Por: André | 15 Março 2013
“Quando penso nele como arcebispo de Buenos Aires, me vêm à mente muitas imagens nas quais o vejo sempre no meio das pessoas”, afirma Nora Beatriz Kviatkovski, RJM, em seu testemunho sobre a convivência com o arcebispo de Buenos Aires e atual papa Francisco. Ela é argentina e mestra de noviças da Comunidade Jesus-Maria, em Bogotá, Colômbia. A tradução é do Cepat.
Eis o testemunho.
Pediram-me que, como argentina, desse meu testemunho sobre o cardeal Jorge Mario Bergoglio, desde ontem [quarta-feira, 13] papa Francisco. Não vou falar dele como jesuíta porque creio que isso corresponde aos jesuítas argentinos que viveram e trabalharam com ele. Somente desejo compartilhar o que vivi quando fui membro da Arquidiocese de Buenos Aires.
Quero começar dizendo que para os que tivemos a oportunidade de conhecê-lo ele é simplesmente Jorge. Assim se apresentava quando (recordo um dia em que precisava da sua assinatura para uma carta de pedido à Adveniat ele telefonou para a minha casa solicitando alguns dados... tocou o telefone e disse que quem estava falando era o Jorge. Evidentemente, respondi: mas que Jorge? Jorge Bergoglio, respondeu). Não era seu costume apresentar-se com títulos como doutor, padre, monsenhor ou sua excelência, etc. Simplesmente Jorge...
Intuo que tenha herdado a sua simplicidade e austeridade dessa família de imigrantes italianos na qual nasceu há 76 anos, em um dos 100 bairros portenhos, Villa Devoto.
Quando penso nele como arcebispo de Buenos Aires, me vêm à mente muitas imagens nas quais o vejo sempre no meio das pessoas. Nunca o vi com guarda-costas pessoal, nem com motoristas. Em geral se deslocava por meio do transporte público tanto para visitar sua família como para realizar uma visita pastoral ou simplesmente para substituir um sacerdote em alguma eucaristia dominical. E chegava, algumas vezes no meio do barro ou da poeira da terra, saudando com um beijo as senhoras... conversando sobre futebol com as crianças e os jovens.
Particularmente, recordo a noite crítica de 19 de dezembro de 2001 quando, como povo argentino, saímos às ruas para manifestar a nossa indignação contra a gestão do ex-presidente De la Rúa e nos reunimos na Praça de Maio; Bergoglio também estava ali como um cidadão a mais. Também o lembro acompanhando, no bairro Once, os familiares dos centenas de jovens que morreram no acidente da danceteria Cromagnon e, recentemente, com as famílias do acidente fatal de trens. Tenho imagens dele ouvindo-o e consolando as mães das vítimas da droga e da violência.
Amigos que são sacerdotes do clero de Buenos Aires comentaram que em cada oportunidade que necessitavam falar com ele, imediatamente abria um espaço na sua agenda e dedicava o tempo necessário para escutá-los, assim como também proporcionava oportunidades de descanso oferecendo-se ele mesmo para substituí-lo nas eucaristias, caso fosse necessário. Nestes últimos anos impulsionou o compromisso dos sacerdotes jovens com a pastoral urbana, em especial a das favelas e dos bairros populares.
As pessoas mais próximas sempre o destacaram como um homem de grande austeridade e simplicidade de vida. Também posso dizer que deixou transparecer uma grande sensibilidade espiritual, identificando-se com o povo simples. Promoveu e fomentou, pessoalmente, as diversas manifestações de devoção popular. Cada ano participou das Peregrinações Juvenis ao Santuário da Virgem de Luján, que reunia milhares de fiéis. Todos os 07 de agosto acompanhava os milhares de peregrinos ao Santuário de San Cayetano, orando e pedindo pelo pão e pelo trabalho. Ano após ano, no estádio do Boca Junior, incentivou a realização e presidiu a eucaristia para as crianças. Não se cansou de convidar os católicos para que sejam missionários e saiam às ruas para anunciar a mensagem de Jesus.
Vi-o próximo e amigo de rabinos e pastores de Igrejas cristãs, com os quais frequentemente se reunia para compartilhar, conversar e criar espaços comuns de oração e de ações concretas a favor dos mais desfavorecidos.
Sua parcimônia e timidez não eram um obstáculo para se mostrar atento e próximo às pessoas, em especial os mais pobres.
Sim, é verdade, era muito pouco propenso a dar entrevistas a jornalistas e não lembro de muitas entrevistas coletivas.
Falava pouco, mas era muito claro e direto. Suas homilias e cartas sempre eram baseadas no Evangelho e tinham uma clara opção pelos mais pobres. Nunca lhe tremeu a voz para clamar contra as desigualdades no país. Bergoglio comparou pobreza e violação dos direitos humanos e não duvidou em criticar diretamente os diversos Governos por não impedirem o aumento da pobreza, situação que considera “imoral, injusta e ilegítima”, ao ocorrer em um país que possui as condições econômicas necessárias para evitar esses danos.
Para concluir, sobre o Arcebispo de Buenos Aires posso dizer que foi, sobretudo, um “pastor” que colocou a arquidiocese portenha em estado de “missão” e exortou os argentinos a não permanecerem fechados nas sacristias, mas a saírem ao encontro dos mais necessitados, tanto material como espiritualmente. Sem dúvida, o que mais aprecio nele são os gestos populares, próximos e humanos, como foi nesta quarta-feira o gesto de pedir às pessoas que orem a Deus para que o abençoe, antes de dar a sua bênção a todas as nações.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Francisco, um papa chamado Jorge - Instituto Humanitas Unisinos - IHU