29 Abril 2013
Faleceu aos 97 anos Aloysius Jin Luxian, jesuíta, lendário bispo de Xangai. Figura-chave na atormentada história do catolicismo chinês das últimas décadas.
A reportagem é de Gianni Valente, publicada no sítio Vatican Insider, 27-04-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
As doenças da velhice o haviam levado para mais perto da morte do que antes. Em outras ocasiões, as suas "recuperações" no hospital – todos o sabiam – eram uma forma de se desvincular das pressões do poder ou evitar encontros indesejados. Desta vez, no entanto, o câncer de pâncreas que lhe foi diagnosticado nos últimos meses deu razão ao seu corpo fraco quase centenário.
E agora a sua longa vida terrena se oferece como um formidável roteiro para percorrer novamente, desde as vicissitudes mais íntimas e dolorosas, a aventura sem igual vivida pela Igreja da China nos últimos 60 anos.
Como escreveu o missionário Giancarlo Politi em um livro seu sobre as figuras mais importantes da Igreja chinesa, "Jin é uma personalidade excepcional, inteligente e esperta, cheio de iniciativas e dotado de uma simpatia cativante, profundo conhecedor do regime e dos mecanismos que o sustentam . Um tipo desencantado, mas... um homem da Igreja".
Ele nasceu em junho de 1916 em um vilarejo cristão em Pudong, onde à época havia plantações de arroz e hoje há os arranha-céus da "nova" Xangai. Ele havia sido batizado em um antigo pagode que os missionários haviam readaptado como igreja. A sua vocação jesuíta tinha florescido à sombra de Santo Inácio e de Matteo Ricci em uma Igreja de fortes traços coloniais, onde os superiores não falavam mandarim.
Durante os seus anos de estudo, na Europa recém-saída da guerra – primeiro na França, depois dois anos em Roma, preparando na Gregoriana a sua tese sobre a Trindade –, também havia se tornado amigo do padre Henri de Lubac, antes que sobre este e os seus companheiros jesuítas de Fourvière se abatesse as interdições do Santo Ofício. Na Cidade Eterna, entre 1948 e 1950, ele também conhecera o jovem Giulio Andreotti. A sua amizade durou até o fim.
Quando Mao chegou ao poder, Jin foi chamado novamente ao seu país. Os comunistas oi apontaram como um espião enviado por Pio XII para organizar a contrarrevolução. Mas as suas ideias sobre a necessária "descolonização" da Igreja chinesa também não agradaram o núncio vaticano Riberi, que em breve seria expulso pelos maoístas.
Em 1951, Jin tornou-se reitor do seminário de Xangai, enquanto se intensificava a expulsão dos missionários estrangeiros e começava a soprar fortemente o vento da perseguição. Ele também participou das iniciativas "subterrâneas" inspiradas pelo bispo Ignatius Kung Pin-mei para amortecer os efeitos da propaganda comunista entre os fiéis. Depois, na noite de 8 de setembro de 1955, Jin também foi preso na operação que decapitou a diocese, levando para a prisão o bispo e os seus colaboradores mais próximos. Ele dizia ter aprendido uma lição com essa história: "Nunca, nunca mais fazer coisas secretas com os comunistas".
O seu julgamento ocorreu em 1960. Jin foi condenado a 18 anos de prisão, mais nove de reabilitação. Passou de um centro de reabilitação para outro e também conheceu a experiência dos campos de trabalho em Henan, enquanto, com a Revolução Cultural, a perseguição contra os cristãos também enfurecia.
Em 1973, quando foi mandado para colaborar com o escritório de traduções do governo, começaram contra ele acusações difamatórias, como a de ter traído os seus companheiros ou de ter uma filha secreta "escondida" sabe-se lá como nos Estados Unidos.
Em 1982, na onda da "abertura" inaugurada por Deng, Jin, então com 66 anos, aceitou se tornar bispo de Xangai, com o reconhecimento do governo, mas sem o do papa, enquanto o velho Kung Pin-mei ainda estava sob prisão domiciliar. Aderiu desse modo à linha controversa daqueles pastores que, na época, optaram por receber a ordenação episcopal ilegítima imposta pelo regime com a intenção de favorecer a retomada da vida eclesial e a possibilidade de administrar os sacramentos necessários para a vida dos fiéis, à luz do sol.
Nos anos seguintes, enquanto outros bispos consagrados sem o consentimento do papa invocavam e obtinham do outro lado do Tibre o reconhecimento canônico, Jin postergava, enquanto os seus detratores o acusavam de ser um bispo cismático conivente com o regime, e a Santa Sé reconhecia como legítimo sucessor de Kung Pin-mei outro jesuíta, Giuseppe Fan, consagrado clandestinamente.
A escolha de permanecer em uma condição de irregularidade canônica, criticada também em Roma, respondia a um cálculo humano: "O meu dever de padre", justificava-se o bispo-jesuíta no livro escrito sobre ele pelo jornalista francês Dorian Malovic, "foi o de convencer as autoridades políticas chineses da minha boa-fé, da minha identidade profunda de patriota e do caráter inofensivo da minha fé católica".
A sua condição ambígua sempre foi alvo de inúmeros detratores. Mas o tempo percorrido revelou os corações em favor do velho patriarca. Xangai foi a primeira diocese chinesa a reinserir na liturgia as orações pelo papa. Lá, a partir dos anos 1980, o seminário e toda a estrutura diocesano floresceram novamente. E ele nunca assinou nenhum documento de apoio à "independência" da Igreja chinesa.
Por nada menos do que duas vezes, em 2005 e depois novamente em 2012, graças ao seu singular sensus fidei e à sua sabedoria pastoral, Jin também havia conseguido ordenar dois jovens bispos em Xangai com o consentimento paralelo da Santa Sé e do governo chinês. Em ambos os casos, a intenção era garantir em Xangai um pastor que pudesse um dia liderar a diocese, sucedendo assim tanto a Jin quanto ao idoso e doente bispo "clandestino" Fan, com o reconhecimento unânime tanto das comunidades "oficiais", quando das "clandestinas". Em 2005, no contexto da eleição do primeiro jovem bispo, também para Jin havia chegado de Roma a plena legitimação canônica da sua consagração episcopal. Jin havia sido oficialmente reconhecido por Roma como bispo "coadjutor" de Xangai.
Nos dois casos, as estratégias tecidas por Jin para assegurar em Xangai uma sucessão episcopal reconhecida tanto em Roma quanto em Pequim foram marcadas por incidentes de percurso. O jovem bispo auxiliar ordenado em 2005 renunciou ao cargo por motivos pessoais. Enquanto isso, o bispo Matteo Ma Daqin, ordenado bispo em junho de 2012 – e que agora, para a Santa Sé, é o legítimo sucessor de Jin –, desde o dia da sua ordenação, está confinado pelo regime no seminário de Xangai por ter expressado a intenção de abandonar os cargos até então ocupados na Associação Patriótica.
Outros terão que se ocupar, agora, com os pontos críticos da sua sucessão. Sem poder contar mais com a astúcia evangélica de Jin. Ele dizia sobre si mesmo: "Eu poderia ter sido um herói anticomunista no exterior, mas não na China. Só Deus sabe onde eu sempre coloquei a minha fidelidade, e o Seu julgamento está no meu coração mais do que a justiça dos homens".
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A opção de Aloysius Jin Luxian, o patriarca chinês - Instituto Humanitas Unisinos - IHU