Por: André | 11 Agosto 2012
A direção do povo indígena Sarayaku está insatisfeita. A Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) emitiu uma sentença a favor desta comunidade aborígene na demanda contra o Estado equatoriano por outorgar, na década de 1990, uma concessão petroleira em seus territórios sem consultar as populações nativas. Os líderes Sarayaku qualificaram de “vitória” a sentença, após uma década de litígios. No próximo domingo, 12 de agosto, realizarão uma ampla assembleia local para celebrar a repercussão que a sentença pode ter tanto para o Equador, como para o continente em seu conjunto.
A reportagem é de Paúl Erazo e publicada pelo jornal El País, 09-08-2012. A tradução é do Cepat.
A sentença da Corte estabelece que o Estado equatoriano não consultou prévia e adequadamente o povo Sarayaku sobre a concessão outorgada em 1996 à petroleira argentina Companhia Geral de Combustíveis (CGC), cujo contrato foi cancelado em 2010. De acordo com a Corte, os trabalhos da companhia afetaram os direitos dos aborígenes, e inclusive colocou em perigo a integridade física do povo devido à colocação, entre 2002 e 2003, de cerca de 1.400 quilos de explosivos. Por conta disso, o Equador deverá pagar cerca de 1,4 milhão de dólares a esta comunidade de 1.200 pessoas situada na Amazônia equatoriana.
A sentença, além disso, contém disposições relacionadas ao futuro da atividade extrativista no Equador. Assinala que o Estado equatoriano deve consultar a comunidade Sarayaku “no eventual caso que se pretenda realizar alguma atividade ou projeto de extração de recursos naturais em seu território”.
José Gualinga, presidente do povo Sarayaku, assinalou ao El País que a sentença da Corte Interamericana representa um instrumento jurídico para exigir o respeito aos direitos humanos quando se trata de desenvolver um projeto extrativista no Equador e na América Latina.
Esta visão da repercussão regional da sentença no caso Sarayaku também é compartilhada pela organização Anistia Internacional. “Esta sentença terá um grande impacto nos países da região, já que estabelece claramente que os Estados são responsáveis pela realização de processos de consulta especiais antes de entrar em projetos de desenvolvimento que atingem os povos indígenas e seus direitos”, assinalou dias atrás Fernanda Doz Costa, pesquisadora da Anistia Internacional. E nesta quarta-feira, esta organização criticou o fato de que Governos do continente priorizarem os benefícios econômicos acima dos direitos dos povos aborígenes. “Os grandes projetos podem ter enorme impacto negativo sobre as comunidades indígenas, e só devem seguir adiante se estas comunidades outorgarem expressamente seu consentimento livre, prévio e informado”, manifestou Mariano Machain, adjunto de pesquisa e ação da Anistia Internacional sobre direitos econômicos, sociais e culturais.
Em vários países da região, como o Equador, Peru e Bolívia, o tema da consulta prévia em favor dos povos indígenas provocou extensos debates. Nas palavras do presidente do povo Sarayaku, este processo de consulta não deve ser entendido pelos governos como uma simples estratégia de informação, mas como “todo um processo de diálogo que precisa desembocar no consentimento” das partes.
O Governo de Rafael Correa enfatizou as culpas de administrações anteriores no caso Sarayaku e assinalou que o Estado equatoriano acatará a sentença da CIDH. Mas, além disso, o presidente equatoriano manifestou sua oposição ao fato de que a consulta aos povos indígenas signifique um consentimento prévio indígena, de caráter vinculante, a qualquer atividade extrativista. Em abril passado, Correa disse: “Alguns acreditam que consultar é pedir a permissão da comunidade. Não! Consulta prévia é socializar, é buscar chegar a um acordo, a um entendimento. Caso se consiga tudo isso, tudo bem, mas caso não se consiga, de acordo com os instrumentos internacionais, a Constituição da República, o presidente pode tomar as decisões para as quais tem atribuições (...) A consulta prévia não implica a imposição da vontade dos povos indígenas sobre o Estado”. E no mesmo sentido, no sábado passado, o presidente assinalou que “consentimento prévio é uma loucura”.
A Constituição do Equador estabelece, em seu artigo 398, que qualquer decisão estatal que possa afetar o ambiente deve ser consultada a comunidade, e acrescenta que “se do referido processo de consulta resulta uma oposição majoritária da respectiva comunidade, a decisão de executar ou não o projeto será adotada por resolução devidamente motivada da instância administrativa superior correspondente de acordo com a lei”. Entretanto, a CIDH determina em sua sentença no caso Sarayaku que a consulta aos povos indígenas deve ser efetuada de voa fé, ter como finalidade chegar a um acordo, e desenvolver-se segundo os costumes e tradições indígenas.
A questão de fundo deste debate no Equador é a proximidade da realização da 11ª ronda petroleira na Amazônia equatoriana, onde, segundo disse em abril passado o presidente Correa, “há provavelmente muito mais petróleo que em todo o norte e centro da Amazônia”.
Neste marco, o Governo equatoriano emitiu há pouco um regulamento de consulta prévia para a licitação de áreas hidrocarboníferas. O presidente do povo Sarayaku, não obstante, disse que as comunidades indígenas não foram consultadas para a elaboração deste documento. “Para nós, esse regulamento não tem validade”, concluiu José Gualinga.
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Corte Interamericana de Direitos Humanos censura Equador por contrato extrativista em terra indígena - Instituto Humanitas Unisinos - IHU