24 Março 2013
Aumentar o desemprego. Por mais que pareça cruel, essa é a proposta de alguns economistas para combater a inflação que persiste em um nível elevado e se tornou um dos piores problemas para o governo. Com a falta de mão de obra qualificada no mercado, os empresários disputam funcionários. As ofertas de salários mais altos se refletem imediatamente no custo dos produtos e serviços. A área econômica do governo ainda tem que lidar com novas pressões, como os aumentos futuros de tarifas de ônibus, pedágios, medicamentos, alimentos, revisões na conta de energia elétrica e mais alta nos preços dos serviços. Sem contar que esfriaria uma economia praticamente estagnada, que cresceu apenas 0,9% no ano passado, reduzindo ainda mais a já baixa projeção para expansão deste ano de 3%, às vésperas de ano eleitoral.
A reportagem é de Gabriela Valente e Eliane Oliveira e publicada pelo jornal O Globo, 25-03-2013.
Para os economistas que defendem um freio na economia e queda do nível de emprego como receita para conter a inflação, aumentar os juros seria o caminho mais curto para isso. Essa proposta, entretanto, ganhou um opositor influente: Antonio Delfim Netto, ex-ministro da Fazenda, da Agricultura e do Planejamento nas décadas de 70 e 80 e um dos gurus da equipe econômica da presidente Dilma Rousseff. Para ele, o Brasil vive um “processo civilizatório” de inclusão social, com aumento de renda. E, na sua visão, o controle da inflação tem de ser feito sem afetar essas conquistas.
"A empregada doméstica virou manicure ou foi trabalhar num call center. Agora, ela toma banho com sabonete Dove. A proposta desses ‘gênios’ é fazer com que ela volte a usar sabão de coco aumentando os juros", afirma Delfim, para quem a saída para a economia é promover reformas estruturais que passem pelo aumento da educação do trabalhador.
Na opinião do economista Ilan Goldfajn, ex-diretor de política monetária do Banco Central e economista-chefe do Itaú, para resolver o problema da inflação há uma solução boa, uma ruim e outra de curto prazo. A melhor saída seria aumentar a produtividade. Para isso ocorrer, o caminho é longo. A pior opção seria repetir os erros do passado e deixar a inflação subir para corroer os salários. O remédio imediato seria aumentar os juros.
"A inflação não cai num passe de mágica. Não cai porque o Banco Central resolve falar mais duro. Cai com o encontro do crescimento da oferta com o crescimento da demanda. É preciso fazer escolhas. Não dá para fazer omeletes sem quebrar os ovos", alertou Goldfajn.
Salário cresce e produção cai
A tese de aumento dos juros é também defendida por outro ex-diretor da autoridade monetária Alexandre Schwartsman: "A saída é frear a economia. É demitir mesmo", resumiu.
O dado mais recente de desemprego, calculado pelo IBGE, mostra que o desemprego caiu ao menor nível já visto em um mês de janeiro: 5,4%. Como de costume, ele é um pouco maior que em dezembro, quando há muita contratação de trabalhadores temporários.
A indústria é um dos setores que tem evitado demitir. Dispensar um funcionário é caro. Além disso, a expectativa é que com a aceleração da economia em 2013 seria preciso contratar empregados. Nos últimos 12 meses, a folha de pagamento real da indústria cresceu 4,1%, de acordo com o IBGE. Esse aumento de custo não representou alta de produção. Pelo contrário. A alta dos salários veio acompanhada de redução de horas trabalhadas, que mostraram uma queda de 1,9% no mesmo período. Já o emprego não refletiu imediatamente essa produtividade menor. O número de empregados caiu num ritmo menor que a produção: 1,4%. Ou seja, os funcionários do setor trabalharam menos horas e produziram menos.
Segundo o economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Rogério César Souza, para não repassar as despesas com reajustes salariais para os preços, as indústrias são obrigadas a reduzir margens de lucro, o que desestimula o investimento: "O grande problema é que a redução das margens de lucro das indústrias inibe novos investimentos".
Para o professor da Unicamp e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Júlio Gomes de Almeida, nem sempre é possível para a empresa segurar os aumentos salariais encolhendo sua margem de lucro. Por isso, ele acredita que a pressão dos reajustes sobre a inflação continuará por pelo menos mais um ano, principalmente no setor de serviços.
"Os grandes aumentos ocorrem no setor de serviços e uma das principais razões é o crescimento do poder de renda da população", acrescentou.
Serviços sobem 9%
Já o especialista em mercado de trabalho e professor da PUC/Rio, José Márcio Camargo, lembrou que, enquanto os custos com serviços em geral têm subido algo em torno de 9 %, as despesas industriais com pagamento de pessoal crescem 10% ao ano. Assim, o risco de alta na inflação, devido a pressões nos custos das indústrias é alto e permanecerá por um bom tempo.
"O que impede repasses maiores aos preços é a concorrência com os importados. Isso está destruindo a indústria. Os serviços têm tradicionalmente baixa produtividade. A indústria é dinâmica e mais produtiva".
Para ele, subir os juros não vai fazer a economia crescer menos, por que já ela está totalmente estagnada.
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Delfim ataca ''gênios'' dos juros altos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU