16 Agosto 2012
Pierre Teilhard de Chardin (Orcines, 1º de maio de 1881 – Nova York, 10 de abril de 1955) foi um dos mais renomados teólogos-cientistas do século XX. Jesuíta e paleontólogo, elaborou uma teoria que unia criação e evolução no Ponto Ômega, representado por Cristo.
A entrevista que segue foi concedida a Marcel Brion e publicada em janeiro de 1951 na revista francesa Les Nouvelles Littéraires: aqui, ele explica a sua concepção teológica e científica e rejeita as acusações que lhe foram dirigidas por ignorar o papel do mal e do sofrimento na vida.
A entrevista foi republicada pelo jornal dos bispos italianos, Avvenire, 06-08-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Todas as vezes em que eu encontro o padre Teilhard de Chardin, sou capturado por aquele "clima" de alta espiritualidade e de ciência pura que ele leva consigo para todo lugar. No quarto da Rue Monsieur, como nos campos de escavação na China ou no laboratório do Museu, ele sempre tem a mesma graça amável e irônica, aquela fineza aguda e benevolente ao mesmo tempo e aquela distinção oxfordiana que levam a pensar em algum scholar inglês que é, ao mesmo tempo, Darwin e Newman.
Ele está ao mesmo tempo contente e inquieto pelo fato de que a sua doutrina – chamá-la de teoria ou de sistema seria insuficiente – chega a um público cada vez mais vasto, cada vez mais atento e, acrescentaria, cada vez mais entusiasta e convicto, apesar dos obstáculos que com os quais a difusão do seu pensamento se deparou às vezes, até hoje. Contente porque esse sábio traz à humanidade uma mensagem de confiança, de esperança, de dinamismo vital, de convite a uma consciência mais elevada das possibilidades de progresso que lhe são oferecidas, mas também das crescentes responsabilidades que isso implica.
Inquieto porque essa doutrina, formulada explicitamente há pouco tempo, encontrou-se desfigurada, deformada, falsamente interpretada em certos âmbitos científicos e não só, e, consequentemente, nasceram muitos mal-entendidos e acenderam-se polêmicas até mesmo antes de serem publicadas as obras nas quais o padre Teilhard de Chardin expunha, em uma visão de conjunto, os resultados dos seus trabalhos científicos e das suas reflexões.
Eis a entrevista.
Como o senhor chegou às descobertas que tornaram o seu nome popular e o levaram a formular uma teoria do ser humano e do universo completamente nova?
A minha primeira infância foi passada entre as pedras, nas montanhas de Auvergne, ao lado de um pai naturalista que me transmitiu o gosto pela natureza e guiou a minha crescente paixão pela geologia. Os passeios entre as rochas fizeram nascer em mim o desejo de conhecer esse mundo mineral, tão misterioso e fascinante, que já exercia sobre a minha mente de criança uma atração poderosa e tenaz. Depois, eu estudei no colégio de Mongré, perto de Lyon, e foi seguramente por ter respirado a atmosfera daquela santa casa que, logo depois dos estudos, entrei para a Companhia de Jesus. Você a conhece, não? Em Aix, na calma e silenciosa Rue Lacépède, você que viveu por muito tempo em Aix-en-Provence? Ali eu passei o período do noviciado, animado por feriados e férias na nossa casa de campo de Tholonet.
Nessa paisagem tão intensamente geológica da Montagne Sainte Victoire, da qual Cézanne fez uma espécie de mito cósmico, de divindade original, de elemento primário, elevado na veemência mineral da metamorfose?
Sim, mas logo deixei a França pelas ilhas anglo-normanas: naquele tempo, as congregações eram expulsas do país e obrigadas a se refugiar no exterior. Enquanto eu continuava os meus estudos de filosofia em Jersey, naquela ilha eu tive a sorte de encontrar um autêntico jardim mineralógico, onde pude iniciar cientificamente no estudo da matéria: um objeto que sempre me fascinara.
Eu lembro que o senhor escreveu: "Através das rochas, me encontrei envolvido na estrada do planetário". Instintivamente, no mineral, o senhor procurava, ao mesmo tempo, o durável, o incorruptível. Quando criança, o senhor se desesperou no dia em que descobriu que o ferro era perecível e enferrujava...
Sim, tanto que, para me consolar, procurava equivalentes em outros lugares. Às vezes, em uma chama azul flutuante (ao mesmo tempo tão material, inaferrável e pura) nas cepas na lareira. Mais frequentemente, em alguma pedra mais transparentes ou mais colorida: cristais de quartzo ou de ametista, e principalmente fragmentos brilhantes de calcedônia, como eu podia coletar na minha região de Auvergne. Nesse caso, naturalmente, era preciso que a substância escolhida fosse resistente, inatacável e dura.
Já então o seu senso atual de uma irreversibilidade do movimento que vitaliza o mundo...
E foi assim que, pouco a pouco, despertei para o conceito de "matéria das coisas". Gradual e sutilmente, essa famosa consistência, que até então eu tinha perseguido no sólido e no denso, eu a descobria na direção de um elementar espalhado por toda parte, cuja própria ubiquidade formava a incorruptibilidade. Mais tarde, quando eu me ocuparia com a geologia, se podia acreditar que eu simplesmente sondava, com convicção e sucesso, as oportunidades de uma carreira científica. Mas, na realidade, o que, por toda a minha vida, me levou inevitavelmente (mesmo que às custas da paleontologia) ao estudo das grandes massas eruptivas e das zonas continentais não foi nada mais do que uma insaciável necessidade de manter o contato com uma espécie de raiz, ou de matriz, universal dos seres. É curioso, eu admito, o lugar axial invariavelmente ocupado pela paixão e pela ciência das pedras durante toda a minha embriogênese espiritual.
O senhor deixou Jersey, acredito, no fim daquela iniciação mineralógica, mais ou menos em 1905?
Sim, porque fui nomeado professor de física no Egito. Uma autêntica oportunidade, porque foi justamente no vale do Nilo, onde nasceu e se desenvolveu por milênios uma civilização prodigiosa, que o estudo dos fósseis trazidos à superfície do deserto me fez desviar para a paleontologia.
Que é, eu sei, a sua grande especialização...
Na realidade, o meu interesse científico sempre foi, e continua sendo, dividido entre a paleontologia humana e as questões da geologia continental, um pouco, se se quiser, como Darwin entre os fósseis e os cristais. Nessa competição, no entanto, no fim, foi o estudo do fenômeno humano que ganhou a dianteira nos meus gostos. (...) Sim, na ordem do pensamento científico, foi a descoberta, a tomada de consciência, eu diria, da ideia da evolução – de evolução biológica, quero dizer – que me permitiu conectar, no campo da experiência, os conceitos de energia material e de energia psíquica.
E depois o senhor teve que deixar o Museu, em 1914, para causa do fronte, dos zuavos e dos soldados. Mas não foi exatamente no fronte que germinou no senhor o conceito, tão original e fecundo, de uma noosfera em torno da Terra? O senhor gostaria de definir para os nossos leitores o que entende com o termo noosfera?
Eu usei esse termo pela primeira vez em um dos meus primeiros ensaios sobre o Fenômeno Humano, mais ou menos em 1927, mas, efetivamente, a ideia de uma comunidade espiritual humana adjacente ao orgânico havia nascido em mim nas trincheiras: a ideia, quero dizer, de uma espécie de "megaunidade" biológica especial que constitui o invólucro pensante da terra. Essa é, para mim, a noosfera.
No fim da guerra, o senhor retomou imediatamente os seus trabalhos no campo e no laboratório?
Não imediatamente. Em Verdun, havia morrido o meu querido amigo Jean Boussac, genro de [Pierre-Marie] Termier e, como ele, geólogo, e me foi dada a honra de pensarem em mim para a cátedra de geologia no Instituto Católico de Paris. Mas eu não fiquei lá por muito tempo. Eu havia recém-posto o pé lá quando, de repente, chegou a segunda grande oportunidade da minha vida. O padre Emile Licent, o explorador da China do Norte e fundador do Museu de Tianjin, estava procurando um geólogo que o acompanhasse. Graças à proteção do meu mestre Boule e do falecido Lacroix, um dos pilares da Academia das Ciências, em 1923, eu me encontrei como encarregado do Museu da Missão na China. Foi então que eu e o padre Licent tivemos a sorte de pôr a mão, no loess da bacia do Rio Amarelo, nos primeiros vestígios conhecidos de um paleolítico da China. Descoberta importante, mas que seria logo eclipsada por uma descoberta ainda mais sensacional: a descoberta feita por Andersson, Black e pelo Serviço Geológico da China do homem de Pequim ou sinantropo, um parente próximo do pitecantropo de Java, ambos, talvez, os homens fósseis mais antigos e mais primitivos por nós conhecidos.
Eu também sei que o senhor colaborou muito de perto (outra sorte da sua vida!) com a descoberta que valeu à ciência seis crânios de sinantropos, ao menos meia dúzia de mandíbulas e diversas dezenas de dentes isolados, em cerca de dez anos de pesquisa, de 1927 a 1937...
Esses restos humanos, pertencentes a cerca de 30 indivíduos, foram coletados durante escavações importantes e prolongadas em uma grande vala (50 metros) que constituía a área de uma antiga gruta enterrada e nivelada: muitos utensílios de pedra montados e uma enorme quantidade de ossos fósseis de veados, elefantes, rinocerontes, camelos, búfalos, antílopes e diversos carnívoros, quase todos representantes de espécies extintas há muito tempo. Naturalmente, ainda é difícil datar em anos esse distante primo do homem moderno. Mas podemos afirmar que, quando estava vivo, o manto das terras amarelas ainda não havia se depositado sobre o solo chinês. Fato este que nos remete para muito, muito atrás no tempo. Ao menos centenas de milhares de anos...
Eu conheço as conclusões gerais às quais essa longa carreira de estudioso lhe levou. Gostaria de resumi-las para os nossos leitores? Não se trata, naturalmente, de entrar nos detalhes dos problemas, mas apenas de entrever aquele "ultra-humano" que, cientificamente, em sua opinião, se desenha no término da evolução do Homo sapiens, de como a paleontologia nos faz conhecê-la e nos convida a levá-la adiante?
Especificamente, note-se bem, eu não sou nem filósofo, nem teólogo, mas sim um estudioso "do fenômeno" (um físico, no antigo sentido grego). Bem, nesse modesto nível de conhecimento, o que domina a minha visão das coisas é a metamorfose que o homem nos obriga a submeter o universo em torno a nós, a partir do momento em que (conforme aos imperiosos convites da ciência) nos decidimos a considerá-lo como constituinte, como parte integrante, nativa, do resto da vida. Em consequência a esse esforço de incorporação, emergem, se não me equivoco, duas constatações capitais na nossa percepção experimental das coisas.
A primeira é que o universo, muito mais do que "entropia" (que o leva novamente aos estados físicos mais prováveis), é caracterizado por um desvio preferencial de uma parte da sua matéria para estados cada vez mais complexos e sustentados por intensidades crescente de "consciência". Desse ponto de vista estritamente experimental, a vida não é mais uma exceção no mundo, mas aparece como um produto característico – o mais característico – do desvio psicoquímico universal. E o humano, ao mesmo tempo, torna-se, no campo da nossa observação, o termo provisoriamente extremo de todo o movimento. O humano: uma cabeça do mundo...
Posto isso, a segunda constatação à qual, a meu ver, somos conduzidos por uma aceitação científica integral do fenômeno humano é que a corrente de complexidade-consciência, da qual o psiquismo reflexo (isto é, o pensamento) brotou experimentalmente, ainda não parou, mas sim, através da totalização biológica da massa humana, continua funcionando, arrastando-nos, por efeito biológico de socialização, para certos estados ainda irrepresentáveis de reflexão coletiva, ou seja, como eu digo, para algum "ultra-humano". Tudo isso, repito, por simples extrapolação de uma lei de recorrência positivamente observável, sobre toda a extensão do passado, isto é, fora de todo sentimentalismo e de toda metafísica.
Pois bem, essa posição estritamente objetiva, mal-entendida, fez nascer e correr sob às minhas custas um certo número de lendas, em que as mais prejudiciais podem remeter às seguintes. Acima de tudo, eu fui considerado um otimista ou um utópico beat, que sonha com euforia humana ou com milenarismo confortável. Como se a maturação humana, que os fatos têm o fôlego para anunciar, não se apresentasse, nas minhas perspectivas, não como um repouso, mas até como uma crise de tensão, paga por um imenso rastro de desordens e de sofrimentos: crise totalmente repleta de riscos e, portanto, ainda mais dramática, por causa da enormidade do que está em jogo (o sucesso de um universo, nada menos!), de todas as fantasias egoístas e mórbidas do existencialismo contemporâneo.
Ainda mais grave, repete-se que eu seria o profeta de um universo destruidor de valores individuais: porque, a meu ver, o mundo se dirige, experimentalmente, a um estado sintético. Mas, na realidade, a minha grande preocupação sempre foi a de afirmar, em nome dos fatos, que a autêntica união não confunde, mas diferencia, e também que, no caso de seres pensantes e amantes (como o ser humano), longe de mecanizar, personaliza, e duplamente: primeiro, intelectualmente, por super-reflexão, e depois afetivamente, por unanimização. Assim, apesar do primado que eu concedo tecnicamente a tudo com relação ao elemento, eu me encontro, assim como a própria estrutura do meu pensamento científico, nos antípodas tanto de um totalitarismo social que leva ao formigueiro, quanto de um panteísmo hinduizante que busca saída e a figura última do espiritual na direção de uma identificação dos seres com um fundo comum subjacente à variedade dos eventos e das coisas.
Nem mecanização, portanto, nem identificação por fusão e perda de consciência, mas sim unificação por ultradeterminação laboriosa e amor. É preciso reconhecer que essas visões biológicas podem ter uma certa incidência sobre a nossa avaliação dos valores humanos. Fazem-nos propender para um humanismo renovado, baseado não mais, como no século XVI, em uma redescoberta do passado, mas sim sobre possibilidades inesperadas conservadas para nós pelo futuro. Mas o nascimento, ao nosso redor, de um tal "neo-humanismo" (ligado, no meu pensamento religioso, aos progressos da "caridade") não é precisamente uma das características distintivas dos tempos que estamos atravessando?
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''Nem utópico beat, nem milenarista''. Entrevista inédita com Pierre Teilhard de Chardin - Instituto Humanitas Unisinos - IHU