22 Outubro 2014
Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Direito da Unisinos, Wilson Engelmann sobe no palco para sua palestra acompanhado por uma bolsa de pano a tiracolo. É o “kit nano”, explica ele. Presente de seus alunos. De dentro, retira pouco a pouco diversos objetos. Embalagens dos mais variados tipos de detergentes, xampus, band-aids. Há ainda pomadas e creme para unha encravada. Não se trata de algum tipo de necessaire exótica; todos possuem nanopartículas em sua composição.
Ao ultrapassarmos o universo do micro para chegar ao nano, a pequenez infinitesimal fica difícil de ser visualizada mesmo mentalmente. “Aos que gostam de matemática, podemos dizer que uma partícula nano é calculada na base do 10-9”, esclarece o professor. Ao contrário do que pensa o senso comum, no entanto, os nanomateriais não são exclusivamente fabricados pela ciência humana. Também existem aqueles de origem natural, como o sal marinho ou a fuligem. Ainda assim, é com a emergência de uma sociedade tecnocientífica que a presença de nanopartículas em nossas vidas se tornou ainda mais presente. A singularidade – ou seja, a integração entre homem e tecnologia – está próxima. O que fazer a partir disso torna-se a grande questão de nossos tempos.
Com esta preocupação em mente, Engelmann ministrou, nesta terça-feira (21), a conferência As nanotecnologias como um exemplo de tecnociência e seus impactos. O evento fez parte das programações do XIV Simpósio Internacional IHU - Revoluções Tecnocientíficas, Culturas, Indivíduos e Sociedades. A modelagem da vida, do conhecimento e dos processos produtivos na tecnociência contemporânea, e ocorreu no Auditório Maurício Berni, no centro 4 da Unisinos. A palestra integrou ainda o XI Seminário Internacional Nanotecnologias, Sociedade e Meio Ambiente, organizado pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da Unisinos.
Na medida do nanômetro, diversos elementos com os quais temos contatos diários passam a exercer outras ações. Desta forma, a tecnologia passou a ser utilizada pelos mais diversos ramos da indústria, de cosméticos aos esportes e muito mais. “Nos bebedouros é utilizado o sulfato de titânio para prover ação bactericida. O mesmo acontece em alguns preservativos, que utilizam nanopartículas de prata para diminuir a contaminação”. No entanto, ainda que tamanha variedade de produtos já esteja disponível no mercado, o professor alerta: "Não temos uma legislação sobre nanotecnologia, mas já existem produtos assim no mercado. Precisamos aguardar um desastre para mudar isso?".
Atualmente existem dois projetos de lei envolvendo a temática tramitando no Congresso, ambos de autoria do deputado Sarney Filho. Eles versam sobre a necessidade de acesso à informação, e exigem – entre outras demandas – a rotulagem e identificação de todos os produtos com uso de nanotecnologia. Tal como o “T”, que indica o uso de produtos transgênicos.
“A nanotecnologia promete uma série de avanços e não somos contra esses avanços, assim como não somos contra os transgênicos. O que devemos ter em vista é a precaução. Todo produto tecnológico é potencialmente nocivo e cabe ao produtor provar a segurança do novo produto”, argumentou o deputado ao justificar o projeto – que ainda não tem data para votação. Ainda assim, Engelmann é reticente. “O processo legislativo é lento. Na área de tecnologia, quando a lei nasce, já surge ultrapassada.”
O professor menciona Umberto Galimberti, conferencista da noite do XIV Simpósio, para pensar a relação do homem com a técnica nas sociedades contemporâneas. “O autor se pergunta: será que devemos fazer algo, apenas porque somos tecnicamente capazes de fazê-lo?”. Esse é um dilema da tecnocultura, que impele o “progresso”, numa lógica desenvolvimentista, sem se preocupar com o outro, com o ambiente, com a coletividade.
Sem ferramentas jurídicas para nortear o uso destas tecnologias, a própria indústria dá indicativos de seus usos – um risco de grande insegurança. Para que o Direito não fique supérfluo, ele propõe: “É preciso promover a inovação no direito e do direito”. A primeira proposta versa sobre a possibilidade de que ele próprio se atualize. A segunda que o Direito se recontextualize, e busque no diálogo com outras ciências o pluralismo necessário para compreender e enfrentar os desafios que estão por vir.
Quem é Wilson Engelmann
Wilson Engelmann possui graduação, mestrado e doutorado em Direito pela Unisinos. Atualmente é professor na mesma universidade. Líder do Grupo de Pesquisa JUSNANO (CNPq/Unisinos), é ainda pesquisador do Latin American Nanotechnology & Society Network, no México. Organizou este ano o livro Responsabilidade Civil e Nanotecnologias (São Paulo: Atlas, 2014) e é autor das obras Direito natural, ética e hermenêutica (Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007), Para entender o princípio da igualdade (São Leopoldo: Sinodal, 2008) e Crítica ao positivismo jurídico: princípios, regras e o conceito de Direito (Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2001).
(Por Andriolli Costa)