15 Junho 2013
Um relatório recém-divulgado destaca as ameaças contínuas contra a Campanha Católica para o Desenvolvimento Humano (CCHD, na sigla em inglês), a principal iniciativa antipobreza da Igreja dos EUA, por parte de grupos e prelados conservadores que se opõem a dar dinheiro para organizações que não estejam em plena conformidade com o ensino da Igreja.
A reportagem é de Tom Roberts, publicada no sítio National Catholic Reporter, 12-06-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Os ataques "culpados por associação" são obra principalmente da American Life League, de acordo com o relatório divulgado nessa terça-feira pelo grupo Faith in Public Life (disponível aqui, em inglês). Em 2009, a liga, com sede em Stafford, Virgínia, organizou uma coalizão de mais de duas dezenas de organizações, muitas delas de extrema direita no espectro político e religioso, para fazer campanha contra o programa antipobreza, segundo o relatório.
A coligação, chamada "Reform CCHD Now", emprega táticas da "era McCarthy", enviando seus "relatórios e vídeos em estilo de denúncia" para todos os bispos dos EUA e pedindo boicotes às coletas das paróquias que apoiem o programa antipobreza, escreve John Gehring, diretor do programa católico do Faith in Public Life e autor do relatório.
Os bispos dos EUA lançaram a Campanha Católica para o Desenvolvimento Humano em 1969, como parte de uma "Cruzada Nacional Católica Contra a Pobreza". Ela sempre contou com um apoio significativo dos fiéis católicos. No segundo ano da sua existência, ela arrecadou mais de 8 milhões de dólares, "a maior coleta única da Igreja na época". Em meados dos anos 1990, a arrecadação ultrapassou 13 milhões de dólares.
Um dos primeiros grandes opositores da campanha foi William E. Simon, um católico conservador e ex-secretário do Tesouro do governo Nixon. Ele criticou a campanha em uma carta de 1989 aos Cavaleiros de Malta, uma influente organização católica, chamando-a de um "mecanismo de financiamento do ativismo político da esquerda radical".
O falecido padre Richard John Neuhaus, renomado pensador conservador, e outros proeminentes escritores católicos conservadores pediram diversas vezes que os bispos eliminassem a campanha.
Por outro lado, a campanha recebeu o aval do Papa João Paulo II durante a sua visita de 1979, quando ele elogiou o seu esforço para enfrentar "as causas da pobreza e não apenas os maléficos efeitos da injustiça".
Em anos mais recentes, o foco dos opositores passou da política da campanha para a vasta gama de organizações não religiosas que ela financia, examinando as suas atividades diante de qualquer indício de apoio ao aborto, ao casamento entre pessoas do mesmo sexo ou a outras questões que passaram a dominar as discussões em torno da identidade católica.
O relatório do Faith in Public Life se intitula 'Be Not Afraid?': Guilt by Association, Catholic McCarthyism and Growing Threats to the U.S. Bishops' Anti-Poverty Mission ['Não tenham medo?': Culpa por associação, o macarthismo católico e as crescentes ameaças à missão antipobreza dos bispos norte-americanos]. Ele assume um significado ainda maior com uma impressionante lista de apoiadores católicos, incluindo organizações de liderança de religiosos e religiosas; várias grandes organizações de justiça social; nove bispos eméritos, incluindo dois ex-presidentes da Conferência dos Bispos dos EUA; os presidentes da Sociedade Teológica Católica dos Estados Unidos e da Academia de Teólogos Hispânicos Católicos dos Estados Unidos; Stephen Schneck, diretor do Institute for Policy Research and Catholic Studies da Universidade Católica dos Estados Unidos; e mais de duas dezenas de outros indivíduos e grupos.
Desde a sua criação, a campanha distribuiu mais de 280 milhões de dólares para mais de 7.800 projetos comunitários de baixa renda, segundo o relatório. Entre as suas doações nos últimos anos encontram-se:
• A campanha ajudou trabalhadores rurais latino-americanos e haitianos na Flórida em seus esforços para negociar melhores salários e melhores condições de trabalho com grandes redes de fast-food.
• No Texas, a campanha ajudou uma organização que trabalha para melhorar a habitação, educação e o trabalho de treinamento para membros de baixa renda.
• Os bispos aprovaram um milhão de dólares em doações especiais "para mobilizar os católicos a apoiar a aprovação de uma reforma imigratória abrangente".
Os ataques da American Life League e da sua coalizão, que se intensificaram nos últimos anos, têm variado entre críticas ao cardeal de Boston, Sean O'Malley, pela sua presença no funeral do senador Ted Kennedy, e acusações contra John Carr, diretor do Departamento de Justiça, Paz e Desenvolvimento Humano dos bispos dos EUA há mais de 20 anos.
Neste último caso, a liga diz que Carr fez parte de "um padrão sistemático de cooperação com o mal", porque uma vez ele foi membro do conselho do Center for Community Change, uma organização que, segundo a liga, apoia o direito ao aborto e ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, segundo o relatório.
As acusações são infundadas, segundo o relatório, e Dom William Murphy, bispo de Rockville Centre, Nova York, "descreveu a campanha difamatória contra Carr como 'comentários tristes, muito tristes sobre a honestidade de algumas pessoas nesses grupos de pressão'".
Os críticos da campanha afirmam que os bispos deveriam proibir o que dinheiro vá para qualquer grupo que não adote o ensino católico em todas as suas atividades, uma exigência de restringiria severamente o trabalho de combate à pobreza, de acordo com os envolvidos na campanha. De fato, essa exigência estreitaria significativamente as regras conhecidas como "diretrizes Krol", propostas pelo falecido cardeal John Krol, no início dos anos 1970, quando ele era presidente da Conferência dos Bispos.
As diretrizes foram elaboradas depois que algumas pessoas reclamaram que as contribuições da campanha iam para "organizações que participam em programas de aborto e de controle de natalidade", uma afirmação considerada sem mérito. Krol decidiu que uma organização não poderia receber o dinheiro se o seu principal objetivo fosse contra o ensino católico.
"No entanto, se o objetivo principal de um programa estivesse alinhado com o ensino da Igreja, ele poderia receber os recursos da campanha – mesmo que um projeto tangencial não estivesse de acordo com a doutrina moral católica", diz o relatório.
O relatório de 37 páginas inclui uma grande variedade de exemplos e três casos de estudo de ataques por parte da coalizão anti-CCHD com base naqueles que poderiam ser considerados "projetos tangenciais" de um grupo de acordo com as regras de Krol.
Um antigo receptor dos fundos da Campanha Católica para o Desenvolvimento Humano é o Projeto Land Stewardship, uma organização com sede em Minneapolis que treina novos agricultores e defensores da agricultura local sustentável.
A American Life League compilou um dos seus dossiês sobre o projeto e o enviou ao bispo e às autoridades locais da Conferência dos Bispos dos EUA em Washington. No verão passado, o Projeto Land Stewardship ficou sabendo que perderia a concessão de 48.000 dólares que lhe tinha sido atribuída se não encerrasse com a sua participação em duas organizações: o Conselho de Organizações Sem Fins Lucrativos de Minnesota e o TakeAction Minnesota. Entre as muitas atividades desenvolvidas em uma série de questões de justiça social, as duas organizações haviam se posicionado a favor do casamento entre pessoas do mesmo sexo.
O Projeto Land Stewardship nunca tomou posição a respeito nem trabalhou na iniciativa do plebiscito em Minnesota em 2012 para restringir o casamento a casais de sexo oposto. Após consulta com os membros do conselho, o Projeto Land Stewardship decidiu que "renunciar à sua adesão aos dois grupos prejudicaria a sua eficácia como grupo de defesa em todo o Estado". Ele perdeu a sua concessão, mas as doações – incluindo a de um católico que doou um cheque no valor de 25.000 dólares – mais do que compensou a perda.
Durante o ano passado, cinco afiliados da Fundação Gamaliel, "uma das maiores redes nacionais de lideranças comunitárias religiosas", perdeu os fundos da campanha, e, nos últimos anos, oito dioceses católicas perderam a coleta anual da campanha nas paróquias.
"Em um momento em que a pobreza está crescendo e as pessoas estão sofrendo, não devemos nos afastar do nosso compromisso de ajudar os pobres", disse o Dom Joseph Fiorenza, arcebispo emérito da arquidiocese de Galveston-Houston, citado no relatório.
Fiorenza, ex-presidente da Conferência dos Bispos, disse que "a identidade católica é muito mais ampla do que a oposição ao aborto e ao casamento entre pessoas do mesmo sexo. A identidade católica é um compromisso de viver o Evangelho como Jesus o proclamou, e isso deve incluir um compromisso com aqueles que vivem na pobreza".
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Ataques conservadores ameaçam campanha antipobreza dos bispos dos EUA - Instituto Humanitas Unisinos - IHU