Por: Cesar Sanson | 12 Junho 2014
Professor da Unicamp lança livro em que questiona a formação de uma nova classe média no Brasil.
A tão conhecida pirâmide de renda brasileira mudou. Para muitos, a forma geométrica em que as classes sociais se encontram hoje em dia tem um formato de losango, onde a parte do meio é maior que a base. Grande parte da população ascendeu a partir de 2002, formando o que ficou conhecida como “nova classe média”.
A reportagem é de Bruno Pavan e publicada pelo Brasil de Fato, 11-06-2014.
O economista e professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Marcio Pochmann tem uma visão diferente do processo que ocorre no Brasil. Em sua nova obra O mito da grande classe média (Boitempo), lançada em um debate na Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Sociais da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP) na última terça-feira (10), ele rebate o pensamento de que o Brasil é um “país de classe média” e acredita que há uma polarização social.
“É um engano dizer que somos um país de classe média porque dá a impressão de que nossa sociedade está homogeneizada, quando o que existe é uma polarização ainda maior, um esvaziamento dos postos intermediários. O que aconteceu de 2002 pra cá foi uma recomposição da classe trabalhadora em novas bases de consumo”, analisou.
Nova política econômica na América do Sul
A década de 90 ficou muito marcada pelo neoliberalismo e sua política econômica austera por toda a América latina. A receita basicamente era a mesma para o Brasil e seus vizinhos: controle de inflação com juros altos e venda das empresas estatais para diminuir a participação do estad na economia.
No começo do século 21, porém, em meio a derrocada dessa política, os cidadãos mais afetados pelas sucessivas crises se viram para outro tipo de política econômica no continente que Pochmann chama de “anti-neoliberal”.
“O governo brasileiro consegue uma maioria política naqueles que foram ‘derrotados’ pelo período neoliberal, que são os trabalhadores, as micros e pequenas empresas e os agricultores familiares. Acontece que se precisou também do centro, do PMDB e com isso fica mais difícil fazer reformas profundas na estrutura como foi na Bolívia, no Equador e na Venezuela”, disse.
Ascensão com contradições
A entrada desse grande número de pessoas no mercado consumidor, porém, desperta muitas contradições no país. Pochmann acredita que o que aconteceu com a classe ascendente na época da ditadura militar, quando muitos saíram do campo e foram para as indústrias das grandes cidades, acontece hoje em dia.
“As pessoas que vinham do campo para trabalhar na Volkswagen, por exemplo, chegavam em cidades que não estavam preparadas para eles. Então muitos iam para as periferias onde não haviam serviços básicos como transporte público ou tratamento de esgoto. Hoje em dia ocorre o mesmo, o beneficiário do Minha Casa Minha Vida, apesar da conquista da casa própria, vive num lugar onde não existe nada. Nos finais de semana essas pessoas ficam sentadas na calçada porque não há o que fazer”, explicou.
Muitas dessas contradições na década de 1970, porém, foram capturadas pelas instituições de representações de interesses no Brasil que se fortaleceram e recriaram o sindicalismo e os movimentos estudantis mesmo na época da ditadura militar. Hoje, ao contrário, Pochmann acredita que existe um sentimento de falta de representatividade nessas pessoas.
“Dos 40 milhões que ascenderam, conseguiram casa, entrar na faculdade ou um emprego novo, poucos deles estão nas associações de amigos do bairro, centros acadêmicos ou sindicatos, que não conseguiram capturar essas contradições para ser reforçarem. Não sei esse problema está ligado as direções dos sindicatos e associações, que perderam a capacidade de entender essas pessoas, ou se são as próprias instituições que não estão sendo capazes de exercer essas funções”, criticou.
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“Vivemos hoje um processo de ascensão com muitas contradições”, diz Marcio Pochmann - Instituto Humanitas Unisinos - IHU