16 Abril 2014
"Rumamos para um mundo vegetariano. Não creio que a escolha por essa modalidade de alimentação, cada vez mais frequente entre os jovens, seja um modismo. Penso que veio para ficar, vai ser uma transição lenta, duas gerações ao menos, mas já está acontecendo", escreve Mario Corso, psicanalista e membro da Associação Psicanalítica de Porto Alegre - APPOA, em artigo publicado pelo jornal Zero Hora, 15-04-2014.
Eis o artigo.
Uma maneira rápida de afundar uma reputação é fazer previsões. Só as cartomantes e assemelhados podem errar sistematicamente e seguir sendo ouvidos. Quem se calça na ciência é cobrado. Porém, como minha previsão é a longo prazo, meu risco é com meus netos. Poderei um dia ouvir: não é de hoje que o vovô diz bobagem!
Embora saibamos que a futurologia é o caminho do descrédito, ela segue nos fascinando. Poucas coisas magnetizam tanto quanto tentar adivinhar o que nos está reservado. Na mitologia clássica, os deuses tinham duas prerrogativas que não nos eram concedidas: a imortalidade e a antevisão do futuro. Por isso, as profecias são acompanhadas de uma neblina misteriosa, afinal, como entramos em seara divina, seu obscuro e impalpável simbolismo surge.
Mas vamos à minha investida nessa concorrida profissão de profeta: acredito que rumamos para um mundo vegetariano. Não creio que a escolha por essa modalidade de alimentação, cada vez mais frequente entre os jovens, seja um modismo. Penso que veio para ficar, vai ser uma transição lenta, duas gerações ao menos, mas já está acontecendo. Não teremos um mundo vegano, como quer a esquerda radical da tendência. Acredito numa vitória da ala social-democrata, numa aceitação de leite e ovos e talvez do consumo discreto, esporádico, de animais criados livres.
De onde tirei tal disparate, vão me perguntar meus conterrâneos de Passo Fundo, enquanto preparam um costelão. Simples, essa nova geração possui uma sensibilidade mais aguçada relativa aos animais e também é menos prisioneira da razão instrumental, pragmática, que imperou no século XX. Eles não admitem mais que os fins justifiquem os meios.
Conversando com os recém-conversos, vejo que seguem uma lógica: não querem compactuar com esse sistema movido à força do sofrimento animal. Seu protesto em ato é não comer carne. Muitos aderiram depois de ver vídeos que denunciam os maus-tratos impingidos aos animais durante seu crescimento e como são mortos. Admiro quem não abre mão de dialogar com sua consciência e toma decisões morais a partir disso. Creio que o primeiro embate deles será contra os animais criados confinados. Nas palavras deles, criamos Auschwitzs para o mundo animal. Para os vegetarianos a alimentação é um dilema ético.
Como que eu fico nessa? Ora, eu sou um vegetariano em processo. Já me ganharam na argumentação, mas a adaptação ao novo modelo vai demorar um tempo. Estou me acostumando. Lembro da piada do sujeito que toma seu uísque sem gelo dizendo ser ordens médicas. Interrogado pelo absurdo ele emenda: o doutor me proibiu de beber, mas resolvi começar aos poucos, já cortei o gelo!
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O futuro é vegetariano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU