11 Mai 2013
Tarso Genro, governador do Rio Grande do Sul, "parece adepto daquele outro ditado “amigos, amigos, negócios a parte”. Segundo ele, o Rio Grande do Sul tem o dever de estabelecer relações com quaisquer empresas, em função de seu projeto regional de desenvolvimento, citando como exemplo a ser seguido os Estados Unidos “ que também violaram resoluções da ONU, na guerra do Iraque e nem por isso suas empresas envolvidas nessa ação deixaram de ser parceiras”, escreve Marino Boeira, professor universitário, em artigo publicado por Sul21, 11-05-2013.
Eis o artigo.
Existem vários ditos populares que se prestam a uma analogia com o que o Governador Tarso Genro fez na sua visita à Palestina e Israel. Os mais adequados seriam: “acender uma vela a Deus e outra ao Diabo” e “dar uma no cravo e outra na ferradura”.
Explicando as analogias: o Governador agradou os palestinos fazendo a doação de 11,5 toneladas de arroz à Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados Palestinos, destinadas a ajudar a matar a fome de um povo oprimido por uma força de ocupação estrangeira e agradou, senão a todos os israelenses, pelo menos as suas classes dirigentes, negociando uma parceria entre a fábrica de armamentos Elbit e o Pólo Aeroespacial do Rio Grande do Sul.
O site Opera Mundi informou, comentando as ações de Tarso, que a Elbit colaborou na construção do muro que segrega os territórios palestinos, além de fornecer equipamentos de segurança para as colônias judaicas consideradas ilegais pelas Nações Unidas, faturando cerca de 2 milhões de dólares ao dia com os contratos que detêm nessas atividades.
Segundo a mesma fonte, a ação da Elbit já provoca reações em países governados por partidos que não podem ser acusados de ser contra os interesses de Israel. O governo da Noruega, por exemplo, obrigou seus fundos públicos a se livrarem de todas as ações da Elbit que tivessem em suas carteiras. O mesmo procedimento deve ser tomado também pela Alemanha e Holanda.
Vale lembrar que há alguns meses atrás, ao se solidarizar com o povo palestino, o Governador condenou, durante o Fórum Social Mundial Palestina Livre, em Porto Alegre, o expansionismo israelense, merecendo na ocasião críticas ferozes dos representantes dos interesses de Israel na mídia brasileira. O cronista Reinaldo Azevedo, um dos mais extremados, chegou a dizer na Revista Veja que “de maneira clara, aberta e deliberada, Tarso está investindo dinheiro público num evento que apóia ações terroristas contra um país com o qual o Brasil mantém relações diplomáticas.”
O Governador, porém, parece adepto daquele outro ditado “amigos, amigos, negócios a parte”. Segundo ele, o Rio Grande do Sul tem o dever de estabelecer relações com quaisquer empresas, em função de seu projeto regional de desenvolvimento, citando como exemplo a ser seguido os Estados Unidos “ que também violaram resoluções da ONU, na guerra do Iraque e nem por isso suas empresas envolvidas nessa ação deixaram de ser parceiras”.
O pragmatismo de Tarso certamente vai receber muitos aplausos, principalmente daqueles que advogam o primado dos negócios sobre a política e algumas poucas críticas dos “ingênuos” que ainda defendem a supremacia da ética em todas as relações, principalmente naquelas que envolvam opressores e oprimidos como ocorre na Palestina.
No após guerra, a opressão de Israel sobre a Palestina só encontra paralelo no sistema de apartheid da África do Sul. Naquele caso, a maioria das nações civilizadas do mundo decretou um boicote ao seu governo racista. Uma das poucas exceções foi a Suíça, que durante os anos oitenta, quando a repressão e a violações dos direitos humanos alcançavam o seu ápice, mais intensificou seu comércio com o governo sul-africano. A justificativa das autoridades suíças foi que as leis do país defendiam acima de tudo a liberdade comercial.
Além da Suíça, a África do Sul só encontrava apoio nos governos de Reagan, nos Estados Unidos, de Margareth Tatcher, na Inglaterra e surpreendentemente no governo de Israel , que permaneceu fiel ao regime de Pretória até o seu fim, fornecendo armas e ajudando no seu programa militar nuclear. Em abril de 1975, o então ministro da Defesa, Shimon Perez, depois presidente israelense, assinou um acordo de segurança entre os dois países. Um ano mais tarde, o primeiro ministro sul-africano, Balthazar Vorster, antigo simpatizante nazista, foi recebido com honras em Israel.
Para quem julga um excesso a comparação entre a África do Sul e Israel é interessante lembrar como o ex Presidente dos Estados Unidos, Jimmy Carter, também prêmio Nobel da Paz em seu livro “Palestina: Paz. Não Apartheid” descrevia a situação na Palestina: “Um sistema de apartheid, com dois povos ocupando a mesma terra, mas completamente separados um do outro, sendo os israelenses totalmente dominantes e privando os palestinos de seus direitos humanos básicos, com o pretexto de combater a violência”. Dizendo que o sistema israelense é, em muitos casos, mais opressivo do que foi o regime sul-africano, Carter faz uma distinção entre os dois modelos de “apartheid”: o da África do Sul seria motivado por questões raciais e o de Israel pelo desejo de ocupar as terras dos palestinos.
Aqueles, como nós, que votaram no projeto de governo de Tarso Genro, só podem aplaudir suas preocupações com o desenvolvimento econômico do Rio Grande do Sul, mas também não podem deixar de criticar quando elas se sobrepõem a um valor maior que é a solidariedade intransigente e permanente a um povo que luta par sobreviver com dignidade, como fazem os palestinos, em suas terras ocupadas por Israel.
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Tarso e os ditos populares - Instituto Humanitas Unisinos - IHU