17 Junho 2013
Às 12h30min da última sexta-feira, na Sala dos Papas do Palácio Apostólico Vaticano, o Santo Padre Francisco recebeu em audiência a comunidade de escritores da revista jesuíta italiana La Civiltà Cattolica. Antes da audiência, o papa se reuniu brevemente com o diretor da revista, padre Antonio Spadaro.
A texto do discurso, em italiano, é publicado pela Sala de Imprensa do Vaticano, 14-06-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Caros amigos no Senhor,
Estou contente por encontrar vocês, escritores, a sua comunidade completa, as irmãs e os adeptos à administração da Casa. Os jesuítas da Civiltà Cattolica, desde 1850, desenvolvem um trabalho que tem uma ligação particular com o papa e a Sé Apostólica. Os meus antecessores, encontrando-lhes em audiência, reconheceram várias vezes como esse vínculo é uma característica essencial da sua revista. Hoje, eu gostaria de lhes sugerir três palavras que podem ajudá-los no seu compromisso.
A primeira é o diálogo. Vocês desenvolvem um importante serviço cultural. Inicialmente, a atitude e o estilo da Civiltà Cattolica foram combativos e muitas vezes asperamente polêmicos, em sintonia com o clima geral da época. Percorrendo os 163 anos da revista, destaca-se uma rica variedade de posições, devidas tanto à mudança das circunstâncias históricas, quanto às personalidades dos escritores individuais. A sua fidelidade à Igreja ainda requer que vocês sejam duros contra as hipocrisias, fruto de um coração fechado, doente. Duros contra essa doença.
Mas a sua tarefa principal não é construir muros, mas sim pontes; é estabelecer um diálogo com todas as pessoas, mesmo com aquelas que não compartilham a fé cristã, mas "cultivam os altos valores do espírito humano", e até mesmo com "aqueles que se opõem à Igreja e de várias maneiras a perseguem" (Gaudium et Spes, 92). São tantas as questões humanas a se discutir e compartilhar, e no diálogo sempre é possível se aproximar da verdade, que é dom de Deus, e se enriquecer reciprocamente.
Dialogar significa estar convencido de que o outro tem algo de bom a dizer, abrir espaço para o seu ponto de vista, para a sua opinião, para as suas propostas, sem cair, obviamente, no relativismo. E, para dialogar, é necessário baixar as defesas e abrir as portas. Continuem o diálogo com as instituições culturais, sociais, políticas, também para oferecer a sua contribuição para a formação de cidadãos que tragam no coração o bem de todos e trabalhem pelo bem comum. A "civilização católica" é a civilização do amor, da misericórdia, da fé.
A segunda palavra é discernimento. A tarefa de vocês é reunir e expressar as expectativas, os desejos, as alegrias e os dramas do nosso tempo, e oferecer os elementos para uma leitura da realidade à luz do Evangelho. As grandes perguntas espirituais hoje são mais vivas do que nunca hoje, mas há a necessidade de que alguém as interprete e as entenda. Com inteligência humilde e aberta "busquem e encontrem Deus em todas as coisas", como escrevia Santo Inácio. Deus está agindo na vida de cada pessoa e na cultura: o Espírito sopra onde quer. Tentem descobrir o que Deus tem feito e como continuará a sua obra.
Um tesouro dos jesuítas é justamente o discernimento espiritual, que tenta reconhecer a presença do Espírito de Deus na realidade humana e cultural, a semente já plantada da sua presença nos acontecimentos, nas sensibilidades, nos desejos, nas tensões profundas dos corações e dos contextos sociais, culturais e espirituais.
Lembro-me de uma coisa que Rahner dizia: o jesuíta é um especialista no discernimento no campo de Deus e também no campo do diabo. Não é preciso ter medo de prosseguir no discernimento para encontrar a verdade. Quando eu li essas observações de Rahner, elas me chamaram bastante a atenção.
E para buscar a Deus em todas as coisas, em todos os campos do saber, da arte, da ciência, da vida política, social e econômica são necessários estudo, sensibilidade, experiência. Algumas das matérias que vocês tratam podem até não ter relação explícita com uma perspectiva cristã, mas são importantes para captar o modo pelo qual as pessoas compreendem a si mesmas e o mundo que as circunda. Que a observação informativa de vocês seja ampla, objetiva e oportuna.
Também é necessário ter uma atenção particular com relação à verdade, à bondade e à beleza de Deus, que sempre devem ser consideradas em conjunto, e são preciosas aliadas no empenho em defesa da dignidade do ser humano, na construção de uma convivência pacífica e na proteção cuidadosa da criação. A partir dessa atenção nasce o juízo sereno, sincero e forte acerca dos acontecimentos, iluminado por Cristo. Grandes figuras como Matteo Ricci são um modelo disso.
Tudo isso requer que se mantenham abertos o coração e a mente, evitando a doença espiritual da autorreferencialidade. A Igreja, quando se torna autorreferencial, também adoece, envelhece. Que o nosso olhar, bem fixo em Cristo, seja profético e dinâmico para o futuro: desse modo, vocês sempre permanecerão jovens e audazes na leitura dos acontecimentos!
A terceira palavra é fronteira. A missão de uma revista de cultura como a La Civiltà Cattolica entra no debate cultural contemporâneo e propõe, de modo sério e ao mesmo tempo acessível, a visão que vem da fé cristã. A fratura entre Evangelho e cultura é, sem dúvida, um drama (cf. Evangelii Nuntiandi, 20). Vocês são chamados a fazer a sua contribuição para sanar essa fratura que também passa pelo coração de cada um de vocês e dos seus leitores. Esse ministério é típico da missão da Companhia de Jesus.
Acompanhem, com as suas reflexões e os seus aprofundamentos, os processos culturais e sociais, e aqueles que estão vivendo transições difíceis, encarregando-se também dos conflitos. O lugar próprio de vocês são as fronteiras. Esse é o lugar dos jesuítas. O que Paulo VI, retomado por Bento XVI, disse sobre a Companhia de Jesus, vale de modo particular para vocês hoje: "Onde quer que, na Igreja, também nos campos mais difíceis e de vanguarda, nas encruzilhadas das ideologias e nas trincheiras sociais, tenha havido e haja o confronto entre as exigências ardentes do ser humano e a mensagem perene do Evangelho, lá estiveram e estão presentes os jesuítas".
Por favor, sejam homens de fronteira, com aquela capacidade que vem de Deus (cf. 2Cor 3, 6). Mas não caiam na tentação de domesticar as fronteiras: deve-se ir rumo às fronteiras e não trazer as fronteiras para casa para envernizá-las um pouco e domesticá-las. No mundo de hoje, sujeito a rápidas mudanças e agitado por questões de grande relevância para a vida da fé, é urgente um corajoso empenho para educar a uma fé convicta e madura, capaz de dar sentido à vida e de oferecer respostas convincentes aos que estão em busca de Deus. Trata-se de apoiar a ação da Igreja em todos os campos da sua missão. A La Civiltà Cattolica neste ano se renovou: ela assumiu uma nova veste gráfica, pode ser lida também em versão digital e chega aos seus leitores também nas redes sociais. Também essas são fronteiras nas quais vocês são chamados a agir. Prossigam nesse caminho!
Caros Padres, vejo entre vocês jovens, menos jovens e idosos. A sua revista é única no seu gênero, que nasce de uma comunidade de vida e de estudos; como em um coro bem unido, cada um deve ter a sua voz e pô-la em harmonia com a dos outros. Força, caros irmãos! Estou certo de que posso contar com vocês. Enquanto lhes confio a Nossa Senhora da Estrada, concedo a vocês, redatores, colaboradores e irmãs, assim como a todos os leitores da revista, a minha Bênção.
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Diálogo, discernimento e novas fronteiras: os desafios de Francisco aos jesuítas da Civiltà Cattolica - Instituto Humanitas Unisinos - IHU