Por: André | 28 Janeiro 2013
São os escolhidos para pregar os Exercícios Espirituais ao Pontífice e à cúria. O próximo será o cardeal Gianfranco Ravasi. Na sequência, uma exposição de todos os que tiveram esta responsabilidade antes dele.
A reportagem é de Sandro Magister e publicada no sítio Chiesa.it, 24-01-2013. A tradução é do Cepat.
Depois de tê-lo chamado em 2007, quando ainda era um simples sacerdote, para que escrevesse as meditações para a Via Crucis da Sexta-feira Santa no Coliseu, Bento XVI escolheu agora Gianfranco Ravasi – convertido em cardeal presidente do Pontifício Conselho para a Cultura – como pregador dos Exercícios Espirituais para o Papa e a cúria romana, que acontecerão no começo da próxima Quaresma.
Até agora, esta dupla chamada havia sido feita somente a outros dois eclesiásticos: ao cardeal Angelo Comastri, que pregou os Exercícios em 2003 e escreveu as meditações em 2006; e ao próprio Joseph Ratzinger, a quem João Paulo II chamou para pregar os Exercícios em 1983 e para compor as meditações para a Via Crucis em 2005, poucos meses antes de ser elevado ao trono de Pedro como Bento XVI.
Este raro privilégio, que associa a figura de Ravasi à de Ratzinger, provavelmente aumentará seus pontos como “papável” nos círculos midiáticos, mais que no Colégio cardinalício.
Enquanto isso, a notícia oferece a ocasião para lançar um olhar retrospectivo sobre a própria institucionalização das pregações quaresmais na cúria, que agora são uma tradição, embora não muito antiga.
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Sua institucionalização como agenda fixa remonta a 1929. Embora desde o século XVI exista a figura do pregador apostólico – hoje chamado pregador da Casa Pontifícia, cargo que desde 1743 está reservado à Ordem dos Franciscanos Capuchinhos –, é somente com Pio XI que, no Vaticano, começam a ser pregados os Exercícios Espirituais segundo o estilo inaciano.
O papa Achille Ratti foi um convencido admirador de Santo Inácio de Loyola, tanto que em julho de 1922, poucos meses depois de sua elevação ao papado, o proclamou “patrono dos Exercícios Espirituais e de todas as instituições que de alguma maneira realizam sua obra”.
Em 20 de dezembro de 1929, Pio XI publicou uma encíclica dedicada aos Exercícios Espirituais, a “Mens nostra”, na qual, entre outras coisas, comunicou “urbi et orbi” sua decisão de fazer anualmente os Exercícios no Vaticano.
Anteriormente, o pontífice milanês já havia promovido cursos de Exercícios no Palácio Apostólico – em 1925 e em 1928, por exemplo – mas foi somente com a “Mens Nostra” que os Exercícios Espirituais se converteram em agenda fixa para o Papa e para os seus mais estreitos colaboradores.
Um compromisso – inicialmente estabelecido na primeira semana do Advento – que somente poucas vezes não foi realizado, por motivos bem determinados.
Em 1950, Pio XII transferiu os Exercícios Espirituais para o começo do ano seguinte, para não interromper as atividades e as audiências – praticamente diárias – previstas para o Ano Santo em curso. Por isso, os Exercícios foram pregados duas vezes em 1951: em janeiro – os postergados do ano anterior – e em dezembro.
Em 1962, João XXIII substituiu-os por um retiro pessoal de uma semana na Torre de São João, em preparação ao iminente Concílio Ecumênico.
Tampouco foram feitos em 1963, porque Paulo VI, elevado ao papado em junho desse ano, considerou-os como um impedimento para a realização da segunda sessão do Concílio, razão pela qual decidiu adiá-los para fevereiro do ano seguinte, no começo da Quaresma.
O mesmo ocorreu com as sessões conciliares de 1964 e 1965, de tal modo que esta transferência deixou de ser temporária para tornar-se definitiva. Desde 1964, os Exercícios são feitos habitualmente no Vaticano, já não mais no Advento, mas na primeira semana da Quaresma.
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Mas quem foram, nestes mais de 80 anos, os homens escolhidos pelos Papas para pregar os Exercícios Espirituais na Cúria? O registro é feito pela Prefeitura da Casa Pontifícia, que publicou uma lista quase completa.
Com Pio XI, os escolhidos foram sobretudo jesuítas (os padres Galileo Venturini, Giovanni Oldrà, Alessio Magni, Giuseppe Filograssi, Agostino Garagnani, Giuseppe Golia, Antonio Savani, Ottavio Marchetti, Pietro Righini, Giuseppe Maria de Giovanni), mas também oblatos de Rho (o bispo Ludovico Cattaneo, de Ascoli Piceno, e o padre Giustino Borgonovo), capuchinhos (o bispo Luca Ermenegildo Pasetto e o padre Leone da Caluso) e redentoristas (o bispo Carmine Cesarano, de Aversa, e o padre Michele Mazzei).
Pio XII concentrou a escolha em jesuítas (os padres Filograssi, Giuseppe Messina, Paolo Dezza – futuro cardeal –, Ambrogio Fiocchi, Venturini, Giuseppe Massaruti, Vittorio Genovesi, Luigi de Poletti, Righini, Luigi Celebrini, de Giovanni, Antonio Tucci, Luigi Ambruzzi, Maurice Flick, Giorgio Lojacono, Anselmo Arù), com a única exceção de 1941, quando chamou um oblato de Rho (o padre Borgonovo).
Em 1958, João XXIII escolheu um jesuíta (o padre Carlo Messori Roncaglia), em 1959 o bispo de Casale Monferrato, Giovanni Angrisani, em 1960 o pároco romano Pirro Scavizzi (cuja beatificação está em andamento) e, em 1961 o pregador apostólico, o padre Ilarino, de Milão.
Paulo VI inaugurou suas escolhas – em 1964 – com o padre redentorista alemão Bernard Häring, rompendo assim o costume de chamar somente eclesiásticos italianos. E é também o papa Giovanni Battista Montini quem chama pela primeira vez um cardeal para pregar os Exercícios Espirituais. O escolhido, em 1976, foi Karol Wojtyla, que dois anos depois será eleito Papa.
Afora o caso chamativo recém citado, muitas vezes, a partir de 1973, ocorreu que a pregação dos Exercícios Espirituais fosse seguida por um progresso no “cursus honorum” eclesiástico.
Basta repassar a lista dos pregadores reproduzida mais abaixo para verificar isso.
Muitos dos pregadores converteram-se depois em cardeais: Dezza, Javierre Ortas, Pironio, Anastasio Ballestrero, Carlo Maria Martini, Lucas Moreira Neves, James A. Hickey, Georges M. Cottier, Ersilio Tonini, Jorge A. Medina Estevez, Tomas Spidlik, Christoph Schönborn, Francois-Xavier Nguyen van Thuan, Angelo Comastri.
Outros – em brevíssimo tempo – foram elevados ao episcopado, como Mariano Magrassi com Paulo VI, Bruno Forte com João Paulo II e Enrico dal Covolo com Bento XVI.
No começo de seu pontificado, Bento XVI chamou para pregar os Exercícios Espirituais cardeais que estavam no final de sua carreira: Marco Cè, emérito de Veneza, em 2006; Giacomo Biffi, emérito de Bolonha, em 2007; o jesuíta mais que octogenário Albert Vanhoye, em 2008; e Francis Arinze, prefeito emérito da Congregação para o Culto Divino, em 2009. Mas depois mudou seus critérios de escolha.
São poucos os que tiveram o privilégio de pregar os Exercícios Espirituais mais de uma vez. Entre esses, destacam-se os nomes do jesuíta Dezza (em 1942 com Pio XII e em 1967 com Paulo VI) e do cardeal Biffi (escolhido também em 1989 com João Paulo II).
Uma curiosidade em relação ao atual pontífice. Em uma entrevista publicada pela revista mensal 30 Giorni, de agosto de 2003, o então cardeal Ratzinger revelou que alguns anos antes de sua nomeação, em 1977, como arcebispo de Freising-Munique, “talvez em 1975”, Paulo VI o teria convidado para pregar os Exercícios Espirituais. “Mas eu não me sentia suficientemente seguro nem do meu domínio do italiano nem do francês para prepará-los e me atrever a uma tal aventura, por isso recusei”.
Tratou-se, de qualquer modo, de um “não” provisório. Efetivamente, em 1983, menos de dois anos depois de ter sido chamado a Roma por João Paulo II para presidir a Congregação para a Doutrina da Fé, o cardeal Raztinger foi chamado para pregar os Exercícios Espirituais.
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Como já dissemos, Ratzinger foi também o autor das meditações da última Via Crucis de João Paulo II no Coliseu, em 2005, que passaram para a história pela referência à “sujeira na Igreja”.
A tradição de destinar as meditações da Via Crucis a personalidades externas é mais recente, ao ter sido introduzida por João Paulo II, em 1985.
Mas enquanto as pregações quaresmais sempre foram pregadas por clérigos, as meditações – como se pode ver na lista reproduzida abaixo – foram confiadas também a leigos – incluindo um grupo de jornalistas e um casal de focolarinos – e representantes de outras confissões cristãs, como o patriarca ortodoxo Bartolomeu I ou a monja protestante Minke de Vries.
Além do teólogo Hans Urs von Balthasar, o outro caso único de promoção posterior à redação das meditações refere-se a Ravasi, que poucos meses depois, de prefeito da Biblioteca Ambrosiana que era, foi chamado a Roma como arcebispo e presidente do Pontifício Conselho para a Cultura.
Para o próximo dia 29 de março, Sexta-feira Santa, a tarefa de escrever as meditações para a Via Crucis no Coliseu foi confiada a alguns jovens libaneses, que participaram da vigília de oração celebrada em Beirute durante a viagem de Bento XVI ao Líbano, em setembro passado.
Os pregadores dos Exercícios Espirituais ao Papa e à Cúria
Com Paulo VI
1964 Bernard Häring, redentorista alemão, teólogo
1965 Ambroise-Marie Carré, dominicano francês, pregador em Notre-Dame (em Paris)
1966 Giuseppe Carraro, bispo de Verona
1967 Paolo Dezza, jesuíta, cardeal em 1991
1968 René Voillaume, sacerdote francês, dos Irmãos de Jesus
1969 Gabriel M. Brasò, catalão, abade presidente da Congregação de Subiaco da Ordem de São Bento (Congregação Sublacensis)
1970 Jacques Loew, dominicano francês, iniciador da experiência dos padres operários
1971 Divo Barsotti, sacerdote italiano, fundador da Comunidade dos Filhos de Deus
1972 Maurice Zundel, sacerdote suíço
1973 Antonio María Javierre Ortas, espanhol, reitor da Pontifícia Universidade Salesiana, cardeal em 1988
1974 Eduardo F. Pironio, argentino, bispo de Mar del Plata e presidente do CELAM, cardeal em 1976
1975 Anastasio Ballestrero, carmelita, arcebispo de Bari e depois de Torino, cardeal em 1979
1976 Karol Wojtyla, cardeal arcebispo de Cracóvia, elevado ao papado em 1978
1977 Mariano Magrassi, abade beneditino, nomeado no mesmo ano arcebispo de Bari
1978 Carlo Maria Martini, jesuíta, reitor do Pontifício Instituto Bíblico, arcebispo de Milão em 1979 e cardeal em 1983
Com João Paulo II
1979 Tullio Faustino Ossanna, Irmão Conventual
1980 Lucas Moreira Neves, dominicano, cardeal em 1988
1981 Jerzy Ablewicz, bispo de Tarnow (Polônia)
1982 Stanislas Lyonnet, padre jesuíta
1983 Joseph Ratzinger, cardeal prefeito para a Congregação para a Doutrina da Fé
1984 Alexandre do Nascimento, cardeal arcebispo de Luanda (Angola)
1985 Achille Glorieux, arcebispo, núncio aposentado
1986 Egidio Vigano, reitor maior dos salesianos
1987 Peter-Hans Kolvenbach, prepósito geral dos jesuítas
1988 James A. Hickey, arcebispo de Washington, cardeal em junho do mesmo ano
1989 Giacomo Biffi, cardeal arcebispo de Bolonha
1990 Georges Marie Cottier, padre dominicano, teólogo da Casa Pontifícia, cardeal em 2004
1991 Ersilio Tonini, arcebispo emérito de Ravena, cardeal em 1994
1992 Ugo Poletti, cardeal, ex-vigário de Roma
1993 Jorge A. Medina Estévez, bispo de Rancágua (Chile), cardeal em 1998
1994 Giovanni Saldarini, cardeal arcebispo de Turim
1995 Tomás Spidlík, padre jesuíta, cardeal em 2003
1996 Christoph Schönborn, dominicano, arcebispo de Viena, cardeal em 1998
1997 Roger Etchegaray, cardeal presidente do Pontifício Conselho “Justiça e Paz”
1998 Ján Chryzostom Korec, jesuíta, cardeal bispo de Nitra (Eslováquia)
1999 André-Mutien Léonard, bispo de Namur (Bélgica), promovido como arcebispo de Malinas-Bruxelas em 2010
2000 François Xavier Nguyen Van Thuan, arcebispo presidente do Pontifício Conselho “Justiça e Paz”, cardeal em 2001
2001 Francis E. George, Oblato de Maria Imaculada, cardeal arcebispo de Chicago
2002 Cláudio Hummes, franciscano, cardeal arcebispo de São Paulo (Brasil)
2003 Angelo Comastri, arcebispo prelado de Loreto, cardeal em 2007
2004 Bruno Forte, teólogo, promovido a arcebispo de Chieti-Vasto em junho do mesmo ano
2005 Renato Corti, bispo de Novara
Com Bento XVI
2006 Marco Cé, cardeal, patriarca emérito de Veneza
2007 Giacomo Biffi, arcebispo emérito de Bolonha
2008 Albert Vanhoye, jesuíta francês, cardeal
2009 Francis Arinze, cardeal, prefeito emérito da Congregação para o Culto Divino
2010 Enrico dal Covolo, salesiano, nomeado no mesmo ano reitor da Pontifícia Universidade Lateranense e bispo
2011 Francois-Marie Lethel, carmelita descalça francês, prelado secretário da Pontifícia Academia de Teologia
2012 Laurent Monsengwo Pasinya, cardeal arcebispo de Kinshasa
2013 Gianfranco Ravasi, cardeal presidente do Pontifício Conselho para a Cultura
Os autores das meditações da Via Crucis no Coliseu
Com João Paulo II
1985 Italo Alighiero Chiusano, escritor italiano
1986 André Frossard, jornalista e escritor francês
1987 Miguel Obando Bravo, salesiano, cardeal arcebispo de Manágua
1988 Hans Urs von Balthasar, teólogo suíço, designado cardeal para o consistório de junho de 1988
1989 Marek Skwarnicki, escritor polonês
1990 Michel Sabbah, patriarca latino de Jerusalém
1991 Ignacio M. Calabuig Adan e Silvano M. Maggiani, Servos de Maria
1992 Miloslav Vlk, arcebispo de Praga, cardeal em 1994
1993 Anna Maria Canopi, abadessa da abadia beneditina "Mater Ecclesiae", Ilha de São Júlio
1994 Bartolomeo I, patriarca ecumênico de Constantinopla
1995 Minke de Vries, monja da comunidade protestante de Grandchamp, Suíça
1996 Vinko Puljic, cardeal arcebispo de Vrhbosna-Sarajevo
1997 Karekin I, Catholicós de todos os armênios
1998 Olivier Clément, teólogo ortodoxo francês
1999 Mario Luzi, poeta italiano
2000 João Paulo II (meditações escritas pessoalmente por ele)
2001 John H. Newman (de seus escritos)
2002 Os jornalistas John M. Thavis, CNS, Estados Unidos; Alexej M. Bukalov, Rússia; Henri Tincq, "Le Monde", França; Gregory Burke, Fox News, Estados Unidos; Ángel Gómez Fuentes, Espanha; Erich B. Kusch, Alemanha; Hiroshi Miyahira, Japão; Jacek Moskwa, Polônia; Marina Ricci, TG 5, Itália; Aura Miguel Vistas, Rádio Renasença, Portugal; Luigi Accattoli, "Corriere della Sera", Itália; Sophie De Ravinel, "I-Media", França; Valentina Alazraki, México; Marie Czernin, Alemanha
2003 Karol Wojtyla (dos exercícios espirituais pregados por ele em 1979 na cúria romana)
2004 André Louf, monge trapista belga
2005 Joseph Ratzinger, cardeal prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé
Com Bento XVI
2006 Angelo Comastri, arcebispo coadjutor arcipreste de São Pedro, no ano seguinte cardeal
2007 Gianfranco Ravasi, sacerdote, em setembro do mesmo ano arcebispo presidente do Pontifício Conselho para a Cultura, cardeal em 2010
2008 Joseph Zen, cardeal bispo de Hong Kong
2009 Thomas Menamparampil, salesiano, arcebispo de Guwahati (Índia)
2010 Camillo Ruini, cardeal, ex-vigário de Roma
2011 Maria Rita Piccione, monja conventual, preside os mosteiros agostinianos da Itália
2012 Danilo y Anna Maria Zanzucchi, casal de focolarinos
2013 Jovens libaneses
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