29 Outubro 2012
O século IV foi o fim de uma época e também nascimento de tempos novos para os modelos femininos na cultura cristã e na sociedade. Enquanto as instituições do Império desmoronam, povos pressionam nas fronteiras, corrupção e violências transbordam, e os cofres estão vazios, devido às guerras e à evasão fiscal, algumas mulheres são protagonistas das transformações ao menos tanto quanto os homens, ao lado dos quais a história as acolheu. Helena, mãe de Constantino, Mônica, mãe de Agostinho, Marcelina, irmã de Ambrósio.
A reportagem é de Marco Garzonio, publicada no jornal Corriere della Sera, 25-10-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Mas há também Fausta, esposa de Constantino, por ele mandada assassinar por suspeita de traição (violência familiar antes do tempo), e a companheira de Agostinho, jovem cartaginense, que viveu anos more uxorio ("casal de fato", diríamos hoje) com o futuro santo bispo de Hipona. Deu-lhe também um filho, Adeodato. Mas dela não permaneceu nem mesmo o nome: uma remoção do feminino, apesar da extraordinária autoanálise ante litteram feita por Agostinho nas Confissões. Um arquétipo das remoções coletivas da mulher praticadas pela catolicidade e de tanta misoginia e sexofobia que afligiram a Igreja durante séculos e ainda a afligem. Mas sigamos com ordem na consideração dos tipos.
A mãe diligente, forte, solícita, ambiciosa, muito apegada ao filho homem, possessiva: é o modelo de mãe que emerge dos testemunhos. Em parte, é um ícone retalhado sobre o protótipo da matrona romana, no qual se enxerta a novidade do cristianismo. Desde as origens, isso se debate em uma contradição. Há o exemplo de Jesus que "liberta" a mulher das sujeições. Para ele, ela não é equiparável a uma "coisa" (como nos costumes romanos); nos encontros, ele revela a alta consideração para com uma pessoa certamente não inferior ao homem e, assim, contradiz a cultura do tempo. Os Evangelhos narram que Jesus se mostra a Maria de Magdala e às outras mulheres como o Ressuscitado diante do sepulcro vazio: elas são as protagonistas, a elas confia o anúncio pascal. Por outro lado, é São Paulo quem convida as mulheres a serem submissas aos maridos e inspira a visão de de um papel serviçal, silencioso, subordinado.
Eis, então: Helena antecipa aquela que, em épocas posteriores, será a Rainha Mãe. Estalajadeira, ligada a Costanzo Cloro que lhe dará um filho, Constantino, ela faz de tudo para que este se torne senhor do Império: tece relatos, guia, aconselha. Será retribuída: Constantino lhe cingirá com o diadema imperial (ao invés da "traidora" Fausta), introduzindo na iconografia um casal um pouco incestuoso: mãe e filho.
Psicologicamente, Constantino será, de certo modo, submetido a Helena. Em Jerusalém, ela encontrará as relíquias do Santo Sepulcro. Dos pregos da Cruz, ornará a coroa imperial (posta sobre a cabeça dos senhores do mundo até Napoleão) para dizer que quem governa está submetido a Deus, e segurará as rédeas do filho: até mesmo os soberanos devem frear as pulsões.
Uma mãe igualmente intrusiva no plano dos afetos, nesse caso, foi Mônica para Agostinho. Este havia tentado se livrar dela partindo para Roma sem dizer nada, mas Mônica não se desencorajou, o perseguiu e o alcançou até Milão, a capital da época. Lá, convenceu o filho, no ápice do sucesso como retórico, a enviar a companheira novamente para a África e fez de tudo para que ele encontrasse uma esposa na corte.
Enquanto isso, ela também havia se consumido para que Agostinho conhecesse Ambrósio, que em Milão contava mais do que as insígnias imperiais. Assim, o amor de mãe se transformou: caiu o projeto de ascensão social, veio a conversão, e o futuro padre da Igreja retomou o caminho da África, sem Mônica mais, no entanto, que morreria no caminho de volta.
Outro tipo de mulher, que teve e tem importância na Igreja, nos costumes, na cultura, é encarnado por Marcelina. A irmã de Ambrósio, depois de ter contribuído para criar os irmãos, tomou o véu com o Papa Libério. Graças a ela, se prospectou uma escolha de vida marcada pelo modelo do monaquismo oriental, do qual Ambrósio era admirador: a virgindade (sobre ela, o padroeiro de Milão compôs uma das suas obras principais), a consagração, o claustro para se retirar, rezar e, em alguns desenvolvimentos, trabalhar, garantir a continuidade das tradições e abrir-se ao mundo através de obras de caridade.
Constantino, Ambrósio, Agostinho e as suas mulheres: exemplos de uma história plural que continua, que é construída dia após dia ainda, que evolui.
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Três mulheres fortes por trás dos padres da fé - Instituto Humanitas Unisinos - IHU