03 Março 2013
A renúncia do papa, legítima no sentido do direito canônico, mas perturbadora como absoluta descontinuidade com a tradição e a práxis da Igreja, abre caminho para um conclave de resultado totalmente incerto. Sobre os cardeais eleitores, pesa como uma rocha o relatório secreto que os três cardeais Julián Herranz, Jozef Tomko e Salvatore De Giorgi entregaram a Bento XVI e do qual vaza o quadro de uma Cúria Romana atravessada por mau governo e conflitos internos.
A reportagem é de Paolo Rodari, publicada no jornal La Repubblica, 02-03-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Daí a exigência sentida por muitos de pôr sobre a mesa dos primeiros cem dias de governo um plano de reforma da Cúria que varra para fora a sujeira e a reforme. Tudo se resume a identificar a pessoa certa para levar a cabo essa missão nada fácil.
As notícias das últimas horas é de que está ganhando espaço a ideia de favorecer um pontificado breve e confiado a uma personalidade não pertencente ao Colégio dos Cardeais eleitores. Até mesmo um cardeal que já completou 80 anos, em suma, poderia ser eleito, contanto que tenha força e seja um profundo conhecedor da Cúria.
Os nomes podem ser contados nos dedos de uma mão. Acima de tudo, há os dois "inquisidores": Jozef Tomko e Julián Herranz. Tomko, de 88 anos, foi secretário geral do Sínodo dos Bispos de 1979 a 1985, quando se tornou prefeito da Propaganda Fide, onde permaneceu até 2001; o espanhol Herranz, de 82 anos, foi desde 1983 secretário e de 1994 a 2007 presidente do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos.
Além deles, circula o nome de Camillo Ruini: 83 anos, viveu os últimos 30 anos em Roma. Mora no último andar do seminário menor de Roma, no topo da colina vaticana, a um passo dos muros leoninos e daquele que será o novo apartamento de Ratzinger nos jardins.
Ruini, ainda antes do conclave que elegeu Ratzinger, escreveu uma avaliação do papado, intitulado "A unidade profunda de um pontificado verdadeiramente universal", em que explicou como "com João Paulo II o primado papal tocou ao mesmo tempo o seu ponto mais alto e o seu ponto final". Na sua opinião, em suma, o modelo de condução da Igreja em que o papa e os bispos substancialmente não interagem "não pode ser mais repetido pelo seu sucessor".
A sua ideia, que Ratzinger não conseguiu assumir, é a de um governo novo, "cuja tarefa será justamente de integrar o melhor dos dois poderes, o colegial e o primacial". Um modelo que, segundo muitos, continua ainda hoje totalmente atual.
Por fim, dois nomes distantes entre si, mas ambos com um sentido. O português José Saraiva Martins e o italiano Angelo Sodano. Saraiva já era candidato no conclave de 2005. Recebeu alguns votos, fortalecidos por um grande ímpeto missionário e uma admirável capacidade de captar o povo. Há anos na Cúria como prefeito da Causa dos Santos, ele conhece a fundo os problemas de governo destes anos.
Angelo Sodano, por outro lado, sonha com o retorno em grande estilo da classe diplomática. Varrida ao longo dos anos pelo cardeal Tarcisio Bertone, secretário de Estado, a alavanca formada na escola da Praça Minerva poderia buscar um acordo próprio com ele (Bertone) para voltar ao topo da pirâmide da Cúria Romana. Dificilmente ele será votado pelos muitos estrangeiros que querem uma limpeza geral da Cúria, mas, se conseguir fazer um bloco com Bertone, terá alguma chance.
Depois da renúncia de Ratzinger, tudo pode acontecer. Diz o cardeal Francesco Coccopalmerio, presidente dos Textos Legislativos, que "o papa quebrou um 'tabu'", o do pontífice vitalício, "modificando normas, ou mesmo simples práticas, que têm origem humana". E com ele são muitos os que consideram que o conclave de 2013 será de muitas exceções.
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''Para mudar a Cúria é preciso um veterano'': a hipótese de um papa ultraoctogenário - Instituto Humanitas Unisinos - IHU