Por: Jonas | 10 Novembro 2014
“Podemos é Pablo Iglesias, por mais que ele pretenda, como todo líder sempre faz, dizer que não é assim, que Podemos é muito mais do que ele, que ele não é um ‘macho alfa’, que aqueles que pensam dessa forma não entenderam o que é o Podemos”, avalia Alfredo Torrado, em artigo publicado por Rebelión, 07-11-2014. A tradução é do Cepat.
Eis o artigo.
Destacar as contradições do Podemos se tornou lugar-comum, como a conclusão de que estas contradições se manifestarão, caso governem, e que então deverão resolvê-las ou estas acabarão com a formação. Parece-me, ao contrário, que as contradições mais aparentes não são estas; que, mesmo assim, explicam parte de seu êxito e que o perigo para o Podemos pode vir muito mais de sua falta de contradições, de uma centralização na liderança.
As contradições mais visíveis do Podemos são: a contradição entre a “democracia participativa”, mais ou menos “direta”, dos “círculos” e a centralização na liderança de Iglesias; a contradição entre a autoproclamada identidade de esquerda de seus dirigentes e a insistência em que “não é um problema de esquerda, nem de direita, mas, sim, de decência”, etc. Este é um discurso que parece convir, igualmente, a próprios e a estranhos; mas imaginemos, somente para tornar mais patente a contradição aos próprios, que um político de direita dissesse: “eu sou de direita, mas caso conquiste o poder não farei políticas de direita, mas, sim, decentes”. Por último, a contradição entre o “patriotismo” e a defesa do direito de autodeterminação da Catalunha, o País Basco, etc. A enumeração poderia continuar.
Ao contrário do que se pensa, estas contradições aparentes, de discurso, serviram para captar as simpatias mais diversas. Em uma época de desespero, Podemos ofereceu um cardápio contraditório, no qual cada um pode escolher o prato que mais gosta, sem olhar o que quem está ao lado pede e sem pensar no segundo prato.
Não acredito que Podemos “resolva” estas contradições. O mais provável é que se diluam em favor de um de seus termos, na medida em que o partido crescer eleitoralmente. Nesse sentido, a “democracia real” dos círculos será limitada ou ficará em função da grande liderança; a “política da decência” dará lugar a políticas de esquerda, suavizadas pelas exigências da realpolitik; e o “direito de decidir” dará lugar ao patriotismo pseudo-federal, comum, em maior ou menor medida, ao PSOE e a IU.
Porém, se Podemos não cumprir com as enormes expectativas que está gerando (para começar, em seus líderes), será dissolvido com a mesma rapidez com a que emergiu, nos termos contrários de suas contradições, deixando para trás de si uma espuma de “democracia real”, “decência” e “direito a decidir”.
Por quê? Porque a “contradição principal” é a contradição entre liderança e democracia, e esta contradição pode ser que se mantenha e seja superada internamente; mas para fora, tendo os líderes do Podemos renunciado, por necessidade, um discurso ideológico nos termos clássicos, e ainda dominantes (por muito que se diga), de esquerda e direita, a única coisa que se mantém é a liderança. Por isso, a liderança se torna excessiva, sem contrapeso de qualquer tipo. De fato, também é assim para dentro, porque continua sendo fundamentalmente uma liderança midiática, muito descompensada (não há outro dirigente do Podemos que tenha a presença midiática de Iglesias).
Podemos não é um partido ideológico, mas, sim, um partido de líder. Não é que no Podemos ou em seus líderes não exista ideologias. É claro que existem. Há ideologias diversas, ideias soltas, mas não uma ideologia minimamente coerente. A coesão se produz em torno do líder. O importante não é a ideologia política, mas, sim, o que diz Pablo Iglesias. Iglesias conseguiu algo que nenhum outro dirigente político tem, atualmente, na Espanha: liderança. Podemos é Pablo Iglesias, por mais que ele pretenda, como todo líder sempre faz, dizer que não é assim, que Podemos é muito mais do que ele, que ele não é um “macho alfa”, que aqueles que pensam dessa forma não entenderam o que é o Podemos, etc, etc... Jamais um líder se apresentou meramente como um líder.
Para além das contradições aparentes, a verdadeira contradição do Podemos, não superada, é a seguinte: No momento em que Iglesias perceber que não irá vencer, que não cumpre as/suas expectativas ou que sua liderança é questionada, se retirará, como ameaçou fazer, caso não fossem votadas suas propostas na assembleia de 18-19 de outubro, e como continua fazendo, ao declarar na entrevista de Évole que se o Podemos não obter bons resultados, nas próximas eleições, sairá. Por quê? Não apenas porque subjetivamente Iglesias tenha consciência de que é o líder e que, como repetiu mais de uma vez, só está para vencer, mas porque sabe que, com a falta de ideologia, ele (apoiado por sua equipe, claro) é o único que pode dar coesão e direção ao Podemos e aos seus eleitores. Por isso, sem Pablo Iglesias, Podemos ficaria nas mãos de Deus. A não ser que fosse encontrado outro líder ou que, o Podemos conseguisse se formar ideologicamente. Porém, esta última possibilidade é pouco provável, uma vez que justamente na medida em que Iglesias mantém sua liderança, Podemos não criará coesão ideológica, mas, sim, em torno dele.
Esta é a contradição, não resolvida, da centralização na liderança. A fortaleza do Podemos é a sua fraqueza. Iglesias é o seu único fundamento sólido, mas também por isso é o seu calcanhar de Aquiles. Hoje, Podemos depende absolutamente de Pablo Iglesias. Podemos é Pablo Iglesias.
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As contradições do “Podemos”: ideologia e centralização na liderança - Instituto Humanitas Unisinos - IHU