12 Junho 2013
Francisco e Napolitano, em seu recente encontro, se libertaram de hábitos antiquados, tanto em sentido físico quanto em sentido metafórico.
A análise é Alberto Melloni, historiador da Igreja, professor da Universidade de Modena-Reggio Emilia e diretor da Fundação João XXIII de Ciências Religiosas de Bolonha. O artigo foi publicado no jornal Corriere della Sera, 10-06-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Os encontros entre o presidente da República italiana e o papa são bons por definição. Boas são as relações diplomáticas, boa é a condição dos cidadãos católicos que, em uma sociedade pluralista, conseguem ser uma e outra coisa sem segundas intenções. Isso não quer dizer que, em todos os encontros, haja peculiaridades: e isso ocorreu no sábado em um encontro em que Francisco e Napolitano se libertaram de hábitos antiquados, tanto em sentido físico, quanto em sentido metafórico.
O papa falou com o seu estilo aparentemente simples. Francisco sabe que Bertone, liquidado o ruinismo, havia assumido a exclusividade das relações com a centro-direita. Ele sabe que, na Conferência Episcopal Italiana (CEI), alguns haviam se adaptado, alguns haviam sabiamente aprendido a imitar os gestos e os lábios de Giorgio Napolitano, e alguns haviam resistido à avocação. Ele sabe que essas tensões antes do conclave eram reguladas muitas vezes com golpes baixos, nomeações e compromissos dos quais ele tem um inventário.
E, enquanto se espera que ele substitua um secretário de Estado quase octogenário, Francisco confirmou uma mudança de rota radical: as relações políticas não "voltam" para a CEI, mas "vão" para os bispos, aos quais ele pede que se comportem não como titulares de uma negociação de poder, mas como bispos, padres e partes de uma sociedade à qual, há décadas, as Igrejas fornecem mais repetidores espertos do que consciências formadas no plano espiritual. Com um dano – o presidente da República observou com tato e franqueza – que faz parte da crise do país e com remédios que se inscrevem na esperança de um ressurgimento civil.
Francisco, por outro lado, viu ao vivo de onde deriva essa tendência na semana da eleição ao Quirinal [residência do presidente italiano]. Naqueles dias, alguns paramanipuladores "católicos" haviam aludido a alguns candidatos (especialmente Giuliano Amato e Romano Prodi) como se fossem portadores de dúvidas e de friezas vaticanas. Uma mentira: porque a Santa Sé certamente não queria interferir e teria visto com prazer como presidente outro estadista de nível europeu.
A lipotimia do Partido Democrático convenceu Napolitano a uma reeleição que o Papa Francisco, em um telefonema não ritual, elogiou como ato de "heroicismo" (sic). Mas o final feliz dessa história lembrou a todos que, se a Igreja não recuperar autoridade espiritual, ela corre o risco de ser usada. E modular-se à estatura pastoral do primaz da Itália é a árdua tarefa que Francisco deu aos bispos e aos fiéis.
Resta no pano de fundo das relações Itália-Santa Sé de amanhã a questão da Constituição. Na carta em vigor, o catolicismo organizado havia se espelhado e engajado de modo total: com a sua universidade, com os seus consagrados, com os seus sindicalistas, políticos, com as suas hierarquias, passados do despreparo e da desconfiança à adesão.
Foi a Constituição (citada na Concordata) que fidelizou bispos e fiéis cheios de fascismo clerical à democracia republicana e à sociedade pluralista: e sem essa adesão tanto a democracia quanto o pluralismo teriam sido inferiores. Quando Francisco fala de uma "exemplaridade" italiana, talvez ele também se refira a isso.
Na revisão da Constituição iniciada agora, o catolicismo (e não só ele) está presente com "engenheiros" de orientação diferente. Há uma autoridade vaticana como o presidente emérito do Tribunal Constitucional, Cesare Mirabelli, conselheiro geral do Governatorato; há vários juristas católicos. Mas, por causa das fases evocadas antes, não há um senso conjunto da urgência histórica.
Fazer da Carta o sismógrafo "do que as pessoas nos pedem" fissura a fidelização democrática e pluralista, que, para a Igreja de Pio XII, era um problema e, para a de Francisco, um valor. Com relação a isso, Itália e Santa Sé, pode-se apostar, estarão atentas. E as relações continuarão sendo "boas".
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
As boas relações e a mudança de rota. Artigo de Alberto Melloni - Instituto Humanitas Unisinos - IHU