24 Outubro 2014
O cardeal vienense Christoph Schönborn pediu não só aos meios de comunicação como também à Igreja em geral que olhem, mais de perto, o ambiente familiar – incluindo pais solteiros, viúvas, filhos de casais divorciados e famílias com composições as mais diversas – em vez de se concentrarem somente na Comunhão aos divorciado e casados novamente no civil e às pessoas em relacionamentos homoafetivos.
A reportagem é de Christa Pongratz-Lippitt, publicada por National Catholic Reporter, 23-10-2014. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Até certo ponto, a “visão de túnel” dos meios de comunicação – a saber, a sua concentração sobre as pessoas divorciadas e recasadas e aquelas em relacionamentos gays – também desempenhou um papel predominante nas discussões sinodais, contou o religioso à imprensa em seu retorno a Viena.
Em seguida, citou a opinião de uma das poucas participantes femininas do Sínodo: Ute Eberl, 52, mãe de três filhos, casada, e que vem sendo a responsável pelo trabalho pastoral da família na Arquidiocese de Berlim há mais 20 anos.
“Olhemos para a sala de estar em primeiro lugar, e não o quarto”, disse Eberl aos participantes do Sínodo em sua fala de quatro minutos, segundo Schönborn. “Uma vez que começarmos a abanar o dedo, não mais seremos levados a sério”.
Schönborn disse que concordou com Eberl e que sabia que o papa tinha concordado também.
O declínio no número de casamentos ao redor do mundo é, de longe, o fator mais preocupante e que deveria estar ocupando o centro das atenções, declarou Schönborn. “O grande problema, realmente, é que as pessoas não estão se casando – e isso acontece no mundo todo”, falou.
Porque, em muitos casos, os casais jovens vivem juntos atualmente, o Papa Francisco sugeriu acompanhá-los e incentivar o que fosse promissor e valioso em seus relacionamentos na esperança de que isto levasse ao casamento, Schönborn disse.
A mudança de perspectiva do papa – vendo positivamente a realidade da vida das pessoas – incutiu o medo de que a “seriedade do ideal” do matrimônio se perdesse caso os relacionamentos irregulares forem acompanhados. Francisco contou aos bispos austríacos na visita “ad limina” feita por eles em janeiro que achava extraordinário este medo. Schönborn disse: “Aliás, o mais surpreendente é que esta mudança de perspectiva que papa pede está causando muitos temores, quando ele apenas quer nos lembrar da alegria do Evangelho, que está tão presente como sempre”.
Schönborn disse que o Papa Francisco está sendo exposto a uma “onda maciça de ataques”, especialmente na mídia italiana, ataques evidentes, segundo ele, em reportagens publicadas no Il Foglio ou em certos livros escritos por editores italianos conhecidos, tal como Mondadori. Algumas reportagens até mesmo afirmaram que a eleição de Francisco não foi válida, disse o cardeal.
Durante o Sínodo, Schönborn contou ao jornal italiano Corriere della Sera que ele próprio tinha um grande respeito por parcerias homoafetivas fiéis de longa data. Disse que conhecia um casal assim em Viena e que, quando um dos parceiros ficou gravemente doente, o outro não saiu do seu lado. Lembrou as palavras de Cristo de que os publicanos e as prostitutas também vão para o céu, e disse que a mensagem de Jesus igualmente se dirige aos bispos e padres, os quais poderiam se curvar aos comportamentos exemplares de casais homossexuais mesmo se eles não deem a bênção para com a forma de sexualidade destas pessoas.
O desejo do papa por uma discussão aberta e por um balanço realista das situações das famílias foi, no geral, alcançado no Sínodo, acrescentou Schönborn, mas ainda assim houve assuntos a seres analisados e ideias a serem discutidas. A sua própria “chave teológica” de acompanhar os “traços de Cristo” nos relacionamentos fora do matrimônio ideal católicos encontrou uma ampla reposta no Sínodo, embora não tendo sido explicitamente mencionada no documento final, disse Schönborn, recordando a proposta do papa de se olhar positivamente ao que já está presente, e não no que está faltando.
Uma opinião feminina do Sínodo
Eberl, uma das poucas mulheres convidadas pessoalmente pelo papa a participar no Sínodo, foi a responsável por reunir as respostas do questionário do Vaticano na Arquidiocese de Berlim.
Perguntada pelo jornal alemão Der Tagesspiegel após a primeira semana de discussões do Sínodo sobre o que havia dito aos bispos, Eberl respondeu: “Disse: Olhemos para a sala de estar em primeiro lugar, e não o quarto. Vamos testemunhar os medos destas pessoas, as alegrias e tristezas na sala de estar – é isso o que conta caso queiramos, como Igreja, estar próximos delas. Os conceitos de vida se tornaram mais frágeis. Uma vez que começarmos a abanar o dedo, não mais seremos levados a sério”.
Também perguntaram a ela quais eram as chances de os católicos divorciados e recasados receberem os sacramentos.
“Podemos perceber que algo está se desenvolvendo”, disse ela. “Sobre esta questão, não será possível voltarmos atrás, na medida em que os casamentos não estão só se rompendo na Europa. Na América Latina, famílias inteiras estão se separando. Isso ficou bastante claro na primeira semana [de debates no Sínodo]. Este assunto foi debatido de forma acalorada. Até mesmo alguns participantes experientes em sínodos episcopais acabaram dizendo que nunca tinham visto discussões tão afloradas”. Eberl falou que estava muito satisfeita com o relatório intermédio, que teve um tom novo e refletiu uma mudança de perspectiva, coisas as quais elas disse desejar.
Uma semana depois, quando o portal online alemão “Katholisch.de” lhe perguntou se tinha se decepcionado com o relatório final, ela respondeu: “Fiquei surpresa que o relatório intermédio fora alterado tanto assim pelas muitas intervenções que houve. Na primeira semana, os bispos de todo o mundo descreveram a vida em família de forma muito realista, mas na segunda semana tive a impressão de que a vida familiar, como ela realmente é, foi relegada a segundo plano em favor da questão: ‘O que a Igreja diz?’ Nesse sentido, sim, estou um pouco decepcionada”.
No entanto, a participante disse que ficou bastante impressionada com as palavras finais do papa.
“Ele nos incentivou a termos debates polêmicos. Em poucas palavras, a mensagem dele foi: ‘É claro que vocês podem altercarem-se. Isso não vai fazer a Igreja se desmoronar. Posso garantir”. Acho isso muito animador para o próximo ano, em que as conferências episcopais e as dioceses devem continuar trabalhando a partir dos resultados do Sínodo”.
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"É preciso libertar-se da “visão de túnel” quando se trata de discutir as famílias", diz cardeal austríaco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU