29 Setembro 2014
O Papa Francisco lançou um apelo sincero a seus irmãos jesuítas de todo o mundo para “remarem junto” com ele, enquanto ele rema, com considerável empenho, na “barca de Pedro”, além de “rezarem bastante”, pois “a noite e o poder das trevas estão sempre próximos”.
O pontífice fez este pedido durante a cerimônia de ação de graças em Roma, no sábado (27 de setembro), véspera do 200º aniversário da restauração da Companhia de Jesus, ou “dos jesuítas”, como seus membros são conhecidos.
“O barco da Companhia de Jesus foi abalroado pelas ondas e não há surpresa alguma aqui. Até mesmo a barca de Pedro pode ser abalroada hoje. A noite e o poder das trevas estão sempre próximos. Cansa remar”, disse ele aos líderes da ordem religiosa presentes na cerimônia, entre estes o Superior Geral Adolfo Nicolás.
A reportagem é de Gerard O’Connell, publicada pela revista America, 27-09-2014. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
“Os jesuítas devem ser remadores especialistas e valorosos, então remem!”, disse o pontífice, citando a bula papal de restauração da Ordem. “Remem! Sejam fortes, mesmo com o vento contrário. Rememos a serviço da Igreja. Rememos juntos! Mas enquanto remamos – todos remamos, também o Papa rema na barca de Pedro –, devemos rezar tanto: ‘Senhor, salva-nos!’, ‘Senhor, salva o teu povo!’. O Senhor, mesmo se formos homens de pouca fé e pecadores, nos salvará. Esperemos no Senhor! Esperemos sempre no Senhor!”
Houve um silêncio total na igreja. Os jesuítas de todos os continentes e de muitos países que estavam lecionando, estudando ou trabalhando em Roma mostraram-se atentos ao que dizia o primeiro papa jesuíta na história da Igreja. Aqui o líder máximo se encontrava perante seus irmãos de Ordem religiosa pedindo seu apoio enquanto “remava” na barca de Pedro num momento muito importante, porém nada fácil, da história da Igreja.
O papa pediu apoio e oração de seus irmãos enquanto se esforça para governar a Igreja universal e reformar a Cúria Romana num momento nada fácil, que é a véspera de um Sínodo dos Bispos importantíssimo sobre a família, de um mundo turbulento e violento no qual, como ele mesmo disse, “pouco a pouco” a Terceira Guerra Mundial vai começando.
“Recordemo-nos da nossa história: à Companhia foi dada a graça não somente de acreditar no Senhor, mas também de sofrer por Ele”, disse o papa aos presentes em sua homilia na Igreja do Sagrado Nome de Jesus, mais conhecida como Chiesa del Gesù, no centro de Roma onde Santo Inácio morou por um tempo e foi enterrado.
O pontífice lembrou de como o Pe. Lorenzo Ricci, Superior Geral da Companhia de Jesus naqueles tempos “difíceis de perseguição” no final do século XVIII, encorajou os membros da Ordem a não colocarem-se na condição de se considerar vítimas diante de um carrasco. Em vez disso, Ricci exortou os jesuítas naqueles dias de grande sofrimento a “discernirem a vontade de Deus”, a “reconhecerem-se como pecadores e colocarem sua confiança somente em Jesus, que é a esperança” e que “lhes dá consolação”, e saberem que “é o amor que irá julgar a história, e que a esperança, mesmo nas trevas, é maior do que as nossas expectativas”.
O Papa Francisco relembrou a supressão da ordem religiosa em Portugal, nos territórios espanhóis, na França e em outros lugares no século XVIII e como as potências seculares – “as inimigas da Igreja”, como João Paulo II as chamou – tiveram sucesso em levar o Papa Clemente XIV a suprimir a Ordem. Ela só sobreviveu “sob um rei luterano” (na Prússia) e “sob um monarca ortodoxo” (na Rússia), disse.
Quarenta anos depois, no dia 7 de agosto de 1814, Pio VII, papa beneditino, em seu retorno a Roma vindo da França, onde testemunhou a Revolução Francesa e o reino de Napoleão, restaurou a Companhia para “ajudar, de forma adequada, nas necessidades espirituais do mundo cristão sem diferenciar povos ou nações”.
Na época de sua supressão, a Companhia de Jesus tinha 23 mil membros. Quando, porém, foi restaurada, contava com apenas 600 religiosos.
“Durante a supressão, os nossos irmãos jesuítas permaneceram fervorosos no Espírito e no serviço do Senhor, felizes na esperança, constantes na tribulação, perseverantes na oração” e “isso honra a Companhia”, falou o papa na homilia.
O papa jesuíta argentino recordou que quando Pio VII reestabeleceu a Ordem, esta se revestia de “coragem e humildade”, estando cheia de esperança, amor e criatividade apostólica, imediatamente se tornando “missionária” e se colocando à disposição da Sé Apostólica. O papa falou que a Ordem recomeçou o trabalho de “pregação, ensino, orientação espiritual, pesquisas científicas e ação social, missões e auxílio aos pobres, sofredores e marginalizados”.
Indo do passado ao presente, o Papa Francisco elogiou os jesuítas na atualidade porque estão “enfrentando, com inteligência e dedicação, o problema trágico dos refugiados e deslocados”, além de “se esforçarem, com discernimento, para integrar o serviço da fé com a promoção da justiça”.
Lembrou as “palavras proféticas” que ouviu “com meus próprios ouvidos” ditas pelo Papa Paulo VI, quando este falou à 32ª Congregação Geral dos Jesuítas (1974-1975): “Onde quer que na Igreja, mesmo nos campos mais difíceis e da primeira linha, nas encruzilhadas ideológicas, nas trincheiras sociais, existiu ou existe conflito entre as prementes exigências do homem e a mensagem do Evangelho, aí estiveram e estão os jesuítas”.
“Eu hoje confirmo o que ele disse naquela ocasião”, afirmou o Papa Francisco, indicando querer que os jesuítas continuem nesta estrada.
Lembrou também que, em 1814, quando a Ordem foi restaurada, eles eram um “pequeno rebanho”, mas, depois de suportarem a cruz, souberam como investir na grande missão de “levar a luz do Evangelho aos quatro cantos da terra”.
“Eis, pois, como devemos nos sentir hoje: de saída, em missão”, disse aos presentes na Chiesa del Gesù, numa mensagem que se destinou claramente aos mais de 17 mil companheiros jesuítas ao redor do mundo. É assim que ele está conduzindo o seu ministério como sucessor de São Pedro, é assim que ele quer que os demais vivam também.
O papa concluiu sua homilia recordando que a “identidade jesuíta é aquela de alguém que ama a Deus e que ama e serve a seus irmãos, mostrando pelo exemplo não só aquilo em que acredita, mas também aquilo pelo qual espera e quem é Aquele em quem depositou sua confiança”.
Após o papa terminar de falar, todos os jesuítas, liderados pelo Superior Geral, renovaram o voto de compromisso à missão e ao sucessor de São Pedro. O Pe. Nicolás trouxe, em seguida, uma urna com incenso e o voto dos jesuítas para com o papa, quem a colocou em frente da imagem da Madonna della Strada (Nossa Senhora do Caminho), padroeira da Companhia. Então, todos os presentes cantaram o Te Deum, hino solene da Igreja para ação de graças.
Ao final da cerimônia, Nicolás agradeceu ao papa – a quem chamou de “Irmão Francisco” – por estar com eles nesta celebração importante. Em seguida, os dois, que se conhecem há muitas décadas, se abraçaram calorosamente.
Veja também:
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Papa Francisco pede a companheiros jesuítas para “remarem juntos” com ele - Instituto Humanitas Unisinos - IHU