23 Agosto 2012
Uma das principais novidades da movimentação de ontem em Brasília foi a união de diferentes movimentos ligados à questão agrária, dos índios aos sem-terra, dos quilombolas aos pequenos produtores rurais. A explicação dos organizadores é o aumento do descontentamento com o governo Dilma. De maneira geral, a sensação é de que houve perda de espaço político.
"O presidente Lula não fez muito pelos índios. Mas ele se preocupava com as aparências, recebia e conversava com as lideranças indígenas", disse ao Estado o secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber Buzatto. "O atual governo não tem sequer essa preocupação. Não recebe lideranças e promove retrocessos na questão dos direitos indígenas."
A reportagem é de Roldão Arruda e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 23-08-2012.
O líder do Movimento dos Sem-Terra (MST), João Pedro Stédile, faz críticas na mesma direção. Na avaliação dele, o espaço de interlocução ficou mais reduzido e centralizado.
Essa crítica está se generalizando e afetando o PT, o partido da presidente, nas mais diferentes áreas. Há poucos dias, o presidente do Setorial Nacional LGBT do partido, Julian Rodrigues, divulgou uma nota criticando a ausência de diálogo com o governo. A bancada agrarista no Congresso também dá sinais de descontentamento.
No caso da reforma agrária, porém, os problemas não se restringem à falta de interlocução. O maior drama dos movimentos está relacionada à redução da capacidade de mobilização de pessoas, em decorrência do crescimento econômico e da criação de empregos. A pressão dos acampamentos caiu, segundo o ministro do Desenvolvimento Agrário.
Também existem fatores estruturais. No documento entregue ontem no Planalto, os manifestantes lembraram que, em 1961, o presidente João Goulart defendeu a reforma. Naquela época, porém, 63% da população dependiam diretamente do trabalho agrícola para sobreviver. Hoje, 86,6% dos brasileiros vivem nas cidades. Pouco mais de 10% dependem do trabalho agrícola.
Depois de virar palco de conflito da polícia com os servidores públicos, o Planalto enfrentou ontem protestos promovidos pelos representantes de mais de 30 entidades ligadas ao campo, como Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST), Via Campesina e Confederação dos Trabalhadores da Agricultura (Contag).
Cerca de 7 mil trabalhadores rurais, de acordo com a Polícia Militar do Distrito Federal, que faziam passeata pela Esplanada dos Ministérios, tentaram invadir o Palácio do Planalto e chegaram a derrubar as grades de proteção colocadas para proteger o local dos manifestantes.
Mais de uma vez a tropa de choque da PM foi chamada e acabou havendo um tumulto entre militares e trabalhadores. A certa altura, estes chegaram a ser atingidos por cassetetes, gás lacrimogêneo e spray de pimenta - mas, segundo a PM, ninguém ficou ferido.
O tumulto começou por volta das 9h30, quando a presidente Dilma Rousseff nem havia chegado ao Planalto. Ao chegar, o comboio presidencial entrou pela área da Vice-Presidência e Dilma teve acesso ao palácio pelos fundos, por volta das 10h20. Por causa de protestos de servidores públicos, Dilma já fora obrigada a sair pela porta dos fundos. Sempre que há protestos, como na semana passada e ontem, quando a PF estava diante do Planalto, a presidente tem usado a entrada alternativa.
Desta vez, até a polícia de choque do Exército foi chamada ao palácio para proteger as suas instalações. Mas, apesar de estarem acompanhados de cães para conter os manifestantes, os soldados não entraram em contato, nem em confronto, com eles. Ficaram recuados, na área externa do palácio.
Em guarda
Um dos seguranças do Planalto avisou ao comandante da tropa que havia determinação para que eles ficassem no local. Normalmente esta guarda é feita apenas pelo Batalhão de Guarda Presidencial (BGP) ou pelo Regimento de Cavalaria de Guarda (RCG). "O ministro mandou o choque ficar (no Palácio)", disse o segurança ao comandante dos militares do Exército, retransmitindo a ordem do general José Elito, ministro-chefe do gabinete de Segurança Institucional (GSI), responsável pela segurança da presidente e do Planalto. Como outras manifestações ainda poderiam ocorrer ao longo do dia, quando a confusão acabou eles foram para o alojamento do palácio, para aguardar algum novo chamado.
O ministro-chefe da Secretaria-Geral, ministro Gilberto Carvalho, desceu ao saguão do Planalto para conversar com uma comissão dos manifestantes. Ele comentou que tinha receio da violência neste tipo de manifestação, mas reconheceu que os protestos são legítimos. Gilberto Carvalho recebeu a pauta de reivindicações das entidades e se comprometeu a entregá-la à presidente Dilma Rousseff.
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Protesto marca união de diferentes movimentos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU