Por: Cesar Sanson | 04 Março 2013
"O Cimi compreende que a defesa feita pelos advogados do fazendeiro tem o objetivo de despolitizar o conflito, tratando a morte de Denilson como uma "fatalidade", um crime comum, tirando-o da dimensão de crime contra os direitos humanos". O texto integra a nota sobre o assassinato do Guarani Kaiowá Denilson Barbosa e as investigações divulgada em seu sítio, 05-03-2013.
Eis a nota.
O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) vem a público se manifestar sobre a morte do indígena Guarani-Kaiowá Denilson Barbosa, de 15 anos, brutalmente assassinado na noite do dia 16 de fevereiro de 2013 pelo proprietário da fazenda Santa Helena, Orlandino Gonçalves Carneiro, réu confesso, na área que incide sobre território reivindicado pelos indígenas como tekoha Pindo Roky.
O Cimi apoia a reinvindicação do Conselho da Aty Guasu (grande assembleia Guarani e Kaiowá) de que o Governo Federal deve implementar, de forma imediata, um programa de segurança nas comunidades que estão em luta pela demarcação das terras, dentre elas a Tey'ikue, que ocupa a área da fazenda onde Denilson foi morto. De acordo com os relatos das lideranças indígenas, ocorreram dois ataques de fazendeiros e pistoleiros desde o dia 18, quando houve a retomada da fazenda pelos Guarani e Kaiowá.
Reforçamos também a urgência de que as investigações que envolvem o caso sejam imediatamente assumidas pela Polícia Federal, a exemplo das investigações do assassinato de Nisio Gomes, em novembro de 2011. Lideranças indígenas do Tey'ikue e do Conselho do Aty Guasu posicionaram-se publicamente exigindo o deslocamento da competência das investigações da Polícia Civil para a Polícia Federal, preocupados com o comprometimento da polícia estadual com os fazendeiros da região.
Também apoiamos a reinvindicação dos indígenas sobre a necessidade de que sejam indicados novos delegados federais para assumir o caso, em substituição aos que atuam na região, uma vez que estes foram denunciados pelos indígenas em carta endereçada ao Governo Federal por uma atuação "declaradamente anti-indígena" e preconceituosa.
As contradições e divergências existentes entre os depoimentos do fazendeiro Orlandino e dos dois indígenas, que também foram vítimas dos disparos e que presenciaram o assassinato do adolescente Denilson, reforçam ainda mais a versão de que o crime foi doloso. A comunidade, portanto, refuta a versão de que o fazendeiro, naquela noite de 16 de fevereiro, teria atirado da varanda de sua casa na direção do criadouro de peixes porque ouviu barulho e os latidos dos cães. A distância da varanda da casa até o local onde Denilson foi morto é de pelo menos 400 metros. A pergunta que deve ser respondida é como um senhor de 61 anos de idade, durante a noite, portanto no escuro, e a mais de 400 metros acertou um tiro na cabeça do adolescente? O Cimi confia plenamente na versão dada pelos indígenas e reafirma se tratar de um caso de homicídio com fortes traços de execução.
Em seu relato, Orlandino negou a participação de outras pessoas no crime, contradizendo o depoimento das duas testemunhas que viram Denilson ser assassinado, onde apontaram a participação de três pessoas no homicídio. Para o Cimi, ao omitir esta informação, Orlandino estaria tentando descaracterizar a prática de 'segurança'/pistolagem da área, recorrente nas áreas de conflito Guarani e Kaiowá, que já resultaram em incontáveis ataques a acampamentos e aldeias, e pessoas feridas, torturadas, desaparecidas e mortas.
O Cimi compreende que a defesa feita pelos advogados do fazendeiro tem o objetivo de despolitizar o conflito, tratando a morte de Denilson como uma "fatalidade", um crime comum, tirando-o da dimensão de crime contra os direitos humanos. É importante enfatizar que as áreas do entorno das reservas ocupadas por fazendas foram estudadas nos levantamentos feitos pelo Grupo Técnico (GT) de Identificação e Delimitação da Terra Indígena Dourados-Amambaipeguá, cujo relatório ainda está sob avaliação da Fundação Nacional do Índio (Funai) e desde então, segundo relatos das famílias do tekoha Tey'ikue, onde vivia Denilson, os conflitos com o fazendeiro Orlandino se acirraram. Trata-se, portanto, de uma área de conflito, fruto de um processo histórico de confinamento - e das consequências geradas por ele - sofrido pelos indígenas Guarani e Kaiowá do estado, e não de algo que, conforme declarou à imprensa uma das advogadas do réu "poderia ter acontecido com qualquer outra pessoa".
Por isso, vimos a público declarar nossa solidariedade ao povo Guarani-Kaiowá na sua luta pela garantia do direito a terra e por justiça, e conclamamos a sociedade para que acompanhe com atenção a apuração de mais este assassinato. Não podemos permitir que assassinos de indígenas fiquem impunes. Denilson foi covardemente assassinado, seus familiares estão inconformados, sua comunidade clama por justiça.
Campo Grande, MS, 5 de março de 2013.
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O assassinato do guarani kaiowá Denilson Barbosa e as investigações - Instituto Humanitas Unisinos - IHU