arcebispo de Bruxelas, Rauber havia enviado a Roma uma terna na qual não figurava o conservador André Léonard, na sua opinião "não adaptado". Mas Bento XVI se obstinou e nomeou justamente Léonard.
Tendo-se retirado para a vida privada, Rauber esvaziou o saco, ponto em público este e outros confrontos seus com Joseph Ratzinger em uma entrevista contundente à revista Il Regno. E agora o Papa Francisco o faz cardeal, deixando à espera pela segunda vez consecutiva o muito mais bem titulado Léonard.
Com esta nova fornada, os cardeais eleitores criados pelo Papa Francisco sobem para 31, apenas três a menos do que os 34 nomeados por João Paulo II e não muito longe dos 60 que receberam a púrpura de Bento XVI.
Enquanto isso, porém, com o atual papa, os critérios de escolha mudaram. Enquanto os antecessores se atinham a regras consolidadas, por exemplo dando o barrete aos titulares de dioceses ou de cargos curiais tradicionalmente cardinalícios, Francisco não se deixa condicionar por isso e escolhe com a sua cabeça, com o resultado de inserir no Colégio Cardinalício um bom número dos seus favoritos, remodelando-o à sua imagem e semelhança mais do que como ocorria no passado.
O abandono das regras tradicionais faz com que Francisco amplie em muito também o número dos possíveis candidatos. Na Itália, por exemplo, em vez dos titulares das únicas duas dioceses cardinalícias atualmente sem púrpura, Turim e Veneza, Francisco escolheu em plena liberdade entre os mais de 200 bispos residenciais, pescando, no fim, os inesperados Menichelli e Montenegro.
O primeiro, ex-secretário por muitos anos do cardeal Achille Silvestrini. O segundo, com jurisdição sobre a ilha de Lampedusa, meta da primeira e simbólica viagem de Francisco fora de Roma.
No conjunto, entre as novas nomeações feitas por Francisco, apenas duas aparecem em linha com a tradição: a do patriarca de Lisboa e a de Mamberti, que tomou o lugar do deposto cardeal Raymond L. Burke à frente do supremo tribunal da Signatura Apostólica.
Mas a de Mamberti foi a única nomeação feita na Cúria. Permanece assim sem púrpura, ao contrário de uma prática plurissecular, também o arquivista e bibliotecário da Santa Romana Igreja. O atual titular, o dominicano francês Jean-Louis Brugués, quando estava na Congregação para a Educação Católica, tinha se oposto tenazmente à nomeação como reitor da Universidade Católica de Buenos Aires de Víctor Manuel Fernández, pupilo e ghostwriter de Jorge Mario Bergoglio, que, mesmo assim, o impôs e, depois, fê-lo arcebispo assim que se tornou papa.
Com Mamberti, os cardeais da Cúria eleitores aumentam em uma unidade, mas diminuem de peso. Enquanto agora são 33 de 110, ou 30%, depois do consistório de 14 de fevereiro, serão 34 de 125, ou 27%.
Na Espanha, a escolha recaiu sobre o arcebispo Valladolid, outra diocese não cardinalícia. É verdade que Blázquez Pérez é o presidente da conferência dos bispos espanhóis, mas, para o papa, isso não interessa. No Panamá, no Uruguai, na Tailândia, em Myanmar, Francisco preferiu dar a púrpura a "cadetes", em vez do que aos detentores da presidência do episcopado.
A maioria das novas nomeações estão no Sul do mundo. Dois na África: Etiópia e Cabo Verde. Três na Ásia: Vietnã, Mianmar e Tailândia. Três na América Latina: México, Uruguai e Panamá. Duas na Oceania: Nova Zelândia e Ilhas Tonga. Três desses países terão um cardeal pela primeira vez na história: Cabo Verde, Myanmar e Tonga. O bispo de Tonga, 53 anos, também será o mais jovem do Sacro Colégio, seguido de perto pelo de Montevidéu, de 55 anos.
No México, o escolhido para ser criado cardeal, Alberto Suárez Inda, da arquidiocese de Morelia, no ensanguentado Estado de Michoacán, é também o primeiro bispo mexicano que celebrou solenemente a missa no rito antigo na sua catedral, depois da publicação em 2007 do motu proprio de Bento XVI Summorum pontificum: ele o fez na véspera de Natal de 2013, dando também a Crisma a duas jovens tradicionalistas.
Entre os novos cardeais, faltam os jesuítas. Há um lazarista, o etíope Demerew Souraphiel, um agostiniano, o espanhol-panamenho Lacunza Maestrojuán. e dois salesianos, os arcebispos de Yangon e de Montevidéu, que reforçam a posição de liderança dos filhos de São João Bosco no colégio dos eleitores: 5 de 125.
Como aos membros de movimentos eclesiais, o arcebispo de Bangkok também é o presidente dos bispos "amigos dos focolarinos", entre os quais já se incluem os cardeais João Braz de Aviz e Ennio Antonelli, enquanto o arcebispo de Valladolid é próximo dos neocatecumenais, assim como o cardeal Fernando Filoni.
Seis dos 15 novos cardeais eleitores – os de Lisboa, Wellington, Ancona, Addis Ababa, Valladolid, Tonga – participaram em outubro passado do Sínodo Extraordinário sobre a família; o de Ancona por chamado direto do papa.
E dois deles, o neozelandês Dew e o italiano Menichelli, se alinharam em defesa da comunhão para os divorciados em segunda união e do reconhecimento das uniões homossexuais.
Escolhendo Dew como novo cardeal dessa região geográfica, em vez do arcebispo de Sydney, Anthony Colin Fisher, sucessor do cardeal George Pell e, como ele, intransigente defensor da indissolubilidade do matrimônio, o Papa Francisco fez com que vazasse mais uma vez em que direção vão as suas simpatias na pastoral da família.
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Os novos cardeais. Tudo como manda Francisco, e só ele - Instituto Humanitas Unisinos - IHU