Por: Cesar Sanson | 10 Julho 2013
Depois de dois anos do início das obras da usina de Belo Monte, em Altamira, no Pará e municípios vizinhos, o Programa Integrado de Saúde Indígena, criado como condicionante para a Licença Ambiental do empreendimento, não saiu do papel e a concessionária Norte Energia S.A, não contratou empresa para executar as ações.
A reportagem é do portal do Instituto Socioambiental – ISA, 09-07-2013.
Dados oficiais do Distrito de Saúde Especial Indígena de Altamira (DSEI Altamira-PA), demonstram situação crítica nos índices de mortalidade, desnutrição infantil e diarreia aguda em crianças indígenas das aldeias afetadas pela usina de Belo Monte. A falta de atendimento nas aldeias fez saltar em 2000 % o número de atendimentos na cidade, entre 2009 e 2013.
“Tudo não passou de promessas. A saúde dos índios do Xingu só piorou. A reestruturação do atendimento à saúde indígena está apenas no papel”, diz o presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena (CONDIS), Joaquim Curuaia.
Em 2010, a saúde dos indígenas do Xingu já era alarmante, se comparada à realidade brasileira e a taxa de mortalidade infantil era de 83%, quatro vezes maior que a média nacional. Em 2012, nove em cada dez crianças indígenas apresentaram diarreia aguda por mais de uma vez. Mais de 14% das crianças até cinco anos que vivem nas 36 aldeias consideradas afetadas por Belo Monte estão com peso considerado baixo ou muito baixo para sua idade.
“Em 10 dias em campo, em aldeias na Terra Indígena (TI) Trincheira do Bacajá, da etnia Xikrin, duas crianças morreram, uma por diarreia e outra com pneumonia. Como pode, em 2013, crianças indígenas ainda morrerem desta maneira?”, questiona a antropóloga Thais Mantovaneli, que realiza estudos em uma das quatro TIs atingidas pela usina.
Reestruturação não aconteceu
Em fevereiro de 2010, a primeira licença ambiental de Belo Monte estipulava como uma das principais condicionantes para a viabilidade da obra “a restruturação do atendimento à saúde indígena pelo DSEI na região de Altamira”. O prazo para a implantação era até a realização do leilão da obra em abril do mesmo ano. Nessa data a Norte Energia S.A. tornou-se a empresa responsável por implementar Belo Monte. Desde então, é urgente reorganizar a prestação do serviço de saúde indígena diante do passivo histórico local.
Em maio de 2011, o Ministério da Saúde encaminhou à Norte Energia um conjunto de ações emergenciais que deveria ser adotado para garantir a emissão da licença seguinte (de instalação), de implantação dos canteiros de obras. As obras foram aceleradas, diferentemente das obrigações com os povos afetados, que não saíram do papel.
“Sem atendimento básico de qualidade nas aldeias, os índios se obrigam a vir para a cidade para tratar muitos problemas que poderiam ser facilmente resolvidos se na aldeia tivesse pessoal de saúde bem preparado, boa tecnologia de comunicação para suporte à distância e medicação adequada”, comenta Douglas Rodrigues, chefe da Unidade de Saúde e Meio Ambiente da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), que trabalha há mais de 20 anos com populações na Amazônia.
Em 2011, a Casa de Saúde Indígena (Casai) de Altamira registrou 546 atendimentos. No ano seguinte, foram 13,5 mil, com praticamente o mesmo número de profissionais, segundo o DSEI.
Prazos não são cumpridos
As condicionantes socioambientais impostas pela Fundação Nacional do Índio (Funai) não estão sendo atendidas no prazo adequado e o projeto Básico Ambiental do Componente Indígena (PBA-CI) sequer foi contratado, depois de dois anos de emitida a licença de instalação da usina. As autorizações ambientais continuam vigentes.
“É inadmissível a inexistência de sanções administrativas apesar do grau de inadimplência em questões tão delicadas como o atendimento à saúde indígena”, afirma Biviany Rojas do ISA. “O governo federal é responsável integralmente por essa situação. Encarregado da fiscalização da obra, o governo federal é o mesmo que garante seu financiamento pelo BNDES, mas também é o dono de 49,9% das ações da empresa concessionária da usina. Não existe justificativa para que o governo federal permita que a situação chegue ao ponto crítico em que se encontra hoje” .
As iniciativas estabelecidas pelo Ministério da Saúde pretendiam fortalecer o atendimento básico nas aldeias, diminuir e especializar o atendimento na cidade e desestimular o deslocamento de famílias indígenas inteiras na procura por atendimento. Entre as ações estavam: a construção de postos de saúde nas aldeias, a implantação de alas especiais para indígenas nos dois hospitais públicos de Altamira e a construção de cinco polos de atendimento. Até hoje, nada foi executado e os indígenas cada dia dependem mais do atendimento na cidade.
Faltam informações sobre os indicadores
A reportagem do ISA procurou o coordenador do DSEI em Altamira, Lindomar Carneiro, para comentar os problemas de saúde indígena na região. Carneiro afirmou que aguarda autorização do Ministério da Saúde para poder se pronunciar e fornecer os indicadores de saúde solicitados.
O ISA também solicitou à Norte Energia entrevista com o superintendente para questões indígenas da empresa ou esclarecimentos sobre os atrasos na implementação do PBA-CI, mas a empresa afirmou que o responsável estava sem agenda nesta semana e não poderia responder às demandas solicitadas até a data de publicação desta matéria.
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Nas aldeias atingidas por Belo Monte, o atendimento à saúde não saiu do papel - Instituto Humanitas Unisinos - IHU