Por: Caroline | 11 Junho 2014
“Na hora de pensar os resultados da Cúpula do G77+China que será realizada na Bolívia devemos estar conscientes de que se estamos construindo uma transição pós-neoliberal, nossas Relações Internacionais também devem ser pós-neoliberais”, é o que afirma o pesquisador social Katu Arkonada, em artigo publicado por Rebelión, 10-06-2014. A tradução é do Cepat.
Eis o artigo.
Nos falta apenas a união para completar construção de nossa regeneração.
Simón Bolívar
“O mundo está ameaçado pela hegemonia do império norte-americano, que pretende acabar com este planeta. Apenas unidos, partindo de nossa consciência, de nossa coragem, de nossa vontade, poderemos conseguir o que Simón Bolívar, nosso libertador, chamava de “o equilíbrio do universo”, isto é, um mundo multipolar. O mundo aceita vários polos, e esse mundo está se levantando. Por isso nossa solidariedade com as lutas em qualquer parte deste mundo, com as lutas pela libertação e pela dignidade”, eterno comandante Hugo Chávez, Discurso na VII Cúpula da União Africana, República de Gâmbia, 01 de julho de 2006.
O grupo do G77+China, que atualmente conta com a participação de 133 países membros das Nações Unidas, celebra em 2014 seu 50º aniversário com a Bolívia e Evo Morales na Presidência da organização.
Nos 14 e 15 de junho irão se reunir, em Santa Cruz de la Sierra, representantes dos 133 países, entre eles cerca de 35 chefes de Estado da América Latina e Caribe, África e Ásia.
Cartografia geopolítica
Dentro do G77+China estão reunidos dois blocos de suma importância geopolítica, de um lado a ALBA com a participação confirmada de Raúl Castro (Cuba), Rafael Correa (Equador) e Nicolás Maduro (Venezuela) que configura-se como um apoio e solidariedade mais do que nunca imprescindíveis para a revolução bolivariana; e por outro lado o grupo denominado BRICS, no qual falta apenas a Rússia em um quarteto onde no qual estarão representantes de alto nível da China, Índia, África do Sul e Brasil.
O BRICS, que concentra atualmente 42% da população do planeta e mais de 20% do PIB mundial, está sendo decisivos na transição do mundo unipolar para o mundo multipolar no qual estamos imersos. Os últimos movimentos no tabuleiro político, o papel desempenhado na crise da Síria ou da Ucrânia, o recente acordo energético entre a China e a Rússia por 400 bilhões de dólares, assim como a potência econômica emergente de um Brasil sobre o que assenta a maior parte da Amazônia, são testemunho disso.
É importante o papel desempenhado pelo G77+China pois, após a Conferência de Bandung (Indonésia, 1955) onde se deu o encontro de 29 países da África e Ásia, muitos deles em processo de descolonização e independência, e que foi germe do nascimento do Movimento de Países Não Alinhados, não houve nenhuma outra tentativa de formar um grupo que gere um contrapeso para a hegemonia do Norte capitalista traduzida também em um domínio sobre o sistema de Nações Unidas, órgão que em algum momento deve ser reformado, ou melhor ainda, substituído por outro mais democrático.
Contribuição do G77
Dentro da história e das ações do G77+China, podemos destacar três grandes contribuições que estão intrinsecamente relacionadas com a Diplomacia dos Povos que está sendo desenvolvida no Estado Plurinacional da Bolívia no âmbito internacional em geral, e nas Nações Unidas em particular.
- Em 1974, quando se comemoravam 10 anos de sua criação, o G77 conseguiu que as Nações Unidas aprovasse a “Declaração sobre o estabelecimento de uma nova ordem econômica internacional” que devia estar embasada na equidade, igualdade, soberania, interdependência, interesse comum e na cooperação de todos os estados quaisquer que sejam seus sistemas econômicos e sociais. Declaração importantíssima, pois vinha a questionar o sistema capitalista como o único sistema econômico possível.
- Em 1986, se promulgava nas Nações Unidas a “Declaração sobre o direito ao desenvolvimento”, que defende o direito ao desenvolvimento dos países pobres e em vias de desenvolvimento, como elemento central junto aos direitos humanos. Esta declaração também faz referência à descolonização, a autodeterminação dos povos e uma reivindicação central dos países em desenvolvimento como é o reconhecimento da soberania plena dos povos sobre seus recursos naturais.
- Finalmente, nas diversas reuniões sobre o desenvolvimento e a mudança climática, o G77+China estabeleceu dois elementos fundamentais para abordar a crise climática que é parte da crise do capitalismo: o da responsabilidade comum, mas diferenciada entre os países do Norte e os do Sul; e a responsabilidade histórica que está muito relacionada à dívida climática que o Norte desenvolvido e capitalista estabeleceu com o Sul.
Geopolítica do Sul
Na hora de pensar os resultados da Cúpula do G77+China que será realizada na Bolívia e que, de alguma maneira, irá se refletir no documento final, devemos estar conscientes de que se estamos construindo uma transição pós-neoliberal, nossas Relações Internacionais também devem ser pós-neoliberais.
Em primeiro lugar, é necessário aprofundar as relações Sul-Sul, gerando uma desconexão política, econômica e de modelos de desenvolvimento com o Norte capitalista. O Comandante Chávez, ao assumir a presidência do Grupo dos 77 em janeiro de 2002, comparava o mundo (dividido artificialmente em vários mundos) com um Titanic, no qual pode haver passageiros de primeira ou segunda classe, mas se o barco se afunda, todos afundam com ele. Não podemos permitir que o capitalismo afunde este planeta arrastando ao fundo todos os povos do mundo.
Essas relações Sul-Sul devem também estar baseadas nos princípios da ALBA, devemos primar pela complementaridade e a solidariedade acima da competitividade. E para nos aprofundarmos nesses princípios deveríamos nos munir com uma ferramenta proposta por Chávez, em seu discurso de entrega da presidência do G77 em janeiro de 2003, o de um Fundo Humanitário Internacional, para combater realmente a pobreza, a fome, a desertificação, as doenças endêmicas; isto é, para combater a morte. Fundo que poderia ser financiado com uma porcentagem da dívida externa (ou eterna como dizia Fidel); outra porcentagem dos militares e um imposto mundial para as transações especulativas. O Banco do Sul deveria tornar-se um Banco Sul-Sul.
Outro pilar fundamental na própria história do G77 é o da descolonização, e nesse sentido é urgente dar resposta às situações neocoloniais que, no caso da América Latina, passa pela recuperação da soberania das Malvinas, Porto Rico, Guantánamo, ou resolver a situação do enclausuramento da Bolívia. A descolonização deve ser somada também a Interculturalidade, para disputar a hegemonia com capitalismo também no âmbito cultural.
E se falarmos de cultura, não podemos nos esquecer, ainda mais com tudo que está ocorrendo na Venezuela, da necessidade da disputa também no âmbito comunicativo. Ao terrorismo informativo deve ser combatido com a dinâmica de meios contra-hegemônicos do Sul e para o Sul, como o teleSUR ou HispanTv.
Finalmente, deveríamos nos aproximar do espírito da Declaração de Havana feita pela CELAC em 2014 declarando a América da Latina como Zona de Paz. Devemos impulsionar uma Geopolítica Sul-Sul da Paz, que passe pela desmilitarização de nossos países, que devem estar livres de bases militares estadunidenses assim como a rejeição à espionagem e a interferência em terceiros países.
Tudo isso na busca da justiça social, que é o caminho para a liberdade de nossos povos. Já o disse Chávez citando a Bolívar, em 2002, quando tomava posse da Presidência do Grupo dos 77: “Façamos triunfar a justiça e a liberdade triunfará”.
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Da Bolívia, Cúpula propõe pensar a geopolítica do sul - Instituto Humanitas Unisinos - IHU