13 Novembro 2012
"Os jovens padres? Se é por isso, diversos bispos também têm dificuldades. Até no último sínodo se ria um pouco. Muitos têm uma dificuldade quase estrutural para ler e compreender o latim, mesmo entre os europeus, e eu me refiro ao latim eclesiástico, que é muito mais simples do que a língua de Cícero...".
A reportagem é de Gian Guido Vecchi, publicada no jornal Corriere della Sera, 11-11-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O cardeal Gianfranco Ravasi sorri com uma pitada de tristeza. Como presidente do Conselho da Cultura vaticano, será ele que terá controlar a nova "Pontifícia Academia de Latinidade" (Pontificia Academia Latinitatis) que Bento XVI instituiu nesse domingo com um motu proprio no qual escreve (em latim, obviamente) como é "urgente" combater "o perigo de um conhecimento cada vez mais superficial". A Igreja, acrescenta o papa, há 2.000 anos, é "cuidadora e promotora" do latim no mundo.
Eis a entrevista.
Eminência, o papa fala dos seminários, mas, em geral, também dos jovens e do "vasto mundo da cultura". Qual será o papel da Academia?
Já havia instituições vaticanas como a Latinitas, agora extinta, mas agora se quer rever toda a questão de uma maneira diferente. Acima de tudo, há um valor que se considera como permanente da humanidade: o latim – com o grego, naturalmente – é uma das matrizes absolutas da cultura europeia e ocidental. Por isso, o Santo Padre nomeou como presidente da Academia um grande latinista como o professor Ivano Dionigi, reitor da Universidade de Bolonha. Não é somente um problema eclesial.
Portanto, como ela se moverá?
Acima de tudo, nos comprometeremos com a difusão da cultura latina alta e dos seus conteúdos, que são inseparáveis do conhecimento da língua. Toda tradução sempre é uma belle infidèle, como dizia Gilles Ménage; mesmo que seja bela, é infiel. Eu, no caso, penso que Agostinho perde a metade. Pense nas Confissões: "Nondum amabam, et amare amabam... quaerebam quid amarem, amans amare...". Como se faz? É como traduzir Dante. Agostinho está dizendo que ainda não amava realmente porque não sabia qual era o objeto do seu amor, e há uma beleza musical na língua. Ele é um cultor refinado da língua, brinca com ela. Assim, queremos recuperar todo o grande patrimônio cultural latino, clássico, patrístico e medieval: para o mundo. A Academia vai se ampliar em nível internacional, com diversas personalidades seculares.
Bento XVI também fala dos seminários...
Certamente, o segundo elemento é ad intra. O latim foi e é a língua oficial da Igreja. Em latim, estão os escritos dos Padres, os documentos da tradição, os textos dos Concílios, do magistério dos papas, os livros litúrgicos... É preciso um maior empenho nos seminários, é preciso fazer com que consigam entendê-los.
Como se chegou a essa situação?
Não é só culpa da Igreja. Há um problema geral dos estudos humanísticos. Além disso, antigamente, para estudar teologia nos seminários, tinha-se que passar pelo liceu clássico, e depois não foi mais assim. Os cursos preparatórios não bastaram. É preciso fazer mais. Mas há um terceiro nível...
Qual?
A recuperação do latim na modernidade. Hoje, há o gosto de voltar à língua. Você sabia que na Finlândia existe uma revista quinzenal para as crianças em latim? Porque o latim tem uma função formativa. O inglês falado – não me refiro ao alto – é uma simplificação, quase que uma "tuitagem" do pensamento. Ao invés, o latim tem uma forte marca racional, a construção dos casos, dos verbos, a consecutio temporum... Por isso, quer-se repropô-lo aos jovens.
Há aqueles que farão a equação latim-Igreja pré-conciliar...
Eu sei, infelizmente. Se quisermos, há uma recuperação do passado e do seu patrimônio, mas não reacionário nem estéril. A beleza do latim não é alternativa ou contraposta à Igreja pós-conciliar. E depois eu gostaria de saber se aqueles que participam dos ritos latinos seriam capazes de me traduzir os hinos de Santo Ambrósio, tão refinados e complexos... Até mesmo eles precisam disso!
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
''Há bispos que não entendem o latim''. Entrevista com Gianfranco Ravasi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU