Por: Jonas | 08 Outubro 2014
Refletindo sobre o tema da exclusão digital, a comunicadora social e jornalista Alba Fajardo considera que “são os atores da sociedade que podem provocar a discussão de interesses, visões e opções diferentes daqueles do interesse privado ou estatal. É a sociedade que pode vigiar e perguntar sobre os benefícios reais do desenvolvimento tecnológico. É ela quem pode repensar as propostas para que as medidas apresentadas, com o objetivo de superar tal exclusão, estejam de acordo com as realidades e necessidades sociais”. Seu artigo é publicado por Página/12, 07-10-2014. A tradução é do Cepat.
Eis o artigo.
Os países da América Latina deverão investir ao redor de 335.825 milhões de dólares, por ano e até 2020, para superar a exclusão digital em relação à Europa. Chegou a essa conclusão a Associação Ibero-Americana de Centros de Investigação e Empresas de Telecomunicações (Achiet), a partir de um estudo divulgado no ano passado e que deu lugar à assinatura de 15 acordos entre representantes de governos, autoridades reguladoras, empresas de telecomunicações, organismos internacionais e especialistas, por ocasião do Primeiro Congresso Regional de Telecomunicações, realizado no Panamá. Em maio deste ano, a Argentina foi sede de uma das reuniões sobre governança na Internet, no marco do encontro NetMundial que tratou do mesmo assunto e foi comemorado no Brasil. País este que, segundo Diariogol da Espanha, investiu vinte vezes mais em telecomunicações, no Mundial de Futebol, do que a Espanha investiu em 1982, quando foi anfitriã do mesmo evento, O que isso tem em comum?
O dito anterior mostra, de alguma forma, a “disposição” e a “tarefa” que “assumem” os países em investir em telecomunicações por interesses próprios e dissimilares, mas quase sempre marcados pelo discurso de superar a exclusão digital, ser inclusivos e aumentar o desenvolvimento. Discurso que está na gênese do termo. Embora já se houvesse socializado antes, o conceito de exclusão digital se formalizou na Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação, realizada em duas etapas e lugares: Genebra (2003) e em Tunísia (2005). Na então aprovada declaração de princípios, além de se aceitar a desigualdade existente entre países e sociedades em relação à revolução das tecnologias da informação, selou-se o compromisso de tornar “a exclusão digital em uma oportunidade digital”.
Antes deste evento, muitos países já haviam iniciado esforços para alcançar as condições da Sociedade da Informação, em cuja base está o desenvolvimento tecnológico. Em julho de 2000, alguns governos da América Latina assinaram a Declaração de Florianópolis, assumindo compromissos nesse sentido. Daí em diante, os países iniciaram uma espécie de “corrida” para alcançar os padrões necessários, com o objetivo de superar a exclusão digital. Uma exclusão que, além do mais, abarca o mundo todo, já que quando falamos de telecomunicações e do digital nos referimos à telefonia e banda larga, tanto fixa como móvel, ao espectro eletromagnético, à televisão digital, aos meios de comunicação e todas as estruturas necessárias para que isto funcione; antenas, redes, satélites, entre outros. Mas, também se faz referência à Sociedade da Informação, à chamada Governança em Internet, Cidades e Agendas Digitais. Em conclusão: não se trata apenas de uma discussão técnica e comercial, dada entre as empresas de telecomunicações e os Estados. Também é um debate onde a sociedade civil deve estar presente. Se não for assim, para que a conotação de “sociedade” e “governança” em todo este assunto?
Nesse sentido, o pesquisador argentino Guillermo Mastrini, docente da Universidade Nacional de Quilmes, ao falar em uma das versões da Cátedra Unesco de Comunicação, realizada na Pontifícia Universidade Javeriana da Colômbia, citou aos autores Jan van Cuilenburg e Denis McQuail, para destacar que “na realidade há três atores (...) o setor privado, com as empresas, o Estado e a sociedade civil. O que veem (os autores) rapidamente? Dizem: destes atores que seriam os potencialmente interessados na política de comunicação, à mesa de discussões, historicamente, sentam-se apenas dois. Há um ator que ficou fora da discussão: a sociedade civil”. Neste caso, está se falando diretamente do vínculo da cidadania com o Estado e as empresas, por meio das políticas públicas de comunicação.
E por que é importante que a sociedade civil participe da discussão sobre as telecomunicações, as tecnologias e os meios de comunicação, como pilares necessários para superar a exclusão digital? Precisamente porque são os atores da sociedade que podem provocar a discussão de interesses, visões e opções diferentes daqueles do interesse privado ou estatal. É a sociedade que pode vigiar e perguntar sobre os benefícios reais do desenvolvimento tecnológico. É ela quem pode repensar as propostas para que as medidas apresentadas, com o objetivo de superar tal exclusão, estejam de acordo com as realidades e necessidades sociais. O que adianta os governos repartirem computadores e tablets, as empresas expandirem sua estrutura, até mesmo que sejam feitas novas leis e políticas públicas, se a sociedade civil não é partícipe em todo este processo?
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Basta superar a exclusão digital? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU