18 Julho 2013
A comissão papal sobre o Banco do Vaticano poderia decidir que a instituição funciona bem, mas ainda assim questionar a sua necessidade. Nós não temos confiança de que a atual comissão tenha a competência ou a independência para responder a qualquer uma dessas questões.
Publicamos aqui o editorial do jornal National Catholic Reporter, 16-07-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
O Banco do Vaticano, oficialmente conhecido como o Instituto para as Obras de Religião, é marcado por escândalos e o é há anos. O Papa Bento XVI deu passos importantes para reformar o banco, como por exemplo, não por último, insistindo para que o Vaticano seguisse os padrões internacionais estabelecidos pela Moneyval, a agência europeia contra a lavagem de dinheiro. A Moneyval revisou os procedimentos financeiros vaticanos no ano passado e, em 2014, irá voltar a ver se as melhorias ordenadas foram feitas.
Por exemplo, a Moneyval insistiu que o Vaticano estabelecesse uma Autoridade de Informação Financeira independente, com o poder de investigar transações suspeitas. Essa agência é chefiada por René Brülhart, um advogado suíço altamente respeitado e especialista no campo, que, em maio, revelou mais de uma dezena de atividades suspeitas desde 2011. Esse é o verdadeiro progresso.
Na época de sua eleição, o Papa Francisco recebeu um claro mandato do Colégio dos Cardeais para levar a reforma adiante de forma mais rápida e intensa. Francisco disse que quer "permitir que os princípios evangélicos permeiem também as atividades econômicas e financeiras [da Igreja]".
Nós aplaudimos esses esforços e encorajamos um abrangente exame dos processos e práticas do banco vaticano.
A renúncia do diretor e do vice-diretor do banco vaticano e a prisão do Mons. Nunzio Scarano revelam a importância de uma limpeza rápida e eficiente. Mas obstáculos podem impedir essa limpeza.
Um caso em questão é a entrada de Carl Anderson no conselho leigo de supervisão do banco vaticano. Anderson, presidente dos Cavaleiros de Colombo, com sede nos Estados Unidos, herdou o seu assento em 2009, quando Virgil Dechant – o antecessor de Anderson como cavaleiro supremo – deixou o posto depois de nove anos no órgão. Os Cavaleiros têm um assento permanente nesse conselho?
Anderson usou os milhões de dólares dos Cavaleiros, gerados a partir de procedimentos de investimento do portfólio de seguros da organização fraterna, para aumentar a sua influência extraordinária em cada nível da burocracia vaticana. Pagando por praticamente tudo, das renovações de infraestrutura às limusines com chofer para prelados em visita, Anderson fez de si mesmo um homem do sistema vaticano. Ele atua em diversos outros conselhos pontifícios também. Também é bom observar que ele permaneceu em grande parte em silêncio ao longo das décadas de crise dos abusos sexuais por parte do clero – dificilmente o tipo de liderança corajosa de que uma operação bancária corrupta precisa.
A criação, no dia 26 de junho, por parte de Francisco, de uma comissão para revisar as atividades e a missão do banco vaticano deveria ter sido um grande salto na reforma. Infelizmente, não foi.
O que deveria ser uma comissão independente é, ao invés, um grupo de membros do Vaticano. A comissão – um bibliotecário, um advogado canônico, um ex-diplomata vaticano, um burocrata e um ex-embaixador norte-americano junto ao Vaticano – dificilmente parecem ter a expertise necessária para desenvolver um plano de reforma para uma instituição financeira global. Noticiou-se que todos os cinco têm contas pessoais no banco vaticano. Todos estão bem abrigados na cultura do Vaticano, o que é um problema, tanto quanto a corrupção.
Nós também questionamos a nomeação de Mary Ann Glendon para a nova comissão. Ela não apenas não tem nenhuma expertise óbvia em questões bancárias, mas também foi uma defensora aguerrida do notório predador sexual e fraudador financeiro padre Marcial Maciel Degollado, fundador da Legião de Cristo. Em 2002, Glendon chamou Maciel de um homem de "santidade radiante".
Com mais de um bilhão de católicos em todo o mundo, Francisco deveria identificar especialistas de boa fé com real independência. Essa é uma mudança significativa que nós apoiaríamos.
O porta-voz vaticano, padre Federico Lombardi, disse que o papa quer que a comissão "levante uma questão mais ampla, que é a relação entre essa instituição (…) e a missão da Igreja".
A comissão poderia decidir que o banco funciona bem, mas ainda assim questionar a sua necessidade. "Essas são duas questões em separado", disse Lombardi.
Nós não temos confiança de que a atual comissão tenha a competência ou a independência para responder a qualquer uma dessas questões.
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''Falta independência na supervisão do banco vaticano'' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU