16 Abril 2013
Em um ambiente de inflação alta e economia enfraquecida, usar os gastos das famílias como alavanca para fazer o Produto Interno Bruto (PIB) crescer e desonerar setores de bens de consumo final é um modelo esgotado. Uma nova agenda deve ser colocada no lugar, na qual se possa deixar mais competitiva as bases da cadeia produtiva. A opinião é de Pedro Passos, um dos fundadores da fabricante de cosméticos Natura e presidente do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi).
A entrevista é de Cynthia Malta e publicada pelo jornal Valor, 17-04-2013.
Passos espera que o Banco Central dê uma sinalização hoje sobre como vai tratar a inflação, mas acredita que um eventual aumento na taxa básica de juros não será muito forte.
Eis a entrevista.
O juro deve subir nesta semana para combater a inflação?
Tema quente [risos]. De fato, o que preocupa muito é a inflação. A política monetária deve ser utilizada e o BC tem todas as condições de saber a intensidade. O grande progresso que tivemos foi sair de um patamar muito alto de juros para um mais razoável. É uma vitória do país. Mas eu não gostaria que tivéssemos que dar um solavanco muito forte. Os benefícios de uma política [de juro] próxima dos padrões internacionais ainda não foi capturada na totalidade. Temos que agir, mas com parcimônia.
Aumentar 0,25% ou 0,5% na taxa básica de juros afetaria os negócios das empresas neste ano?
Acho que o mais importante é o sinal. E combinado a uma política monetária deveríamos ter uma política fiscal, para evitar que a política monetária fosse o único instrumento a ser usado. Temos uma agenda nova a ser tratada, muito importante. É difícil dizer se um aumento de 0,25% a 0,5% produz efeitos imediatos na economia, é uma sinalização, mais do que tudo. A gente sabe que os movimentos das taxas de juros demoram um certo tempo para serem percebidos pela economia.
Se a taxa subir, o efeito chegaria em dezembro de 2013?
O efeito será nas expectativas. Você vai cancelar um investimento, pois o juro subiu? Acho pouco provável nos padrões que a gente opera no Brasil. Mas depende do que o BC quer sinalizar. Se a pancada for forte, é o caso de avaliar [o investimento].
O governo tem feito desonerações setoriais, mas a economia não cresce. Por quê?
Às vezes eu me faço essa mesma pergunta [risos]. Tem uma agenda nova que o país precisa enfrentar. Acredito que algumas medidas são na direção correta. Por exemplo, redução da taxa de juros, esforço para reduzir o custo da energia, muito importante para toda a economia. A desoneração de folha de pagamento, transferindo o custo desse tributo para o faturamento, foi medida positiva, pois equaliza com o produto importado. Tudo na direção correta. O problema na agenda central é discutir como aumentar a produtividade do país e reduzir o custo de forma sistêmica. E não vamos conseguir fazer essa agenda com desonerações setoriais.
O senhor pode explicar?
O modelo de estímulo ao consumo, via crédito ao consumidor, e a incorporação da nova classe média ao mercado consumidor foi ótimo. Mas isso está chegando ao limite. Precisamos de uma poupança interna maior, formação de capital fixo maior e aí temos dificuldade. Como aumentar o investimento privado e o público, que não decola na velocidade desejada? O país precisa enfrentar essa agenda: aumentar investimento para ficar mais competitivo, reduzindo custos.
O cenário interno vem combinado a uma economia lá fora que não está muito compradora...
A economia lá fora não está muito compradora e está bastante exportadora. Boa parte do crescimento do consumo tem sido abastecido por importações. Tivemos crescimento de mercado sem crescimento da produção interna.
Qual é a sua projeção de PIB e inflação para este ano?
Nós temos partido de uma expansão do PIB em torno de 2,5%, mas podemos ter um número inferior ou superior. Acho 3,5% muito otimista. Temos inflação, temos que mudar a agenda. A inflação ficaria entre 5,5% a 6%. Não há nada que se possa fazer de curto prazo para fazer uma desinflação rápida. Teria que dar um tranco, um juro mais agressivo. Mas não é razoável que se faça isso. Teremos que conviver com uma travessia.
E em 2014?
Eu trabalho com um cenário de expansão do PIB entre 2,5% e 3%. E espero uma inflação caindo, mas não é uma inflação que chegue rapidamente ao centro da meta, mas uma queda lenta. O ano de 2014 é ano eleitoral. É difícil o governo tomar medidas daqui para frente.
O governo vinha apostando no consumo das famílias para fazer a economia crescer. Dá tempo de trocar o modelo até 2014?
O aumento real da renda da população é um ativo que o país deveria preservar. A nossa posição no Iedi não é fazer recessão para resolver o problema, mas aumentar a produtividade.
Como se aumenta a produtividade?
Educação, muita educação, investimento, desburocratização, tirar entraves para o ambiente de negócios. Deveríamos desonerar as matérias-primas que abastecem as cadeias produtivas.
O senhor teria um exemplo?
Hoje a indústria de cosméticos, o setor de embalagens, é importante. Todos os plásticos, precisamos ter preço internacional e não temos. Se o plástico está mais caro, todo o produto que vem depois, vai ficar mais caro. Aço, energia, vários insumos básicos devem ser avaliados. Vamos analisar se determinado setor precisa de mais investimento em inovação, desoneração. Temos que garantir que não vamos matar determinada indústria com abertura à importação. O Brasil gasta a pouca bala que tem na agulha em produto final. Se você centrar a ação em inovação, produtividade no início das cadeias, você dá chance a mais setores.
A ideia é mudar o eixo da discussão?
É mudar o eixo, sair do consumo final e ir para a base da indústria. Não dá para abandonar os estímulos que estão sendo feitos, mas repriorizar as bases das cadeias produtivas.
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Modelo de crescimento está esgotado, diz presidente do IEDI - Instituto Humanitas Unisinos - IHU